domingo, 5 de setembro de 2010

PORTO ALEGRE e a “HISTÓRIA em MIGALHAS” - 09.00


Foto Círio SIMON

Fig. 01 – Parque Marinha do Brasil.


Porto Alegre sempre foi um porto de chegadas, de aquerenciamentos e de partidas. Como tal constituiu-se em porta aberta para o mundo, para o interior do Rio Grande do Sul e, por que não, para os paises platinos.


Esta circulação de pessoas, de idéias e de mercadorias acelerou-se na passagem do século XX para o XXI. Circulação impulsionada pelo trabalho continuado, pelo aproveitamento das novas tecnologias sem abrir mão de sua identidade regional e local.


Foto Círio SIMON

Fig. 02 – Praça Itália – Porto Alegre - RS


A manutenção desta identidade regional e local necessita assegurar o seu lugar e o seu papel numa época em que as grandes nações hegemônicas, os discursos totalitários e as antigas corporações não fazem mais o seu sentido tradicional, pois foram corroídos pela entropia e obsolescência nas quais foram concebidos e dos quais são vitimas, agora, como o do “fim da História[1].



Foto Círio SIMON

Fig. 03 – Rotina de um domingo de tarde qualquer.


A afirmação de uma civilização humana positiva enfrenta, no contraditório das potencias grandes esperanças, a barbaria que se renova e usa as tecnologias mais avançadas. Afirmação pronunciada e renovada que necessita enfrentar o terrorismo que faz se impacientar, e tomar medidas extremas, as nações que pareciam serem os motores desta civilização.


Diante destes caminhos abertos para humanidade, há necessidade de pé no chão na medida que uma narrativa se aproxima do presente e se aproxima daquilo que será o futuro. Diante da pergunta – Para onde vamos?” há necessidade de frear a nossa ânsia e as nossas urgências que o hábito da circulação apressada imposta pela nossa civilização. Sem este freio acaba-se impondo um final incongruente que bloqueia e nos aliena das respostas das duas primeiras perguntas “de donde viemos?..”o que somos?..” do pintor Paul Gauguin (1849-1903)..


FAJARDO Carlos “Escultura com Tijolos” 1997 . Ao centro: CARRASCO – “Cone Sur” 1997. CASTRO, Amílcar “Escultura em Aço” - 1997 [1] Foto SIMON

Fig. 04 – Esculturas no Parque Marinha do Brasil


A incógnita do futuro fascina a todos. Esta incógnita nos empurra a todos para frente do nosso tempo. Todos queremos adivinhar e ajudar a interpretá-la. O desconhecido nos estressa e queremos orientar a nós e aos outros. No entanto quando este futuro nos toca, ou nos atropela, nada tem a ver com as nossas “profecias”. .O futuro apenas cumpriu com a sua mágica de nos alienar do nosso próprio presente e conseguiu apagou de nossa memória - “de donde viemos?..”




[1] - ALVES, José Francisco – A Escultura Publica de Porto Alegre: história, contexto e significado. Porto Alegre : Artfolio, 2004, 262 p. Il.


Foto Círio SIMON

Fig. 05 – Parque Marinha do Brasil


Na questão do “- onde viemos” Marc Bloch respondeu a pergunta que ele mesmo formulou poucos dias antes de ser fuzilado num campo de concentração nazista:

- Pai, para que ser a História?


Respondeu num manifesto onde ele esteve 100% comprometido incluindo o sacrifício da sua própria existência. No pior momento da República de Vichi ele escreveu numa folha de lixo:.

É tal a força da solidariedade das épocas que os laços da inteligibilidade entre elas se tecem verdadeiramente nos dois sentidos. A incompreensão do presente nasce fatalmente da ignorância do passado. Mas talvez não seja mais útil esforçar-nos por compreender o passado se nada sabemos do presente . Marc Bloch 1976, p.42.[1].

Folha de lixo que Lebvre, o seu colega dos Annales recolheu e depois publicou


No olhar retrospectivo do passado para alguns a década de 1980 é a Pré História e aquilo que veio antes, constitui o mais profundo mistério.

Paciência..Vamos continuar a perguntar ao estilo de Gauguin e Bloch mesmo que seja pela vida da “história em migalhas [2]..



[1] BLOCH, Marc (1886-1944) . Introdução à História.[3ª ed] Conclusão de Lucian FEBVRE - .Lisboa :Europa- América 1976 179 p.

[2] DOSSE, François – História em migalhas: dos Annales à nova Historia. Baurus-SP : EDUSC, 2003, 394 p. ISBN: 8574601578

Foto Círio SIMON

Fig. 06 – Passageira.


O que nos é dado ver - ou - a vida humana editada.

A percepção humana foi condicionada pelo espetáculo tecnológico. O milionésimo do segundo do gol, - quase imperceptível para os sentidos humanos - é apropriado pela tecnologia. O continuum do milionésimo do segundo do gol ´é apropriado e estendido no tempo e imposto como o verdadeiro gol.

Leonardo da Vinci já havia previsto o fenômeno quando escreveu “tudo que é continuum pode ser dividido em infinitas partes” e o aplicou aos espetáculos e as máquinas por ele produzidas. Concepção que pode ser aplicada à compreensão e ao acesso a energia nuclear, aos bites da informática ou ao alinhado e ao sequenciamento do código genético na sua formação, sua mutação e na sua manutenção no tempo.


Foto Círio SIMON

Fig. 07 – Torres face ao Parque Marinha do Brasil


Portanto aquilo que nos é dado ver é, na maioria das vezes, uma imposição subliminar no qual se interpõem interesses (inter- esse). A mediação tornou-se constante e necessária, inclusive na arte. As distâncias encurtadas, a velocidade das informações, o acúmulo e a complexidade dos repertórios oferecidos, impõe cada vez mais a “a atualização da inteligência”. Contudo esta “atualização” não pode substituir a o direito permanente á “pesquisa estética” e a autonomia do receptor. Este observador potencial, na maioria das vezes, defende-se da enxurrada de informações e, se não, prefere o silêncio, fixa-se em repertórios que lhe são familiares e tradicionais. A aprendizagem impõe mudanças nestes repertórios. Mudanças que são acompanhadas de sofrimentos. Sofrimentos desaconselhados pelas vulgares “auto-ajudas”. A indústria cultural detectou, há muito tempo, esta necessidade e multiplica as ofertas dos seus produtos tópicos para suprir esta necessidade.. Pratica-se o retorno ao ventre materno em nome de uma segurança pontual, o que fato é uma violação e um triplo crime. Crime contra si mesmo pela escravidão voluntária implícita, Crime contra a vítima pelo ato da violação. Crime contra uma civilização pela barbárie pela carência, ou fuga, de um contrato social.


Gráfico Círio SIMON

Fig. 08 – Algumas circunstâncias das Artes entre 1945 e 2010.

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Numa civilização o artista sempre ganhou e manteve sentido, na medida que a sociedade ou o estado nacional necessitam dos valores e das obras que ele representa e produz. Se ele ganha a atenção sincera e de seus observadores, e mantém reconhecimento e projeção significa que neste tempo e lugar a sua pessoa e a sua obra possuem coerência que esta sociedade, civilização e Estado buscam.


Em Porto Alegre, ao tentar separar o que indústria cultural busca adivinhar, gerar e administrar destas necessidades, daquilo que existe de coerente destaca a geração e a circulação de toda uma consciência coletiva voltada para as artes visuais. Com certeza nesta busca ajuda a debilidades e as entropias de outros valores e crenças conforme Marcel Duchamp[1]..


O artista é hoje em dia um estranho reservatório de valores para-espirituais em oposição absoluta com o FUNCIONALISMO diário, pelo qual a Ciência recebe uma admiração cega. Digo cego, porque não creio mais na importância suprema destas soluções científicas que não atingem mais os problemas pessoais do ser humano”.


Percebendo esta necessidade e carência, os museus de arte se profissionalizam e multiplicam, em Porto Alegre, os arquivos ganham sentido, o mercado de arte busca os seus nichos e uma salutar concorrência, o ensino das artes atrai pessoas para praticar e entender os valores da arte e os meios de comunicação, a crônica e a crítica encontram sentido nas forças que animam as artes.


Evidente que o lado sombrio e as ameaças cada vez mais concretas da barbárie e as próprias forças da natureza agredidas e mal utilizada pela criatura humana encontra nas artes um caminho de superação e afirmação do que de mais elevado e transcendente a criatura humana pode exibir e legar para a próxima geração.





[1] Marcel Duchamp, num colóquio organizado em Hofstra em 13 de maio de 1960. Consta em

SANOULLET, Michel. DUCHAMP DU SIGNE réunis et présentés par.. Paris Flammarrion, 1991, pp. 236-239


LIMBERGER, Fernando, 1992. Foto Círio SIMON

Fig. 09 – Parque Marinha do Brasil.


Saído destes constrangimentos e tentando afirmar estes valores da arte socialmente aceita, Porto Alegre pode exibir instituições de arte, produtores e um público competente para manter circulando criticamente. Ainda que toda a comparação - interna e/ou externa - seja odiosa, cabem destaques dos quais há necessidade de se aproximara e dar-lhes mais atenção.


É o que este blog irá fazer a seguir em relação à movimentos, instituições, artistas e obras de arte.


Quanto aos movimentos e a busca de uma consciência coletiva mundial merecem destaques a hospedagem das primeiras edições do Fórum Mundial e a manutenção periodicidade da Bienal do Mercosul. O Museu Iberê Camargo certamente foi uma obra que veio reforçara a busca de uma consciência coletiva local e os seus vínculos internacionais. A preservação da obra e do legado de Iberê Camargo também é um índice do que ainda necessita ser realizado em relação a outros artistas. A migração das obras de arte ganha gradativamente um porto seguro em diversas instituições. Assim se profissionaliza o MARGS a Pinacoteca Barão de santo Ângelo e o Centro Cultural CEEE.


Todos estes esforços das buscas de uma macro solução única podem serem percebidos e interpretados como frustrantes e resultarem numa visão cansada do que lhe é oferecido. Mas também salta aos olhos de que estes esforços operarem longe de um paradigma hegemônico, de uma tipologia estética legível á primeira vista. Com mais atenção e mais inteligência é possível perceber também que, estes esforços, não só são diferentes e as vezes contraditórios, mas que permitem decisões de pessoas mais esclarecidas e coerentes com a cidadania. Cidadania que se traduz em mais responsabilidade onde o manifesto do indivíduo vem acompanhado com o seu compromisso 100% coerente com todas as suas decisões, ações e com os resultados de uma civilização.


A História em Migalhas também abre o espaço para a História da Dúvida[1] e com a dúvida estamos no oceano pelágico apontado por Sócrates “– Só sei que nada sei”. Para a Arte este oceano das dúvidas é o meio para o novo, para o criativo e para o desafiador. A seguir este blog irá visitar, acompanhado pelo poeta Antônio Machado, alguns destes roteiros percorridos por estes oceanos onde “os caminhos se fizem ao navegar”.





[1] Em relação a DÚVIDA na História ver obra de http://ricoeur.iaf.ac.at/FR/index.htm

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