quarta-feira, 11 de novembro de 2009

VESTIDO CURTO ...

JUIZOS CURTOS e FULMINANTES.

O evento da jovem estudante acuada e humilhada numa universidade de São Paulo[1] é um índice de uma doença. Pandemia que eclode, se dissemina e mata mais do que as mortes provocadas pela gripe suína e espanhola somadas. Basta um grito irresponsável e anônimo para deflagrar mais um surto desta pandemia na hora e nos lugares mais inesperados.

O Brasil não está livre desta doença devido a sua baixa cultura e efeitos da heteronomia da vontade e da inteligência endêmicos e residuais da longa escravidão. Escravidão que perverteu as lideranças, afrouxou as rédeas morais da vitimas diretas e, nos demais, encurtou a inteligência, endureceu corações e a vontade de usar as suas próprias mãos para o trabalho.

Quanto mais curta uma mentalidade, tanto mais instantâneos, definitivos e imprescritíveis são os seus juízos, com consequências.profundas e irremediáveis.

Se não é possível dar crédito que “a inteligência humana é um bem constante no planeta: só aumenta a população”, de outra parte o número de pessoas exige cada vez mais um pensamento linear e único e que, de preferência, caiba no seu repertório curto. A mass-media trabalha com uma idade mental humana universal nivelada intencionalmente aos 12 anos.

As instituições, que deveriam cultivar a elevação da inteligência, a vontade e estabilizar os direitos da cidadania, são invadidas por uma maré humana que as afundam para mais baixo do que os 12 anos de idade mental. A política aplaude, aproveita esta necessidade para se manter no poder e instalar o populismo das frases feitas e repetidas como mantras religiosas.

Se a sanção moral da vontade corresponde ao exercício da sua autonomia [Kant], esta autonomia torna-se impossível na política populista. Certamente a heteronomia da vontade corresponde também à heteronomia da inteligência e anula o direito do exercício da liberdade de pensar e propor e exercer o contraditório.

As vítimas são aqueles que buscam sair do rebanho

O fim de todo o rebanho é o matadouro. Basta um grito anônimo e irresponsável para iniciar o abate do rebanho humano. Grito que incentiva mais uma carnificina física ou moral e emitido na hora inesperada. Negar os matadouros humanos ocorridos e instalados silenciosamente ao longo dos séculos XX e XXI, constitui também falta de inteligência e irresponsabilidade moral.

As vítimas preferenciais são aqueles que descobrem, e aqueles que denunciam, esta lógica perversa e buscam sair do rebanho enquanto a hora do abate fatal não soar. Evidente que a humanidade, com os recursos que possuía, deveria estar longe da mentalidade dos “quatro cavaleiros do apocalipse”. Mas “os monstros do sono da razão”, os atualizou. Este sono da razão é uma ameaça constante e cada vez mais presente. Cada vez mais a humanidade tende a mergulhar nestes períodos de dormência de sua razão.

Esta dormência intensificada e acelerada por doutrinas ao estilo daqueles Dr. Joseph Goebbels (1897-1945) e tantos outros líderes que conseguiram formular e divulgar na cultura industrial. Daí para a propaganda e marketing é só um passo. O rebanho está inerte esperando ordens.

A democracia necessita de uma vigilância permanente[2]. Esta vigilância inicia na formação e na legitimação de líderes. Líderes que conheçam, tenham vontade e meios para implementar a mentalidade sadia e do melhor do que a criatura humana é capaz.

O caminho entre o conhecimento e o dinamismo social foi iluminado pelo intelectual brasileiro Florestan Fernandes ao escrever[3] que:

não são os objetivos, idéias visadas, nem os modelos institucionais escolhidos, os obstáculos mais sérios. O retentor está no próprio cerne das atitudes e disposições humanas: a inovação encarada em si mesma, como ‘uma conquista pública’ como um ‘símbolo civilizatório’ e como um ‘valor supremo’

(Fernandes, 1966, p. 77).

A inovação é o melhor do qual possa se orgulhar como valor perene e universal. Os meios para esta inovação - perene e universal - são conferidos pelas instituições saudáveis. Instituições que constituem as maiores maravilhas e as mais altas de uma civilização. A criação das instituições, a sua manutenção sadia - por tempo indeterminado - e de abrangência máxima possível, são obras de indivíduos e de sociedades capazes de diagnosticar em tempo hábil e encontrar os remédios mais salutares e eficazes para denunciar os matadouros e barrar as pestes endêmicas que flagelam o poder originário de uma nação frágil como a brasileira.

No caso da moça de São Paulo o primeiro passo da inteligência é não transformá-la de vítima em heroína. O jogo entre os sentimentos contrários e desestabilizadores “da culpa e do perdão” é um velho instrumento, conhecido e de uso recorrente dos populismos de todos os matizes. Populismo desestabilizador que ataca os efeitos e não a causa do perigo silencioso que poderá eclodir em qualquer lugar, hora e se abater sobre as mais indefesas e inocentes criaturas humanas.




[2] - Veja a explicação da figura acima em textos acadêmicos no site http://www.ciriosimon.pro.br/aca/aca.html e acompanhe as dificuldades no desenvolvimento da prática democrática numa escola formal estadual.

[3] FERNANDES, Florestan (1920 – 1995). Educação e Sociedade no Brasil. São Paulo : Dominus, 1966. 614p.

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