ARTE e GERMANIDADE
“Canto
o hino da pátria que permite ganhar o pão para os meus filhos”
José
SIMON professor rural de uma comunidade germânica ao longo do Estado Novo
Fig. 01 – Na imensa obra intitulada “ Revoluções Burguesas”
realizada entre 1983-7, e exposta no Panorâmio
Bad Frankenhausen, o pintor Werner
TUBKE 1929-2004 recapitula visualmente a história da- germanidade com base - na Arte
Evidente que não existe
arte alemã, nem brasileira ou ocidental. Arte é um fenômeno universal do gênero
humano. O que se poderia afirmar que o ENTE HUMANO possui diversas maneiras de
SER e de se expressar. No entanto a Arte está muito próxima ao ENTE humano.
Nesta intimidade constituiu-se uma das pontes deste ENTE inatingível com o
mundo tangível nas suas formas físicas e sociais. Assim a obra de arte
constitui-se como um dos seus índices
mais autênticos e continuados deste SER.
Fig. 02 – Albrecht DÜRER
(1471-1528) foi um dos mais expressivos representantes do que se estuda aqui
como germanidade na Arte. O seu retrato “Pai do Artista”
(1497) mostra o seu domínio do desenho, do detalhe a cor sóbria é coerente com
a escolhas plásticas de um artista que opera
coerentemente com o se tempo e ao mesmo tempo. Esta obra é, portado, um dos índices que WORRINGER
descreve como características da arte e do artista nórdico.
Uma obra de Arte 100%
original constitui um trabalho condenado a não ter observadores. O seu público
potencial não possui meios de entender e valorizar a mensagem do seu autor.
Esta obra de Arte terá recepção zero. No contraponto a esta solidão, o artista está
mergulhado numa cultura que o ultrapassa em todos os sentidos e direções. O
mínimo que ele necessita perceber é de que as suas competências e os seus limites
são aqueles do seu tempo e seu lugar. A obra que ele produz é o resultado de um
projeto no qual o seu papel é escolher elementos do repertório da cultura física
e mental que cerca o seu projeto. Esta mesma cultura do autor a receberá em
primeira mão esta obra física. Esta
mesma cultura extrairá os elementos simbólicos que geraram esta obra.
Cabe o aviso: inclusive
esta narrativa, em relação à arte alemã, possui como referencial o que
perceptível ao seu autor a partir do seu repertório originário da brasilidade.
Fig. 03 – A obra de Mathias Gothart GRUNEWALD
(c.1470-1528) Altar de Isenheim é decorrência e de toda uma tradição técnica e
mental desenvolvido ao longo do período gótico e em contato e distinção na do
Renascimento Italiano de sua época. Esta
RESSURREIÇÃO coloca no seu centro a figura humana e reflete a liberdade
da germanidade na Arte tanto nos meios técnicos como a forma inédita do grande ponto
de interrogação e própria para exercer a abstração pela composição da forma plástica
desta obra.
A cultura na qual está mergulhado o autor da
obra de arte, ou narrativa em relação à ela, possui competência para sustentar coerentemente
esta obra física de forma autônoma e fora do seu autor e de iniciar a sua
peregrinação pelo mundo afora - ou impedi-la. Os elementos físicos da obra
fornecem, para os seus observadores, a mentalidade que animou o seu autor gerando
uma recepção continuada e que transcende, no tempo e no espaço. Esta obra
física possui, assim, condições de se abrir aos sentidos dos seus semelhantes.
Fig. 04 – ALTDORFER Albrecht
1480-1538 A paisagem como tema autônoma de uma obra de arte possui, nesta
obra, na cultura ocidental uma das suas
primeiras realizações preservadas pelos seus observadores. A imagem está no lugar de algo Assim a germanidade desta obra de Arte exerce o
seu papel de abstração da Natureza reinterpretada e reduzida a duas dimensões e
que ela busca superar pela perspectiva geométrica, recém criada e esta obra pela
disposição plástica dos elementos a realiza a perspectiva visual.
O teórico alemão Wilhelm
WORRINGER (1881 -1965) distinguiu na sua obra “Abstraktion und Einfuelung”
(1908) uma das estruturas pelas quais os elementos físicos e mentais se
organizam conforme o lugar e o tempo. Para ele estão, de um lado, as regiões
quentes do planeta. Nestas regiões ensolaradas o modo de SER (Einfuelung
- natureza) é das culturas mediterrâneas, ou tropicais. Nestas regiões quentes
o artista vive epidermicamente e se expressa diretamente e sem grandes
medições, reflexões intelectuais ou rebuscados filtros de sua sensibilidade.
Fig. 05 – O artista e arquiteto Karl Friederich - SCHINKEL (1781 – 1841) é
mais conhecido pela evocação da cultura grega clássica. Contudo nesta sua
obra “catedral com torres” ele
evoca a germanidade na Arte com base
de obras góticas que estão retomadas na conclusão da Catedral de Colônia que
será o símbolo da unificação política dos
reinos germânicos na forma da Alemanha contemporânea unificada. Esta retomada
gótica será uma das expressões plásticas da tendência romântica na artes. Esta
tendência irá se disseminar pela cultura ocidental do século XIX e da qual o
Brasil possui expressões por todo o seu território nacional.
Já no pólo oposto coloca-se
o modo de agir do SER adaptado ao frio nórdico que ele denominou “Abstraktion”.
Este SER possui mais tempo para se fazer mais reflexivo, guardar e elaborar
mentalmente aquilo que concerne á Arte. Além disto ele está mais disposto a
acumular, arquivar e a refletir.
No seu contraste o SER mediterrâneo
vive entregue usufruir o instante presente dado, ao descarte e sem se preocupar
com grandes elucubrações filosóficas e também com estéticas mais abstratas.
Fig. 06 – O TRÍPTICO de VEIT STOSS (1447-1533),
elaborado entre 1477-1484, é a sua obra prima. Hoje em Varsóvia na
Polônia. Esta obra constitui uma das
autênticas obras do gótico tardio e uma das expressões da germanidade na Arte pela sua detalhada e minuciosa elaboração
formal e técnica. Contrasta por esta elaboração com as obras mediterrâneas do
Renascimento Italiano no qual a FORMA é tecnicamente menos afeiçoado aos
detalhes e ás minúcias técnicas e formais.
Miguel Ângelo percebeu e
distinguiu a germanidade como aquele
cuidado no detalhe e na descrição visual exaustiva nas artes plásticas. Nas manifestações
mediterrâneas ele apontava para as grandes formas, sem detalhes e dadas ao
usufruto direto do observador
A germanidade não se
isola da cultura eslava, saxã, do norte da França e dos países baixos
(flamengos). De outra parte a germanidade não coincide precisamente com o
Estado Alemão atual. Assim austríacos, boêmios, suíços ou holandeses podem ser
incluídos nas manifestações com características próximas do modo de SER da
germanidade.
Fig. 07 – O “Monumento a Batalha
da Nações”
de 1813, erigido em LEIPZIG no inicio do século XX e inaugurado
em 1913. O Völkerschlachtdenkmal possui 91 metros de
altura e salas comemorativas no seu interior. Ele celebra a culminância da
unificação dos Estados (Länder) germânicos que formaram na década de 1870 o
Estado Alemão. A sua forma externa
permite especular em relação ao modelo do monumento erguido uma década depois
em São Leopoldo para comemorar o centenário da imigração alemã. A inauguração daquele
de LEIPZIG precedeu a catástrofe alemã da derrota da I Guerra
Mundial ficou tristemente famoso pelo uso que a propaganda nazista fez dele. Contudo com a sua ampla com base
sugere o poder originário desta nação e a germanidade na Arte pela força da cor
sombria e pelas fantasmagóricas figuras humanas do seu exterior e interior.
Assim a manifestação que
ganhou maior relevo e coerência nesta cultura da foi a ARTE GÓTICA. Especialmente
quando se expressa em miniaturas, na pintura de cavalete, escultura e mesmo na
sua verticalidade arquitetônica como nas catedrais de Colônia, Ulm e Viena.
Esta manifestação não
impediu a Albrecht DÜRER (1471-1528) aderir e transitar no espaço do Renascimento
italiano. Contudo o mestre do altar de Issenheim Mathias GRÜNEWALD (1470-1528) ,
Veit STOOS (1447-1533) mantém a coerência no detalhe e ênfase na descrição minuciosa.
Assim também procedem nas suas obras o pintor Albrecht ALTDORFER (1480-1538) e
uma série subsequente de pintores maneiristas. Altdorfer também cultivou a
paisagem em si mesma. Esta busca da “paisagem
por ela mesma como tema de uma pintura”, constituiu motivo e tema de um
grande número de pintores flamengos.
Fig. 08 – Caspar David FRIEDERICH (1774-1840)
na obra “Arvores e Lua” ,1824, óleo
19.5 c 25.5 cm expressa a germanidade
na Arte com os detalhes minuciosamente observados e desenhados. A noite, o
mistério e fantasmagórico das regiões frias nórdicas e predispõe autor e o seo
observador a dar livre curso à “ABSTRAKTION”
No início da História
contemporânea os artistas germânicos do Iluminismo deixaram se seduzir pelas artes
de Roma e da Grécia Clássica. A obra de Johann Joachim WINCKELMANN (1717-1768)
encontrou uma série de artistas e depois arqueólogos que consagraram a suas
vidas a esta estética. Desta preocupação derivaram as tendências Neo-Clássicas.
O Romantismo colocou a Idade Média e sua
arquitetura, escultura e música diante destes artistas.
Fig. 09 – Adolph
von MENZEL (1815-1905) elaborou, entre 1872-1875, a pintura “Modernos
Ciclopes”. Nesta imagem ele mostra o acúmulo de gente, matéria prima e
tecnologia que evidencia triunfo da era
industrial e da linha de produção que sustentaram materialmente a germanidade na Arte, a partir do século XIX.
Estas tendências neo-góticas
estavam em plena expansão quando os imigrantes deixaram a Alemanha. A conclusão da catedral de Colônia, em 1884, marcou fisicamente a unificação da Alemanha e
ponto alto das tendências românticas. O Rio Grande do Sul recebeu o mestre João GRUNEWALD (1832-1910)e que havia trabalhado no canteiro
de obras (bauhaus) da Catedral de Colônia [http://www.koelner-dom.de/home.html
].
Fig. 10 – Adolph von MENZEL (1815-1905)
na sua obra “Praça das Ervas de Verona” (1884), evidencia a profunda germanidade da sua Arte. Esta se
materializa pelas cores sóbrias, a atenção aos incontáveis detalhes e pela materialidade
da tinta que usa. Esta materialidade da tinta continua a ser explorada por
Anselm Kieffer, nascido em 1945, em suas obras “matéricas”.
O Expressionismo
encontrou na Alemanha terreno fértil que estava marcado pelas contradições
culturais, econômicos, sociais e políticas que precederam, acompanharam a
derrota na I Guerra Mundial e as suas consequências. Contra esta dilacerante
tendência estética tentou-se erguer a arte das formas puras construtivas e sem
figuração propostas pelos mestres da BAUHAUS.
Fig. 11 – Lyonel
FEININGER (1871-1956) na pintura “O Motim” (1910) este pintor norte-americano
profundamente identificado com a germanidade na Arte busca o caricato, o
estranho e insólito.Foi professor da Bauhaus no período áureo (1912-1932) desta
instituição germânica proveniente do movimento DEUTSCHER WERKBUND (1907) e
associado ao sentido pragmática da arte desenvolvido no século XIX na
Inglaterra sob a designação Art and Crafts.
A reconstrução pós 1945
teve na arte uma das formas para a Alemanha dizer a si mesma para o que veio e
mostrar ao mundo este seu sentido. A Documenta de Cassel foi, a partir de 1955,
uma das instituições que acolheu, estudou e divulgou mundo a fora este novo
modo de SER da arte alemã, sua presença no mundo e o seu respeitoso diálogo e
interação com as demais culturas e tendências estéticas.
Fig. 12 – Joseph BEUYS
(1921-1986) num fotograma de das suas
últimas ações desenvolvidas em 1986. Nesta ação procurava chamar atenção para individualidade e
autonomia do artista e como tal na busca de um espaço no qual este EU possa ser
sujeito ativo e autônomo capaz da sanção de sua ação moral, estética e social.
Este piloto de um caça alemão da II Guerra
Mundial, caído numa aldeia russa e salvo pelos seus inimigos tornou-se um
verdadeiro xamã da germanidade na Arte.
Coerente passou a desenvolver ações e movimentos que tinham como fonte e
repertório objetos e situações do seu tempo e lugar. Com esta abertura
procurava a medicina das suas próprias feridas e aquelas da identidade alemã
destroçados pelas ideologias, as guerras e a divisão (1945-1990) da Alemanha em
duas.
A queda do Muro de
Berlim trouxe para o convivia da Alemanha unificada os representantes da Escola
de Leipzig que se sucederam e estão, em2012,
na sua 3ª geração.
O que deve destacar, no
mundo germânico, é o mundo conceitual que sempre envolveu e acompanhou
atentamente as obras de arte. Este mundo conceitual compre a disposição
germânica de acumular, de arquivar e de refletir sobre o fenômeno e a obra de
arte que o teórico Worringer lhe apontara em 1908. De memória e possivle nomear
alguns destaques como Alexander Gottlieb Baumgarten(1717-1762 criador de termo
“Estética”, Georg Wilhelm Friederich
Hegel (1770-1831), Alois Riegl (1858-1905 com a sua concepção de “Kunstwollen”, Carl Jacob Christoph Burkhardt (1818-1897), Aby
Warburg (1866-1929) e o seu instituto.
Fig. 13 – A DOCUMENTA de CASSEL. Iniciada em 1955, pôs em prática a oportunidade de o artista alemão e das demais
nacionalidades de conviverem e trocarem sentimentos, projeto e realizações
provenientes dos cinco continentes. Se de um lado era institucional, e continua
sendo, do outro lado preserva e promove a individualidade e autonomia do artista.
Este EU é sujeito ativo, responsável e
autônomo e como tal na busca de um espaço no qual capaz da sanção de sua ação
moral, estética e social. Esta imagem fotográfica mostra esta individualidade e
diferenças a partir das roupas e das formas de vestimenta. Certamente mostra a germanidade na Arte competente para se
renovar coerente com o seu tempo e lugar.
A Escola de Frankfurt, iniciada em 1923, retomou
as concepções de Arte partindo das questões de Karl Marx (1818-1883). Estes, e
muitos outros, acolheram, deram suporte
como historiadores, críticos e fizeram fluir esta produção intelectual na
indústria cultural. Mas todos põem em relevo a autonomia do artista e a primordial
idade da obra de arte. Caso contrário podem ocorrer derrapagens conceituais, tendo
efeitos desastrosos como ocorreu com a “arte
degenerada”, onde um líder afirmava “arte
alemã é clara”. Nada mais equivocado se forem contempladas as escuras obras
germânicas de todos os tempos.
Fig. 14 – Werner TUBKE (1929-2004)
num detalhe do imenso mural “Revoluções Burguesas” - realizado
entre 1983-7 e para o qual foi construído o Panorâmio Bad Frankenhausen - trata as imagens das individualidades que se destacaram na germanidade na Arte e na Cultura. O
tratamento formal desta obra é coerente com esta mesma germanidade tanto no
minucioso detalhamento, pela cor negra dos contornos de chumbo dos vitrais
góticos e pela abstração temática de uma cena possível de acontecer apenas nas
artes, na imaginação, e não no mundo
empírico e fotográfico.
Se quisermos ser fiéis a
pensamento de WORRINGEN temos de admitir que o imigrante alemão foi afetado no transplante
para as regiões mais quentes do paralelo 30 Sul, proveniente que das frias regiões
do paralelo 50 Norte. Assim este ENTE HUMANO TRANPLANTADO DO SEU MEIO,
enfrentou neste novo clima outra realidade nas suas maneiras de SER e de se
expressar. Em todo caso o fato deste deslocamento não deixou de chamar a
atenção, em 1834, quando o viajante francês Arsène Isabelle escreveu:
“Minha admiração não foi
menor ao ver, quase sob o trópico, uma nação das regiões polares, conservando
hábitos, seus costumes, sua vida ativa, e dando origem a uma geração que deve
um dia mudar a face do país”.
Fig. 15 – Em pleno século XXI o jovem pintor Michael
TRIEGEL, nascido em 1968, interpreta em 2008,
o tema da “Paisagem visual” em técnica mista e no formato 47 x 64 cm. Ele
é considerado como a 3ª geração da Escola de Leipzig e uma das muitas e variadas expressões da germanidade na Arte que continua a sua
trajetória pelo tempo e espaço. Estas novas gerações que acreditam em si mesmas
tendo por fundamento o rico variado e único legado e patrimônio estético
germânico de todos os tempos.
Em resumo é necessário
admitir, que Arte germânica expressa o ENTE de sua Nação em cada nova época e
em circunstâncias únicas e inéditas. A Alemanha continua um projeto coerente
com o seu tempo e próprio espaço. O imigrado, desta região, possui ainda os
traços e as forças de sua origem, porém que evoluem em outra nação e
circunstâncias distintas daquelas dos seus antepassados.
FONTES
WORRINGER, Wilhelm (1881 - 1965). Abstraccion
y naturaleza. 1.ed. 1908. México :
Fondo de Cultura Econômica,
1953. 137p.
____. La esencia del estilo gótico.(1ª ed.
1911) Buenos Aires: Nueva Visión, 1957.
144p
RETÀBULO DE
EISENHEIM - GRÜNEWALD
ALBRECHT DURER
O RETRATO INDIVIDUAL no PERÍODO
COLONIAL BRASILEIRO
Johann Joachim WINCKELMANN
MUSEU da ESCOLA
ALEMÃ
EXPRESSIONISMO
ALEMÃO
BAUHAUS como INSTITUIÇÂO ALEMÃ
ANSELM
KIEFER
MEMÓRIA VISUAL da IMIGRAÇÂO
ALEMÃ
DOCUMENTA de CASSEL
MICHAEL
TRIEGELL
ACADEMIA
de ARTES VISUAIS de LEIPZIG
WERNER
TÜBKE
ELOGIO de um ITALIANO ao APOIO
da CULTURA pelo GOVERNO ALEMÃO
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