sábado, 29 de outubro de 2016

189 – ICONOGRAFIA SUL-RIO-GRANDENSE.

21 - Obras de MAGLIANI como índices ativos e identificados positivamente com a condição humana da vida na cultura do Rio Grande do Sul
Continuação e complemento de Artes Visuais sul-rio-grandenses – 14

21.1 – A pessoa de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI. 21.2 –  As obras de MAGLIANI e o seu sentido. 21.3 – A opção de MAGLIANI extrapola os limites sul-rio-grandenses. 21.4 – As obras de arte de MAGLIANI. 21.5 – As leituras iconológicas possíveis nas obras de MAGLIANI. 21.6 – Competências, limites e uma moça que não sorri nas fotos. 21.7 – Uma artista com obras para mostrar 21.8 – MAGLIANI transcende a linha de montagem industrial e retoma a essência do agir artístico. 21.9 – A nova disciplina da ÈPOCA INDUSTRIAL e um PROJETO para TODA a VIDA. 21.10 – A defesa de MAGLIANI do seu projeto de vida 21.11 – A memória da obra e da pessoa de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  foto
Fig. 01 –  Maria Lídia dos Santos MAGLIANI transitou da ERA INDUSTRIAL e esteve presente e ativa nos albores da ÉPOCA PÓS-INDUSTRIAL. Da primeira aprendeu a disciplina do trabalhar dentro de um projeto unívoco e linear. Da segunda extraiu o pensamento, os conceitos e a memória. Esta memória está a caminha para receber narrativas adequadas para as redes locais e mundiais.   .

21.1 - A pessoa de Maria Lídia
dos Santos MAGLIANI.

Maria Lídia dos Santos MAGLIANI transfigurou-se numa pessoa notável a partir do seu projeto de vida. O projeto de MAGLIANI - de dedicar a sua existência exclusivamente ás tintas e aos pinceis - não lhe abriu portas e nem facilitou a sua vida. Porém ela foi até as últimas consequências e manteve este rumo até os seus últimos dias.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  1993 DICIONARIO de ARTES PLASTICAS RS  contracapa in Renato ROSA 2000
Fig. 02 –  A obra de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI percebe e representa imagens do corpo feminino de dentro do seu ENTE para o exterior do se SER. Esta leitura, interpretação e figuração inverte o processo tradicional do corpo feminino representado pela mediação do olhar masculino.

 MAGLIANI fez o seu caminho solitário e áspero. Tirou de si mesma os próprios meios, numa época na qual não havia cotas para afro descentes na universidade brasileira e raras se profissionalizavam por meio do seu curso superior. Lutou contra o preconceito e o tabu de uma mulher fazer das artes visuais o seu caminho e seu modo de vida. Fez a sua carreira CARREGANDO HEROICA e SOLITÁRIA as MARCAS INDELÉVEIS do SUL do Brasil. Neste extremo sul brasileiro ela se perfilou com a estirpe das mulheres míticas. Andou na senda de Ana Terra, da valorosa Anita Garibaldi ou da letrada Luciana de Abreu. MAGLIANI absorveu a seiva da terra sem transformá-la em marketing ou propaganda regionalista. O critico Jacob KLINTOWITZ destacou o seu projeto e as condições de sua origem quando escreveu (2013)  em relação à MAGLIANI:

As suas dificuldades comoviam. E a sua obra, ainda mais. Tinha uma força ímpar, de corte expressionista, e me parecia uma artista marcada pelo sul. Os nossos invernos, as estações bem definidas, a solidão da planície pampiana, a tradição de cultivar o essencial, o ascetismo da formação gaúcha, tudo me fazia acreditar que ela bem representava o sul. Nos poucos encontros pessoais ela não  declarava esta afinidade. E nem outras, na verdade. Emergia apenas a sua áspera relação com o cotidiano   

O  Rio Grande do Sul possui em MAGLIANI uma represente impar , uma identidade e um patrimônio no seu exemplo de vida, na sua obra e no seu pensamento lúcido.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  “NÃO SE TRATA  DISSO” Folha da Manhã nº 1.449 p. 45 1977,   in Renato ROSA 2013
Fig. 03 –  Maria Lídia dos Santos MAGLIANI como interprete plástica das obras de sue amigo e escritor Caio Fernando ABREU ampliou o mudo de observadores de suas obras visuais. Esta obra gráfica de MAGLIANI forma um mundo de signos e de pesquisas que merece uma atenção própria e separada.  .

Apesar da mundialização as pessoas continuam a nascer, a crescer e se educar nas condições e nos limites telúricos de sua terra. Continuam a serem marcados profundamente por suas origens singulares (Weltgeist) e que ganha visibilidade e materialidade nas suas obras de arte

 

21.2 - As obras de MAGLIANI e
o seu sentido.

Uma obra Maria Lídia dos Santos MAGLIANI é índice das competências e dos limites estéticos, econômicos e sociais de sua época, seu lugar e a sua origem. 

Nestes limites Maria Lídia dos Santos MAGLIANI não tomou como pretexto esta transição e quebra de paradigmas anteriores.  Nesta derrocada dos antigos valores MAGLIANI não transigiu, na sua obra e na sua carreira, do modo de ser ela mesma. Por esta razão a sua obra se constitui em índice seguro das competências e dos limites que a sua pessoa de artista plástica encontrou no Rio Grande do Sul no final do século XX. É índice das realizações possíveis a uma artista sul-rio-grandense nos primórdios de século XXI no Brasil.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  figura sentada 1987  in Renato ROSA, 2013
Fig. 04 –  A obra pictórica de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI possui a singularidade de uma linguagem própria e coerente com os meios visuais dos quais ela se vale.. Ao mesmo revela o olhar baixo da servidão e do hábito  de não fixar o rosto do seu interlocutor que pertence a um outro mundo social, político e econômico. O próprio rosto do artista revela a atenção forçada e o tabu de não sorrir para quem a esta observando,

Certamente teve de lutar contra a opinião geral e seguir os passos e as pegadas de uma geração de artistas que tiveram se tornar “estrangeiras” para completar o seu projeto. Projeto no qual se transfigurarem em paradigmas, em juízes ou em referências nesta travessia para o grande mundo nacional e internacional.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012),  A PRAIA, 2004 in Renato ROSA 2013
Fig. 05 –  A série de imagens que Maria Lídia dos Santos MAGLIANI observou e experimento no praia recebem o tratamento industrial da série em sequência típica  da ERA INDUSTRIAL.  O rigoroso domínio formal da superfície plana com o predomínio do uso das cores quentes e ausência do verde compõe uma sinfonia cromática na qual a formas agitadas conferem o movimento de algo fugaz da qual a arista consegue captar a essência do que ira permanecer sob a forma de uma obra de arte.

Esta vida, projeto e obra produziram-se no âmbito da passagem da ERA INDUSTRIAL para a ÉPOCA PÓS-INDUSTRIAL. MAGLINI se incorporou ao seleto grupo dos “príncipes” ou daqueles que principiam, instalam e materializam novos e inesperados mundos estéticos, intelectuais e morais. O preço desta temeridade é o enfrentamento dos rigores e das angústias que acompanham todas as rupturas epistêmicas, técnicas e estéticas.

O campo das artes não se reduz a uma charqueada cujo processo apenas expõe, aos gritos,  corações, entranhas e couros  nos balcões do mundo como produto final deste sistema industrial. Mesmo nas artes visuais vai distante o tempo em que bastava demonstrar gritos e emoções - ou embarcar num frio trem de um sistema - para ser aceito como inovador e fazer sentido para o seu tempo, lugar e sociedade. A ÉPOCA PÓS-INDUSTRIAL necessita deste passado recente ou remoto. Porém exigem do artista a sua compreensão, elaboração e coerência na incorporação num novo TEMPO, num LUGAR diferente e numa SOCIEDADE em constante metamorfose formal.  SOCIEDADE em profundo processo de modificação provocada pela apropriação dos segredos do código  genético, pela ampliação do LUGAR pelo domínio do espaço externo e pelo TEMPO sob rigoroso controle da Informática.


21.3 -  A opção de MAGLIANI extrapola
os limites sul-rio-grandenses.

Neste novo contexto continua verdadeiro a observação de Tolstói “se queres ser universal cante a sua aldeia”. As pessoas continuam nascerem nas suas aldeias, províncias ou países. O caminho da aprendizagem sempre foi do próximo para o remoto, do intuitivo para o e ideal e o abstrato. Alguns são rápidos e sensíveis em perceber isto e velozes no caminhar e trabalhar. Maria Lídia dos Santos MAGLIANI fez este caminho e se imbuiu desta origem e carregou nas numerosas mudanças físicas mundo afora a bagagem do essencial.

O essencial era o seu ENTE e conhecimento continuado e coerente com este ENTE. O seu modo de SER, no mundo, permitia, e até necessitava, deste perambular constante dentro e fora dos limites do Rio Grande do Sul.

Com o “ascetismo da formação gaúcha MAGLIANI enfrentou os complicados  ‘Nós Górdios’ do final do século XX e os primórdios de século XXI. Transcendeu a sua “aldeia de origem” sul-rio-grandense e disseminou  as suas realizações no Brasil e o Mundo Pós-Industrial.

Restabeleceu a essência das coloridas, vibrantes e multivariadas culturas de continente africano dos seus antepassados. As técnicas e construtivas de sua obra pintada e desenhada navegam na lógica da construção plástica a mais segura da pintura europeia de todos os tempos. As conexões com a cultura norte-americana atualizaram a sua inteligência para a Arte Pop e uma série de tendências da democratização do modo de agir de quem se dedica à Arte.



 21.4 – As obras de arte de MAGLIANI.

A obra de arte é primordial. Sem ela estaríamos na metafísica ou no puro fazer e trabalhar a que estão condenadas todos os seres vivos.

 Na obra de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI a metafísica toma corpo físico e bem sensível. Os sentidos humanos são convocados, por ela, a se defrontam com a cor, a textura, as linhas e as formas plásticas. Este mundo, formal e perceptível, é rigorosamente escolhido pela artista pintora com o objetivo de entregar o seu mundo intelectual e  propositivo sem ruídos, límpido e sem excessos.

 A escolha - tanto dos elementos perceptíveis, como do mundo imaterial e próprio da artista pintora – possuem coerência e se sustentam reciprocamente. Isto não quer dizer  que eles sejam agradáveis e nem que estejam no caminho da mimese. Eles constituem uma ordem de outra natureza. Outra natureza na qual o “esplendor da verdade” se evidencia e prescindem da perspectiva, do claro escuro e do meramente fotográfico.

Obras que se configuram no ascetismo plástico de tinta sobre uma superfície quando são pinturas. Quando são desenhos são linhas, são superfícies recortadas e planas que se apoderam de toda a superfície que lhes é oferecida.

O observador não pode se queixar do hermetismo, ou de signos cabalísticos ou arbitrários. MAGLIANI conhece o repertório de signos, de índices e de referenciais dos seus observadores. Ela é competente, como professora, para oferecer para uma criança o seu mundo de faz de conta. Ao adulto e ao intelectual não esconde o jogo ou se enclausura numa torre de marfim hermética e superior.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  Cenário A LIBERTAÇÂO do DIRETOR Ivo BENDER     in Renato ROSA 2013
Fig. 06 –  Os cenários de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI em cooperação de Elton MANHANELLI  para peças teatrais de Ivo BENDER tornaram-se antológicos. O teatro de BENDER encontrou nas pesquisas em MAGLIANI  um universo carregado de sentido. A própria pintora encarnava personagens das peças levadas aos palcos de Porto Alegre conferindo movimento, expressões e figurinos carregados com a sua força pessoal  .

21.5 – As leituras iconológicas possíveis
nas obras de MAGLIANI.

Maria Lídia dos Santos MAGLIANI construiu a sua obra com sólidas experiências plásticas e que mantém coerência do começo ao final de sua obra. Uma moça que não sorria para o fotógrafo produziu uma obra da qual não é possível esperar quadros para decorar paredes, transigir com modismos passageiros ou pretensões de uma mimese de algo que não pertence ao ENTE que a criou. A sua beleza é o esplendor da verdade sul-rio-grandense, brasileira e afra universal.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  andando 1977  in  Renato ROSA, 2013
Fig. 07–  A máscara esteve presente em todas a s civilizações e latitudes. Ela mostra e dissimula ao mesmo tempo. Mostra o sonho, a intenção  e a pessoa (persona). Dissimula o ENTE que se esconde no seu modo de SER no mundo.  Maria Lídia dos Santos MAGLIANI possui as vertentes nas quais transita a máscara como no teatro, nos rituais carnavalescas e nas profundas raízes dos rituais afro universais,


A máscara esconde o rosto e ao mesmo tempo revela as intenções, o pensamento e a estética do seu criador e de quem a usa. Os rostos, pintados por MAGLIANI, prescindem e escondem o cérebro para dar lugar maior aos olhos e para a boca distorcida. A sua estrutura é a de um esqueleto próximo dos crâneos das “vanitas” dos pintores de todo os tempos e lugares. Porém não pertencem mais a um cenário ou natureza morta. As mascaras de MAGLIANI são protagonistas e são a razão de ser da obra.  Nesta direção do protagonismo estes rostos são releituras das máscaras africanas reelaboradas para projetar sentimentos, conhecimentos e rituais de identificação e pertencimento.
Maria lidai dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  FORMATURA 1966 -  in Renato ROSA, 2013
Fig. 08 –  Maria Lídia dos Santos MAGLIANI é a moça que não sorri nem na hora da conquista de um graduação num superior concluído. Ela pertence à geração dos jovens irritados e incomodados com o seu tempo, o seu lugar e a sociedade. A foto é do ano de 1966 quando o golpe militar prometia, mas todos sabiam que ele não podia oferecer para todos e manter o que ele prometia. Este hábito da integridade intelectual estética e moral permitiram à MAGLIANI não deixar-se enredar por caprichos e se desviar do seu projeto de vida. Neste projeto ela não via nada risonho... .

21.6  – Competências, limites e
uma moça
que não sorri nas fotos.

Para se aproximar, entender e se apropriar do sentido da obra Maria Lídia dos Santos MAGLIANI impõe-se conhecer os limites com os quais ela se defrontou. Limites que evidenciam e ressaltam as competências do que lhe foi possível realizar. Limites que ela transcendeu para doar a si mesma com o objetivo de que a sua obra atingisse este sobre-humano que a inscreve entre uma categoria dos notáveis.

Limites rigorosos dos quais estava consciente e que ela faz entrever numa carta, do dia 03 de maio de 2006, para Renato ROSA[1]. Nesta carta na qual escreveu:

Há anos não tenho mais como sustentar a pintura, ultimamente não tenho  como sustentar a mim mesma. A São Paulo civilizada, da qual continuo gostando muito, ainda existe, mas não é para minha bolsa. Não tenho saúde para esperar a esta altura da globalização”

MAGLIANI encontrava-se num dos pontos chaves brasileiros para receber e interagir com as redes mundiais das artes visuais. O preço, para esta interação, era, no entanto, o salto para o sobre-humano descrito por Nietzsche afirmar (2000, p.134)[2] que:

a arte não pode ter sua missão na cultura e formação, mas seu fim deve ser alguém mais elevado que sobre passe a humanidade. Com isso deve satisfazer-se o artista. É o único inútil, no sentido mais temerário


[1] - ROSA, Renato et  alii .MAGLIANI A solidão do corpo Porto Alegre : Pinacoteca Aldo Locatelli-Prefeitura de Porto Alegre   2013 , s/p. il col.

 2  NIETZSCHE, Frederico Guillermo (1844-1900)  Sobre el porvenir de nuestras escuelas. Barcelona: Tusquets, 2000. 179.      


Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946)-2012  TRINTA ANOS da CRIAÇÂO de ISRAEL 1978, im Renato ROSA, 2013.
Fig. 09 –  Maria Lídia dos Santos MAGLIANI nasceu um ano após a II Guerra Mundial. Do fim do Estado Novo e dois anos antes da criação do Estado de Israel. Ela colocou a Estrela de Davi sangrando a atravessada por cravo ensanguentado colocado entre as máscaras (personas) da DOR e da ALEGRIA.


 A utilitária metrópole de São Paulo reservou um generoso e efervescente espaço para as artes visuais. Mas exige coerência, ortodoxia e subordinação à sua Bolsa de Valores conectada à rede mundial. O Mercado de Arte que aceita, que difunde e que compra obras de arte coerentes com o sistema de seus sucessivos descartes e obsolescências programadas.

A pessoa e a obra de Maria Lídia MAGLIANI colocadas nos limites do final do século XX e os primórdios de século XXI percebeu as realizações possíveis neste novo tempo e lugar. No entanto passou distante dos caprichos obsolescências programadas e dos sucessivos descartes para manter a sua arte nos patamares mais elevados. Patamares  inerentes aos hábitos de integridade intelectual, estéticos e morais que uma obra de arte exige de si mesma para escapar da entropia, do consumo e se projetar como um índice aceitável do seu TEMPO, seu LUGAR e sua SOCIEDADE que a origina. Evidente que o receptor desta mensagem está no direito de desconsiderar, se desconectar e procurar outros caminhos. Isto não impede que a assimilação da rede mundial seja lenta, seletiva e a espera de uma nova geração com interesses semelhantes. MAGLIANI fez a sua parte, Cabe especialmente ao Rio Grande do Sul buscar o conhecimento, a elaboração de narrativas e a sua adequada formatação para continuar a fazê-los circular pelos caminhos abertos pela artista com a sua obra, conceitos e seu pensamento.
Fig. 10 –  A vida e a obra de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI transitou da ERA INDUSTRIA e esteve presente e ativa nos albores da ÉPOCA PÓS-INDUSTRIAL. Da primeira aprendeu a disciplina do trabalho dentro de um projeto unívoco e linear. Da segunda extraiu o pensamento, os conceitos e  o cultivo da sua memória e que caminha para receber narrativas adequadas para a redes mundiais
[ clique sobre o gráfico para ler ]   
Com este feito de MAGLIANI  uniu e moldou, na materialidade da sua obra,  sua origem do Rio Grande do Sul com uma brasilidade autêntica que emergem dos fortes e inegáveis traços afro universais. Nesta coerência de organização final, de sua obra de arte, estão presentes e legíveis os percursos dos difíceis sofridos degraus da percepção do seu próprio problema, da flexibilidade, as redefinições e os expurgos das tentações daquilo que não fazia sentido e nem pertencia ao seu ENTE. ENTE legível no seu modo de SER na sua obra que caminha, se move no mundo e representa quem as criou.

Com estes atributos a obra de MAGLIANI universalizou as circunstâncias de sua autora e do povo e lugar de origem.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  Retrato falados  1981  a Renato ROSA, 2013
  Fig. 11 –  O grafismo-  cultivado por Maria Lídia dos Santos MAGLIAN  é competente para trazer ao mundo físico e social as pulsações provenientes da da sua imaginação, silêncio e singularidade   . O seu ritmo das séries gráficas e plásticas respondem ao ritmo do ERA INDUSTRIAL tanto na sua produção e consumo..

21.7– Uma artista  com obras
para mostrar

Uma obra Maria Lídia dos Santos MAGLIANI estava consciente e com suficiente erudição para avaliar e medir a sua obra com a qual não se confundir para conferir-lhe esta universalidade e funcionar como obra de arte mesmo na sua ausência. Ela declarou, em 1987, para  João Carlos Tibursky[1] do jornal do MARGS

Aparentemente é muito intuitivo, impulsivo mesmo, principalmente agora, quando a figura aparece mais solta, a pincelada mais livre. Acho que o racional aparece na elaboração da linguagem plástica, na escolha dos materiais, na maneira de compor os elementos no espaço e na opção por determinadas cores em detrimento de outras. O que aparece como espontâneo, na minha pintura, é, na verdade, fruto de muita elaboração plástica e gráfica. O psicológico, filosófico ou sociológico, em que muitos se prendem à primeira vista. Não está para mim em primeiro plano, neste momento, apenas passa pelas frestas da disciplina, o que considero muito bom, pois do contrário, o resultado seria muito frio. Considero que o meu trabalho é muito aberto à interpretação de cada espectador e que cada um vai encontrar nele, ou acrescentar a ele as suas prioridades. Para alguns será importante a discussão da linguagem em si. Para outros, a investigação da condição humana”.

Sem renunciar à sua autonomia, à primordialidade da obra física e a sua rigorosa construção formal e estética a oferece pronta e lógica para viajar para outros tempos, lugares e sociedades.

Neste trabalho possui um projeto no qual sabe e distingue o que pode entrar e aquilo que não pode ser admitido numa determinada obra que ela assina  com toda coragem, convicção e garantia de uma mensagem única, original e datada ao mundo.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012) JANELA de SAMBA in Renato ROSA, 2013.
Fig. 12 –  O ritmo da sequência das nove imagens dos passos do samba vistos de uma janela é acentuado pelo traçado de linhas diagonais e pelas cores vibrantes dizem do trânsito que M  aria Lídia dos Santos MAGLIANI sofre no transitou pela ERA INDUSTRIAL Da  um lado está a rigorosa construção plástica de outro lado o jogo da inspiração e compulsão pelo trabalho para produzir uma imagem pronta para viajar pelo mundo da ÉPOCA PÓS-INDUSTRIAL.


21.8 – MAGLIANI transcende a linha de
montagem industrial e
retoma a essência do agir artístico.

Para o universo estético de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI vale a sentença  ENTE no SER” ou “a ARTE ESTÀ EM QUEM PRODUZ e NÃO no QUE PRODUZ”. A primordialidade da obra arte se sustenta enquanto este objeto sensorial for competente para entregar ao seu observador o ENTE HUMANO na sua essência ou ao menos o maior número de informação e índices de sua origem.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  ZH em 1970 para conto de  Renato ROSA,  2013
Fig. 13 –  As séries de imagens gráficas, produzidas por Maria Lídia dos Santos MAGLIANI, para ilustrar periódicos, livros e cenários revelam o seu domínio da sua linguagem. A  composição, as escolhas das proporções e a eliminação de qualquer ruído visual tornam incontornáveis os resultados. Sem cair na busca da narrativa visual e no mimetismo naturalista também guardam uma respeitosa distância do texto que ela reforça mantendo a sua própria autonomia. A sua obra funciona mesmo separada do texto que ilustra e reforça com a sua presença.

O fazer artístico possui por meta e como projeto esta fortuna de que a OBRA de ARTE, no seu MÍNIMO material, seja competente para entregar, ao seu observador,  o MÁXIMO de seu autor, no momento da sua criação.

As circunstâncias da criação e da recepção da obra de arte tornam-se determinantes na fortuna deste projeto. MAGLIANI viveu a culminância da ERA INDUSTRIAL e transitou no primórdio da ERA PÓS-INDUSTRIAL. Culminância da ERA INDUSTRIAL na qual ela semeou abundantes imagens múltiplas na forma de ilustrações para periódicos e livros. Na ÈPOCA PÓS-INDUSTRIAL a sua obra embarcou nos diversos suportes e meios da informação numérica digital.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012) ANOS 1990  in Renato ROSA, 2013.
Fig. 14 –  Os objetos, as vestimentas e acessório produzidos por Maria Lídia dos Santos MAGLIANI formam um capitulo separado na sua obra. Contudo está carregados com a mesma coerência formal de suas pinturas, desenhos e ilustrações  .

21.9 – A nova disciplina da ÉPOCA INDUSTRIAL
e um PROJETO para TODA a VIDA. 

O projeto de vida, a coerente preparação e a prática continuada das artes visuais foi levado por Maria Lídia dos Santos MAGLIANI até as últimas consequências. Esta coerência entre o plano ideal e o mudo empírico indica as competências e os limites que a pessoa desta artista plástica encontrou no Rio Grande do Sul no final do século XX e possibilitou as suas realizações possíveis nos primórdios de século XXI no Rio Grande do Sul, no Brasil e mundo afora.
Fig. 15 –  Maria Lídia dos Santos MAGLIANI longe do Rio Grande do Sul reunindo artistas de Minas Gerais na cidade de Tiradentes. Profissionalmente preparada pelo seu Curso Superior em Artes Visuais e pela sua  formação pedagógica no Colégio de Aplicação da UFRGS  sentia-se segura no exercício de um projeto civilizatório no qual a ARTE era o núcleo e motor. O projeto era sério demais para qualquer sorriso da parte.

21.10 – A defesa de MAGLIANI do
seu projeto de vida

 Maria Lídia dos Santos MAGLIANI estava consciente do seu projeto de vida, de arte e das suas circunstâncias.  Numa pergunta do repórter Tibursky, do jornal do MARGS  de1987,  em relação à negritude, ao feminismo,  a ecologia frente a sua obra a artista se pronunciou:

 Na questão sobre a ideologia da negritude existe uma confusão grave: o movimento não nega a cor branca nem qualquer outra, apenas afirma os direitos da raça negra, ainda esquecidos, mesmo num país mestiço, e reivindica a igualdade para todas as raças. Meu trabalho expressa, ou pretende  expressar a mim como um todo. Logo, estão incluídas nele todas  as minhas descobertas, dúvidas e preocupações – também o feminismo, a ecologia e a negritude. Estão, incluídos com todas as coisas que me formaram até aqui, mas não estou interessada em fazer panfleto  de nada, não sou militante de nenhum movimento específico. Pratico minhas ideias, não gosto de proselitismo”.

Nas declarações, desta entrevista, MAGLIANI  distingue e orienta naquilo que é essencial na sua arte  expressar a mim como um todo” A ARTE sempre é EXPRESSÂO  em bloco e pretende abranger a totalidade de um instante sem fundo. A COMUNICAÇÃO necessita de narrativas lineares, unívocas, planas e mensuráveis.

Este distanciamento de MAGLIANI do PROSELITISMO também vale para ela no campo estético. Ela não se presta para levar um alfinete nas costas e ser espetada num quadro teórica de uma tendência estética ao gosto das intrigas e dos interesses externos à sua obra.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)    ACUMULAÇÕES  2001   in Renato ROSA 2013.
Fig. 16 –  Quando os objeto do quotidiano invadem a pintura de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI eles estão colocadas no mesmo plano e convidam o olhar a um percurso no qual não existe começo ou fim, mais ou menos importante,. O exercício plástico convida o seu expectador   ao que ela mesmo declarou “meu trabalho é muito aberto à interpretação de cada espectador e que cada um vai encontrar nele, ou acrescentar a ele as suas prioridades”..

21.11– A memória da obra e da pessoa
de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI..

Na sua passagem de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI pelo Instituto de Artes da UFRGS um dos professores foi Fernando Corona (1895-1979). Este professor se apropriou de uma frase de Winston Churchill ao elogiar o pilotos da RAF, na defesa de Londres, que serviu de mote para Corona afirmar (1977, p. 166) que:

nunca tantos deverão ficar ignorantes de tão poucos, pois a história na seara das Artes, ainda está para ser contada desde Araújo Porto-alegre e Pedro Weingärtner até os últimos talentos que despertam nas artes plásticas e na arquitetura”.   .


Maria Lídia dos Santos MAGLIANI constitui uma integrante deste pequeno grupo destas pioneiras a se fixar definitivamente no campo das artes visuais do Rio Grande do Sul. Mudança decidida ao transferir todos os  seus pertences, energias e tempo para este campo de energias criativas.

Se a carreira e as obras de MAGLIANI ainda são frutos da ERA INDUSTRIAL, de um lado, isto não nos autoriza a transformá-la em “mito”, em “estrela” ou “gênio” para o consumo dos produtos desta ERA da MÀQUINAS. De outro lado a sua memória e a sua obra correm o perigo do “descarte”, do “segundo enterro” e da “entropia” que a ÉPOCA PÓS-INDUSTRIAL reduz tudo e a todos ao mundo da NATUREZA  e do igual.
Maria Lídia Santos MAGLIANI, (1946-2012) Pequena História da Infância in Renato ROSA 2013
Fig. 17 –  A acesse de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI-  de não sorrir para a câmera fotográfica - inspirou uma das suas obras .  Seguindo o preceito de Wittgenstein de que “o que não deve ser dito deve ser calado” ela a transfere para a fala e expressão fisionômica de mesma e dos seus personagens..

Entre estes extremos cabe, às instituições, as pesquisadores e aos agentes culturais do no Rio Grande do Sul, a tarefa  de encontrar meios e recursos para descobrir, estudar, sistematizar índices da memória Maria Lídia dos Santos MAGLIANI. No tempo de impiedosos descartes, as obras e documentos necessitam migrar para as plataformas digitais e físicas que mantenham vivo, por tempo indeterminado, este bem material e simbólico único dos sul-rio-grandenses.

Deve-se à Renato Rosa não só o destaque que conferiu à MAGLIANI no seu Dicionário. Deve-se, a ele, também o magnifico gesto de colocar integralmente na rede mundial [ https://issuu.com/zebrowski/docs/cata_magliani ] o catálogo da exposição exclusiva desta artista que ele promoveu, em 2013,  na Pinacoteca Aldo Locatelli da Prefeitura de Porto Alegre.
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)   figura masculina a Renato ROSA 2013
Fig. 18 –  A supressão do rosto dos personagens de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI não só os priva da fala fisionômica, como aumenta o mistério que cerca estes personagens anônimos e sem face. Esta universalização sem etnia, destino e sem identidade conferem à obra da pintura toda a liberdade para praticar do que ela gosta de fato que é de desenhar, de pinar, de compor e se embriagar com as cores.

FONTES BIBLIOGRÁFICAS
CORONA, Fernando (1895-1979).. Caminhada nas Artes (1940-1979). Porto Alegre : UFRGS/ IEL/ DAC/ SEC 1977, 247

ROSA, Renato et  alii .MAGLIANI A solidão do corpo Porto Alegre : Pinacoteca Aldo Locatelli-Prefeitura de Porto Alegre   2013 , s/p. il col. https://issuu.com/zebrowski/docs/cata_magliani
ROSA, Renato et   PRESSER, Décio .Dicionário das Artes Plásticas no Rio Grande do Sul. (2ª ed r) Porto Alegre : UFRGS, 2000, 527 p. ISBN 85-7025-522-5
Maria Lídia dos Santos MAGLIANI (1946-2012)  ACUMULAÇÕES  2001   in Renato ROSA 2013.
Fig. 19 –  Os objetos da ERA INDUSTRIAL tomam conta da superfície plana das pinturas de Maria Lídia dos Santos MAGLIANI,. Nestas composições  plásticas o repertório  do seu expectador emerge e entra em sintonia com as pesquisas da artista  para alguns será importante a discussão da linguagem em si, para outros, a investigação da condição humana” ,

FONTES NUMÉRICAS DIGITAIS
EXPOSIÇÂO MAGLIANI – 2013 - Renato Rosa
http://www.lpm-blog.com.br/?p=21067

O LIVRO “Magjiani a solidão do corpo” 2013 PDF de RENATO ROSA

OMAR BARRROS FILHO
CRONOLOGOA de MAGLIANI
PARECER SEC-LIC
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