quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

DIANTE da ETERNIDADE





MARTIN, John 1.789-1.854 – Fim do Mundo.




O incomensurável sempre intrigou e desorientou a criatura humana. O incomensurável do tempo e do espaço lança esta criatura na mais absoluta revolta ou - no extremo oposto - na aceitação passiva. Na revolta ela nega tudo o que transcende aos seus sentidos e aos instrumentos já inventados por ela e que prolongam as suas percepções empíricas. No lado oposto esta criatura humana aceita passivamente a eternidade como dado absoluto e contra a qual não há como agir.


A passividade total leva um ser humano a abandonar todo o seu fazer e todo trabalho contra a entropia e se entrega, em tempo integral, aos rituais para sintonizar com este incomensurável. Nestes rituais as palavras de ordem são o “nirvana”, o “está escrito” e o “apocalipse é inevitável”. Estas palavras de ordem são algumas motivações centrais das principais religiões orientais e ocidentais e que traduzem a sua aceitação sintonia passiva da eternidade.


É impossível cronometrar a eternidade, mesmo com os mais avançados instrumentos. Esta impossibilidade retira da criatura humana das suas proporções e jogam no imponderável. Uma fábula que este escritor ouviu do seu pai que nunca mais ouvi alhures. Dizia a fábula que um cubo de aço inoxidável recebe a cada mil anos uma única visita de um passarinho que vem afiar os seu bico numa das arestas deste cubo quilométrico. A eternidade inicia quando este pássaro faz a sua última visita. Esta última visita acontece quando o pássaro gastou tudo este cubo de aço inoxidável.










Donde viemos? O que somos? Para onde vamos?



Um descendente dos incas - que escolheu para atelier uma remota ilha do Pacifico - escreveu num dos seus quadros “Donde viemos? O que somos? Para onde vamos?”. Eugène-Henri-Paul Gaughin (1848-1903) estava no ato da criação desta obra (1897), longe do burburinho da civilização urbana industrial, lidando com o lixo que ela jogava nas praias imaculadas da Polinésia. Na criação desta obra o seu agora era uma civilização primitiva que não compreendia este europeu - descendente dos incas - picado pelas angústias em relação tempo universal. Tempo que para estes polinésios era do ritmo da natureza. Nada podiam fazer contra os seus ciclos de nascimento, apogeu e morte onde se inscreviam. Polinésios que se jogavam nas mãos do tempo climático, das estações do ano e as distâncias marítimas dadas entre suas ilhas.



Se na Historia todos os períodos, são solidários entre si. Não adianta nos interrogar sobre o infinito passado tanto como sobre o infinito do futuro se não conhecemos o presente.



Hannah Arendt distingue a eternidade de imortalidade. A imortalidade busca a preservação das civilizações, da polis e do indivíduo para enfrentar a passagem irreversível do tempo. Contudo apesar dos elaborados rituais egípcios para preservar os seus faraós e mesmo indivíduos singulares não produziu efeito. A ascensão, o apogeu e o declínio das civilizações, apesar de ultrapassarem várias gerações humanas, sempre a última geração possui a tarefa da sofrer a sua ruína e ver uma geração, nova e distinta iniciar o trabalho de promover o surgimento de uma nova e correr os riscos de um recomeçar improvável. Se a criatura descobre e aceita que contra a eternidade nada há a fazer, ela deixa todo o trabalho numa civilização.



O erro não consiste em conhecer e evidenciar as suas competências e os limites diante da eternidade, mas prometer o que não se pode cumprir. Todos os profetas autênticos, que possuem seguidores qualificados, conheciam este limite e as competências humanas diante dele. As suas profecias foram mal assimiladas quando os seus seguidores e sacerdotes prometeram fórmulas mágicas apenas para negar, baixar ou eliminar as angústias humanas diante deste limite.



A solidariedade que as espécies desenvolvem entre os seus membros parece ser um lenitivo diante da eternidade desproporcional à um único indivíduo da espécie. Solidariedade que é o contrário do solipsismo. Solipsismo que abre as comportas da eternidade que, na sua magnitude e irreversibilidade, esmaga o indivíduo no seu isolamento cultural, psicológico ou que se perde ou afasta dos seus. Os grandes centros urbanos das civilizações parecem serem soluções até certo ponto. Mas esta aproximação física nada significa. Não existe direito ao aconchego e à solidariedade se o conhecimento não impulsionar a vontade para transformá-la em ações nas quais exista uma legitima sintonia com o que melhor e mais positivo que esta civilização deixa no seu caminhos.



Leonardo da Vinci percebeu que as dimensões podem ser ampliadas não só no sentido linear e horizontal da linha de tempo, mas também no sentido vertical. Para Leonardo “tudo o que é contínuo pode ser dividido em infinitas partes”. Este princípio permitiu penetrar na relatividade, na energia nuclear e tornar eficiente o espaço numérico digital. “Um milionésimo de segundo não deixa dúvidas que é contínuo” que pode ser dividido em infinitas partes. Esta dimensão leva a criatura humana a viver os seus segundos e seus dias numa dimensão sem fundo.



As obras de arte, as instituições por tempo indeterminado e uma vida podem realizar a sua trajetória num tempo numa dimensão vertical sem fundo. Todos sabem este tempo limitado. Contudo este tempo limitado permite experiências que criam condições da solidariedade e de conforto das gerações entre si. Também é necessário aceitar que estes grandes bens da humanidade podem estar sujeitos a corrupções do tamanho ou maiores do bem que deveriam promover.







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