QUANDO ARTE e RELIGIÃO DIALOGAVAM..
“Em uma cultura saturada de imagens artísticas e eletrônicas, como se há de reconhecer a visão do Cristianismo como religião de transformação” Irvine, 2009, p.14[1]
Publica-se aqui um texto que saiu na imprensa de em Porto Alegre no dia 17 de novembro de 1969. Este texto contemplava a mesma preocupação que o teólogo Irvine expressa no parágrafo do texto acima e escrito no século XXI.
Percebe-se, pelo texto a seguir, que a preocupação é de trazer para a atualidade uma estética na qual a comunidade possa sentir-se num espaço privilegiado para uma comunidade contemporânea. Espaço que não seja um confundido com um museu restaurado numa estética ultrapassada e como mera decoração religiosa kitsch.
[1] IRVINE, Christopher . A arte de Deus: o fazer cristão e o significado da celebração religiosa. São Paulo : Loyola,, 2009, 164 p
Isto é arte-objeto. Arte cinética. Você pode vê-la sobre o altar da Igreja São João. Uma esfera de metal e bronze ao seu redor um arco também de metal (só que fixo). A frente, lâminas de plástico vitrificado. Quando a energia elétrica é ligada, a esfera gira. Emite luzes e sons. Seu som reflete numa espécie de bandeja de metal as cores, na parede azul do fundo da Igreja. Tudo isto para acompanhar o tempo em que vivemos
Cinética é a arte da qual você participa” Folha da Tarde, Porto Alegre : Companhia Caldas Junior, ano XXXIV, 17 de novembro de 1969, p. 63.
Clovis Peretti esteve no Colégio São João explicando o que é arte cinética. Arte que ele já está expondo - em caráter permanente – na igreja São João.
Numa sala pequena, trinta pessoas estão dispostas num semi-círculo. Seus olhos refletem tons de amarelo, verde, azul, de mil cores. Cores que tem reflexos em seus ouvidos, em suas mentes, em seus sentidos. Elas estão fixando uma esfera que emite sons e cores enquanto se movimenta. Elas estão participando de uma experiência pioneira no bairro São João: arte cinética.
Arte cinética é a arte do nosso tempo. Arte total. Da cor ( até aqui ficava só nos quadros), dos sons ( na música) ou do movimenta ( da dança). Hoje tudo é englobado, exigindo participação do autor e de público, porque dependem dos movimentos que o autor faça para que a obras crie vida, dependem dos olhos dos expectadores.
Lá no bairro São João, a experiência começo na igreja. Foi feita por Clóvis Peretti, que começo no desenho, foi para a xilogravura, depois para a pintura a óleo, escultura e continuou descontente.
Peretti, aos trinta e cinco anos, depois de muitos como desenhista industrial, trabalho que realizava na Petrobrás, se transformou no criador da maior novidade em ornamentação de Igreja. Sua arte está lá, acima do altar, espantando os fiéis. O próprio cardeal, segundo conta o pessoal do Colégio São João, achou “Psicodélico” o objeto. Depois concordou que seu efeito vai ser realmente novo.
Quando concluído o objeto da Igreja São João terá cores e sons. Por enquanto são só luzes. E para que, quando esteja concluído, não se repitam as dúvidas, Peretti explicou sua arte a trinta pessoas do bairro, no Colégio São João. Foram escolhidas apenas 30 pessoas, as quais demonstraram maior interesse e porque, mais de trinta não seria um bom número para criar um ambiente favorável.
Porque essa arte do nosso tempo, tem também muito de rito. Rito em que cada um vai se deixando conduzir pela luz amarela que vem junto com o som estridente, ou pela luz vermelha que provoca som mais grave. Muita gente sai dizendo que não entende. Mas aqui, o não entender pode querer dizer tudo, menos a negativa de que Clóvis Peretti esteja levando até eles alguma coisa nova”.
MEMORIAL DESCRITIVO de OBRA CINÉTICA para a IGREJA SÃO JOÃO BATISTA
PORTO ALEGRE – RS 1969
"DEUS É AQUELE QUE É.
NÃO TEM NOME E NEM IMAGEM.
A TÉCNICA ATUAL DECORRE DO CRIADOR CONSTANTEMENTE.
ELA É: NÃO FIGURA.
A TÉCNICA FOI CONVOCADA AO TEMPLO PARA DAR O MELHOR DE SI
AÍ ESTÁ A ARTE CINÉTICA. AÍ ESTÁ A INTELIGÊNCIA HUMANA TRADUZIDA.
O TEMPLO CONVOCA, ASSIM, A INDÚSTRIA.
CONVOCA A COMUNIDADE QUE É CONSTAMENTE SOLICITADA POR OBRAS CINÉTICAS.
CONVOVA O ARTISTA QUE ESTÁ PENSANDO EM ARTE-MOVIMENTO.
CONVOCA O CIENTISTA QUE COLOCA EM NOSSAS MÃOS A TÉCNICA. CONVOCA O FIEL A ACEITAR O SEU CRIADOR SEM IMAGEM E SEM NOME".
CLOVIS PERETTI
Nasceu em 20 de julho de 1935 em Frederico Westfalen, RS.
Autodidata em desenho e pintura. Foi aluno de Danúbio Gonçalves em xilo e lito e, também de Tadeus Lapinski, em Lito. Da primeira exposição coletiva no "MATABORRÃO" em 1961 até hoje participou em mais de 30 mostras, entre individuais e coletivas em diversas cidades do Brasil, em: Desenho, gravura, pintura, escultura, design, objetos eletrônicos, cinéticos, musica, video e multimídia. Obras em acervo no MAM de S. Paulo, MARGS e coleções particulares. Prêmio de OBJETO no SALÃO DE ARTES VISUAIS da UFRGS, Menção especial do juri - ARTE ATUAL BRASILEIRA do MAM - SP, medalha de ouro do SALÃO NACIONAL DE SESQUICENTENÁRIO DA INDEPENDÊNCIA.
A geração de Clovis Peretti preparando-se para uma exposição em Brasília
Revista Manchete 1972
Peretti faleceu em 1995..
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