domingo, 5 de fevereiro de 2012

ISTO é ARTE - 020


O ESTADO e o SIGNIFICADO de um  
PROJETO
CIVILIZATÓRIO COMPENSADOR. 


Fig. 01 – O Fórum Social Mundial em Porto Alegre busca  o projeto de um outro “MUNDO POSSÍVEL” e alternativo daquele apresentado e defendido, na mesma época do ano, numa cidade da Suíça. Este FORUM SOCIAL busca ver e evitar qualquer patrulhamento estético, ideológico e até financeiro externo.  Coerente com a posição ele esta longe das grandes utopias, dos discursos e hegemônicos e do “alfinete nas costas” do classificador do ser humano.O campo artístico que o acompanha o máximo perceptível são tendências que embasam os projetos do artista e que assim torna-se também histórico. O criador de arte, após a conquista da sua autonomia externa, volta-se agora para a autonomia do seu próprio campo de ação. Ele  busca a produção de obras sem abdicar do seu pertencimento a este mundo social e cultural, sem ostentar onipotência, onisciência e de eternidade.

A criação e a manutenção do Estado sempre dependeram de concepções, de projetos e de práticas humanas motivadas por interesses específicos. O Estado é estritamente humano. É humano apesar de as concepções da origem de seu poder invoquem a origem divina.  É humano nas diversas práticas de seu poder deduzidas, sustentadas e reproduzidas na busca da sua legitimidade.
Neste blog não se participa da tendência de perceber esta criação como natural, única e imutável. No lado oposto busca-se escapar de qualquer alinhamento de um nacionalismo determinante, único e absoluto.

Fig. 02 – Após a Revolução de 1789 é recorrente a representação do poder da  França  por uma frágil figura feminina, sustentada por um densa base popular. Esta imagem reaparece especialmente nos momentos de perigo, como neste cartaz motivador, divulgado em 1917, no auge da Primeira Guerra Mundial. Tenta conferir corpo visual  a esta concepção da origem, da circulação e da reprodução deste poder humano num momento perturbador quando milhões de patriotas davam a sua vida, nos campos de batalha, na defesa da base deste poder.  
 O ESTADO, na sua concepção corrente, é relativamente recente.  A apropriação, o desenvolvimento e a reprodução do conceito fundador do Estado desenvolveram-se nas circunstâncias da era industrial. Deve-se aos preceitos iluministas a fundamentação e a forma da passagem destes conceitos da era agrícola para a prática corrente determinado pelas circunstâncias que lhe sucederam imediatamente. Deve-se aos preceitos iluministas a divisão do PODER do ESTADO nas três esferas do Legislativo, Executivo e o Judiciário. O Estado uno, com três poderes autônomos e complementares, possibilitou a constituição de processos impessoais e a sua implementação, sua manutenção e a sua reprodução que se julgava por tempo indeterminado. Com o período pós-industrial estes conceitos e práticas entraram novamente em crise e busca novas concepções e práticas coerentes com as novas circunstâncias.

Fig. 03 – O  cidadão e a criatura humana são o cerne e teleologia imanente do Estado na concepção iluminista. Esta criatura humana constitui contratualmente o Estado ao qual delega as suas forças e as suas possibilidades do exercício de sua vingança pessoal. Esta delegação contratual constitui uma força única, para a utilidade pública e da quais todos fazem parte. O Estado torna-se aversivo e um grande Leviatã visto deste ângulo. Neste ponto entra a implementação prática do projeto civilizatório compensador. A Arte é a substância deste projeto compensador de sua violência. Este projeto compensa a aversão, o medo e o terror.

O preço a pagar pela criação, a manutenção e a reprodução deste Leviatã, sem alma e sentimentos, gerou os mais diversos contratos entre o cidadão avulso e pessoal e esta criação coletiva e impessoal. Não é possível o funcionamento deste Estado pelo puro terror e sem contratos com quem o sustenta. No pólo oposto, a destruição do Estado remete ao puro caos social e ao reino do mais astuto e do mais forte. 

Fig. 04 – Esta imagem e Aldo Locatelli (1915-1962), no Palácio Piratini representa a motivação para  uma série de contratos coletivos.  O artista cria uma imagem da complementaridade entre a Tradição Rural do Rio Grande do Sul e  a Modernidade da Era Industrial.   O artista destaca, em plena sede do Poder Estadual, a complementaridade entre o estancieiro e o operário urbano, como a origem histórica deste Estado e colocado face às novas circunstâncias vigentes quando este quadro foi pintado ao meio do século XX.
Diante deste puro caos social e o reino do mais astuto e forte, o cidadão avulso renuncia à pratica individual da violência e contrata com Estado este exercício da vingança individual. Evidente trata-se de um contrato com um Estado pós-iluminista.

 Fig. 05 –  Imannuel KANT 1724-1804 foi o  homem da passagem entre a cultura da transcendência divina do poder característica do  “Ancien-Regime”  e os efeitos e forças aglutinadas ao redor da Razão e projetadas pela Revolução Francesa entre outras. As suas diversas CRÌTICAS À RAZÃO limparam a área filosófica de projeções metafísicas incoerentes com a liberdade e a autonomia da vontade, de sentimentos e de ações. As suas concepções evidenciaram os pólos das  competências da plena liberdade humana e o pólo dos limites das responsabilidades civis e civilizatórias. 

 Este contrato, levado ao pé da letra, confere ao ente estatal o papel do Leviatã aterrador. O conjunto do exercício prático deste terror, causa amedrontamento e o exercício desta delegação legítima do Estado por levar o seu governo a transformar o aparelho estatal em exercício continuados de forças aversivas. No limite, ao próprio Estado do Terror.
Os confrontos e as lutas pelo poder estão configurados e tendem a crescer até níveis intoleráveis quando o Estado insiste e investe apenas no projeto orientado pela Ciência e pela Tecnologia. O mais forte, ágil e competente, nesta Tecnologia e Ciência, jogará para a a sua heteronomia  o lado mais fraco, lerdo e menos aparelhado . Este estado de heteronomia constitui a raiz de conflitos, que em 2012, estão em pleno curso no âmbito virtual como da internet e nas comunicações globais. Eles tendem a se tornar abertos e explosivos na forma de guerras declaradas e implacáveis de extermínio cultural e físico.
Para não atingir este ponto insuportável, há necessidade que este Estado receba e adote um sistema de projetos e ações civilizatórias compensadores desta violência potencial e incontrolável.

Fig. 06 – O jovem  Faraó Tutankamon  exibe o  flagelo e o cajado como os signos do seu duplo poder
Os Faraós egípcios, com o seu cajado e açoite conduziram o seu Estado através das mais difíceis condições. Cajado para apontar o rumo para a humanidade escapar da barbárie. O açoite para espantar os chacais sempre prontos para o exercício e práticas do poder do dente-pelo-dente no âmbito das puras leis darwinianas das espécies primitivas.

Fig. 07 – O domínio da razão na construção das bases teóricas práticas do  Estado contemporâneo incipiente tiveram contribuições importantes mesmo da parte daqueles nascidos educados e mantidos por regimes que acreditavam na sua origem e suporte divino. Apesar de usar a forma humana da ironia, da paródia e mesmo do cinismo praticaram ao extremo o hábito da integridade intelectual com é o caso do filósofo Voltaire (François Marie Aruet (1694-1778) que jogou com a sua  imagem e a sua  confortável base social, econômica e política da burguesia de sua época e instrumentalizou para dar forma humana a um outro poder do Estado Francês da época. Integridade intelectual exercida na medida em que ele sabia que as suas idéias trariam poucos resultados práticos para o estamento dominante e que perderia o influência na nova base do Estado que estava prevendo e defendendo.

Os projetos e ações civilizatórias compensadores da violência podem ter uma dupla leitura. Numa o Estado incentiva o indivíduo a canalizar as suas forças negativas em direção da sublimação. Mas no outro extremo o próprio Estado sublima a si mesmo, educa-se e da um exemplo prático de que é possível transformar a contradição do exercício eficiente, rápido e justo da violência e torná-la complementar com uma civilização. Este exemplo possui um preço e que os grandes estadistas sempre entenderam e aplicaram na prática da administração dos bens públicos e devolvendo-os a todos indistintamente e que continuam gerara, não só a admiração pública e universal. Numa época de capitalismo rendem divisas das quais os atuais herdeiros ainda vivem.

Fig. 08 – A complementaridade entre Péricles agente do  Estado de Atenas e Fídias o criador do Parthenon e da estátua da deusa  Atenas Partenos  sempre foi visto com um momento privilegiado da Arte, da Cultura e da Civilização Ocidental. O político capaz de conduzir uma democracia, submetendo-se às suas leis e ao mesmo tempo é capaz de perceber as energias do campo das artes. Fídias foi competente para compreender este momento e aproveitar as energias políticas dos seus concidadãos para plasmar arquitetura e escultura na qual todos se sentissem contemplados, estimulados

 Porém nenhum Estado e os seus dirigentes são obrigados a este projeto civilizatório compensador. Contudo um projeto civilizatório compensador revela a natureza, a permanência e a reprodução através do seu projeto que o tornam histórico como um ENTE que se revela no seu SER. Os Estados que souberam colocar no centro de seu projeto também um projeto civilizatório compensador tornaram-se históricos. Que o digam os projetos e a realização das pirâmides, do Parthenon em Atenas, a Catedral de São Pedro ou os palácios do Versalhes ou São Petersburgo custaram esforços e concentrações de pessoas, materiais e fortunas. Estes projetos não só educaram o povo na época de sua criação.  Eles atraem, até o presente, multidões para os sítios onde estão estas obras. Multidões que deixam fortunas que pagam, mesmo monetariamente,  todos os investimentos, trabalhos e conservação realizados nestes projetos civilizatórios compensadores.
Nesta concepção educa-se o Estado e de forma particular os seus agentes. Péricles e Fídias trabalhando sob os olhares da deusa da Sabedoria. Sabedoria que evita projetos civilizatórios compensadores corrompidos pela mera estetização e a falta absoluta de coerência entre a vida e a arte. Certamente a corrupção do ótimo, é péssima. Assim Estados totalitários produziram horrores monumentais quando apostaram apenas na estetização formal e externa e a usaram como propaganda do seu regime discricionário e oco. 

CATTELAN Maurizio  -Rotunda GUGGENHEIM  NYT 08.11.2011
Fig. 08 –  Nesta imagem de obra da arte   de CATELAN existe coerência no contraste entre a  Mandala e o Caos. O círculo vazio e impessoal pode ilustrar como do Estado ordenar o espaço para abrigar, contrastar e complementar formas e energias do caos que não seria percebidas assim,  sem a construção lógica humana do círculo vazio e impessoal.

Nestes regimes discricionários e ocos quando alguém toma o poder o seu trabalho consiste em afastar, desqualificar e eliminar quem se aproxime deste poder que julga seu e do grupo humano que legitima. O seu fazer passa ser porta-voz e interprete único em nome desta facção social. Neste momento a Arte tomba na pior servidão. Mesmo que ela receba todas as condições e meios para trabalhar ela apenas dará corpo às deliberações e decisões discricionárias e ocas.
A ação do artista autônomo consiste preliminarmente perceber a criação do Estado como algo natural, mutável e de múltiplas faces e paradigmas. No lado oposto este artista busca escapar de qualquer alinhamento de um nacionalismo que se julga necessário, determinante único e absoluto na História humana.
O artista não pode embarcar em meias verdades. Por maior que seja a sua sensibilidade, sua vontade e o seu direito, ele não soluciona a contradição que não é da sua competência e nem  atinge a sua complementaridade, nestas meias verdades. A posse e a prática continuada de um projeto, coerente com a sua origem humana, é da competência do Estado na medida em que o seu poder originário o constitui e contrata para esta função. No âmbito deste projeto demonstra e age. De um lado ele não abdica da segurança para todos. Na complementação ele não tolhe a liberdade da criação. Ao contrário, o Estado provê condições apropriadas para o florescimento e a reprodução de um projeto civilizatório compensador da violência. Violência que este Estado exerce apenas na medida do contrato lhe delega, recebe e acolhe em nome daqueles que constituem o seu poder originário.
Ninguém deve esperar resultados imediatos e fulminantes, especialmente no Brasil. O longo período da cultura colonial, a escravidão cultivada e o legalismo, por cima e por fora, necessitam serem vencidos e no seu lugar brotar saudável a liberdade, a vontade e o direito de celebrar contratos coerentes com a cidadania.
                          FONTES
ESPINOZA, Benedictus.Tratado político. São Paulo: Abril Cultural (Os pensadores),        1983

MARQUES dos SANTOS, Afonso Carlos «A Academia Imperial de Belas Artes e o projeto   Civilizatório do Império»  in  180 anos de Escola de Belas Artes.
Anais do Seminário EBA 180. Rio de Janeiro : UFRJ, 1997, pp. 127/146.


A presente postagem possui objetivos puramente didáticos
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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

ISTO é ARTE - 019


A GRAVURA em PORTO ALEGRE.
O universo da História não é o passado ou o presente, mas a temporalidade que compreende um e outroIglesias
O historiador mineiro Francisco Iglesias (1923-1999) indica que pertencemos irremediavelmente a um processo histórico.  Se no presente dominarmos intelectualmente as causas, as forças e os  objetivos desta temporalidade, podemos nos apropriar do sentido do passado. Munidos deste sentido coerente, é possível gerar narrativas, no presente, e modificar coerentemente aqueles discursos que se naturalizaram, caducaram ou estão colocados no caminho da entropia universal.

O autor da presente postagem alinha-se com este processo histórico com o objetivo de estudar a GRAVURA praticada em Porto Alegre. Estudo que busca contextualizar a concepção ampla da temporalidade que a materialidade da GRAVURA. Concepção deflagrada ao longo dos processos das suas diversas práticas e das reflexões que a temporalidade da gravura provoca ao ser aproximada das forças da ARTE.
Foto Círio SIMON 2001
Fig. 01 – Gravura em Porto Alegre – Exposição de gravura do Atelier Livre de Porto Alegre na Pinacoteca Aldo Locatelli em  dezembro de 2911

A GRAVURA, na sua concepção ampla, é muito comum e frequenta com uma assiduidade espantosa nossos domicílios, bolsos e bolsas. A gravura foi incorporada tão completamente aos nossos hábitos da era industrial que ela se naturalizou, tornou-se rotineira e sem nossa atenção e espanto. Poucos se dão conta que ela circula na forma das cédulas de dinheiro, desde a mais remota era industrial. Só o cartão magnético e as senhas estão conseguindo alterar estas circunstancias com a era numérica digital.
Fig. 02 – Processador 4004 da INTEL  do ano de  1971.
Contudo se afundarmos a nossa atenção surgirá o espanto diante do CHIP. Este é uma da micro-gravura traçada com conexões de fios infinitamente pequenos de ouro e que conduzem milhões de informações por estes micro-caminhos.
Fonte:  ARQUIVO GERAL do Instituto de Artes da UFRGS
Fig. 03 – Gravura em Porto Alegre – Este desenho de Giuseppe GAUDENZI é quase autobiográfico e revela o ambiente ideal do processo ensino-aprendizagem de que ele portador e que buscava reproduzir em Porto Alegre. Nesta imagem de 1913,  é possível verificar as diversas fases da elaboração da gravura e da sua reprodução. Ao mesmo tempo mostra o processo de seu ensino implementado por este mestre italiano e a aprendizagem que repassava pela prática aos seus estudantes. Ao mesmo tempo esta imagem enfatiza o papel do desenho - e reprodução pela gravura - na aprendizagem de outros ofícios cultivados na casa nesta época.

Mas quando algo perde a função segue para os museus como obra de arte. A gravura utilitária segue a norma da relação entre a função e forma enunciada por Herbert Read.
Com esta postagem não se deseja desconhecer nem superar a obra clássica “A Gravura no Rio Grande do Sul 1900-1980” de Carlos Scarinci. Os seu autor nos alerta de que
“Sob o manto da discussão da validade das inovações técnicas ou do despreparo dos artistas de vanguarda se esconde quase sempre ou ignorância ou vontade prepotente de legislar em campo alheio e a favor de posições conservadoras, pretendendo ainda a posse exclusiva da honestidade profissional” (Scarnci, 1982 p. 18 nota 6)
O filósofo e esteta Scarinci exerce o papel de apresentar e elucidar o contraditório ao mundo intuitivo e daquilo que está sendo naturalizado. Sem o espanto não há filosofia, como não existe Direito sem a competência da indignação. Espanto que o filósofo exerce diante da pouca profundidade e seriedade com que é estudada, entendida e socializada a GRAVURA em PORTO ALEGRE como ARTE. Campo de forças que exigem conhecimento, memória e circulação consciente nos exercícios continuados. Exercícios conduzidos com a ética coerente com o seu sentido e o seu valor. Indignação do esteta diante da flagrante despeito desta ética quando se alguém se "adona" do campo de forças da Gravura ao se apropriar do trabalho alheio. Rapto que não acrescenta nada de positivo e, ao contrário, reconduz a GRAVURA, ao mundo da Natureza e da entropia e que deveria ser uma manifestação de ARTE.
Foto Círio SIMON 1967
Fig. 04 – Gravura em Porto Alegre Danúbio GONÇALVES no seu ATELIER de LITOGRAFIA contempla  uma  obra produzida ali por Tadeusz LAPINSKI em 1967
Porto Alegre está cercada de experiências e manifestações gráficas. Manifestações cujas raízes mergulham nas Missões jesuíticas. mantiveram-se vivas na cultura paraguaia [http://www.ticioescobar.com/], que usou a xilogravura como arma na Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870 ]. Mais próximas, no tempo e no espaço, as contribuições do jornalista e nobre Tito Lívio Zambeccari (1802-1862), na imprensa farroupilha, não pode-se deixar de mencionar.
Mas nos primórdios da era industrial é que surgiram tipografias, gráficas e profissionais na área da gravura e da fotografia. A GRAVURA em PORTO ALEGRE deveria vencer e permanecer como prática continuada. Contudo, esta permanência, teve problemas no plano individual como no institucional.  O europeu luso, ao largo de quatro séculos, desembarcava a contragosto ao Brasil. Ele vinha “fazer a América”, contrariado e premido por necessidades básicas e elementares. Nesta sua contrariedade, buscava retomar a transumância humana e retornar para o seu redil de origem, sem deixar nada de cultural e significativo do lado cá do Atlântico. Esta prática e mentalidade foram herdadas pelo imigrante avulso e aventureiro, de outras nacionalidades. As empresas que crivam eram por tempo determinado e para serem liquidadas com o objetivo de juntar capital a ser reinvestido na Europa. A cultura nas grandes fazendas reduzia a gravura ás marcas de ferro em brasa e numa pirogravura elementar. De criativo os desenhos dos ferros e que era obra do ferreiro improvisado da vila.
 Na gravura o corpo físico do papel recebe a tinta a partir do calco dos mais variados materiais ferido modificado pela mentalidade com os mais variados. Inclusive Porto Alegre abrigou um dos mais notórios falsários mundiais de notas de dinheiro. Contudo ninguém aprendeu nada desta arte evidentemente degenerada, sob o ponto de vista da ética,  nem deseja continuar esta habilidade criminosa.
Fig. 05 – Gravura em Porto Alegre – Matriz de gesso e cópia em papel obra de Clóvis PERETTI 1935-1995

A GRAVURA no Brasil elevou-se a um nível mais alto sob o impulso estético e técnico da Missão Artística Francesa. Neste projeto, presidido por Joaquim LEBRETON (1760-1819), o Secretário Perpétuo do Instituto da France decaído, é necessária desvendar a equipe de profissionais técnicos que se agregaram aos pintores, escultores e arquitetos com passagem inclusive pela prestigiosa  Academia da Vila Médicis de Roma. A mentalidade do jovem Araújo Porto-Alegre (1809-1879) bebeu diretamente desta fonte. A sua obra madura foi um dos frutos que ele disseminou em impressos e nas primeiras caricaturas brasileiras.
A vertente utilitária desta Missão Francesa, de 1816, dedicou-se a constituir na Casa da Moeda do Brasil e a gravar medalhas e cunhos de moedas.
Fig. 06 – Gravura em Porto Alegre – Cédula de dinheiro que circulou oficialmente ao longo e em conseqüência da Revolução de 1930. . Acervo do Diário de Francis Pelichek que se conserva no Arquivo Geral do Instituto de Artes da UFRGS
Em Porto Alegre este recurso técnico, altamente especializado e crítico, foi utilizado oficialmente pelo Estado tanto no âmbito da Revolução de 1930 como na Legalidade nas famosas “brizoletas”
Fig. 07 – Gravura em Porto Alegre Lista de nomes de artistas  que deixaram no acervo  do Atelier Livre de Porto Alegre, cópia de alguma de suas gravuras
Clique sobre a figura para ler os nomes.
Em Porto Alegre se apuraram e atualizaram as técnicas em diversos pontos e intenções. A firma de irmãos Weingärtner procurava responder a qualificação visual dos produtos industriais e as eventuais encomendas de eventos culturais. A firma foi participante ativa de uma série de feiras industriais promovidas em Porto alegre no final do século XIX e início do século XX até a eclosão da I Guerra Mundial.
Neste ponto o Instituto Técnico (Escola Parobé) da Escola de Engenharia de Porto Alegre contratou em 1909 o mestre gráfico, escultor e técnico Giuseppe GAUDENZI, vindo da Itália por indicação de Pedro Weingärtner. De seu ensino e pratica saíram os mestres de João FAHRION (1898-1970) e de João Faria VIANNA (1905-1975)
Após a Iª Guerra Mundial  a Editora Globo tomou cada vez mais a liderança gráfica e editorial entre as demais como a Tipografia do Centro, a Selbach e, em São Leopoldo,  a obra de Wilhelm Rotermund (1843-1925). Os aprendizes destas oficinas iam se estabelecendo em iniciativas próprias e concorrentes de menor expressão. Isto sem falar dos jornais diários, das revistas ilustradas e dos almanaques produzidos em oficinas e atelier gráficos próprios, equipados com recursos para esta produção.
Fonte NOGUEIRA  2005.
Fig. 08 – Gravura em Porto Alegre obra da oficina de Litografia mantida por Ignácio Weingärtner (1845-1908)

 O mundo da gravura em Porto Alegre oscila entre o EVENTO e CONTINUUM. Pipocam exposições, artigos livros ao redor de obras que se pretendem ser arte. Contudo muitas destas iniciativas pertencem ao MUNDO do TRABALHO e cujo destino a obsolescência e o lixo.
Esta obsolescência cumpriu-se, de certa forma, com a Litografia WEINGÄRTNER dos irmãos Inácio (1845-1908), (Miguel (1869-1928) e Pedro (1853-1929). Apenas a OBRA de Pedro, o menos ligado a esta empresa, conheceu a fortuna da permanência no tempo e na memória cultural. Este continuum da sua memória e da sua OBRA, resultou do AGIR do artista. Nesta AGIR  se valorizaram e circulam ainda. Enquanto os produtos do TRABALHO e do FAZER de Ignácio e de Miguel resultaram de EVENTOS e com eles pereceram no tempo já seguiram o caminho da entropia. Os TRABALHOS dos irmãos do artista, apesar de muito mais numerosos do que as OBRAS de Pedro, foram encapsulados na obsolescência típica dos TRABALHOS da ERA INDUSTRIAL e para qual foram projetados, executados e circularam com o seu tempo de fortuna marcado pelo TEMPO do relógio.
O surgimento e afirmação do processo da primeira ERA INDUSTRIAL em Porto Alegre, gerou narrativas escritas e socializadas pelo produto industrial do livro. As narrativas da historiadora Sandra Jatahy PESAVENTO são as mais divulgadas e lembradas. Contudo, os produtos industriais, há muito consumidos e obsoletos, deixaram os melhores índices e documentos gráficos que mais os aproximam da ARTE. Assim permaneceram os rótulos com que os produtos da ERA INDUSTRIAL circulavam, foram comercializados e consumidos. Foi a partir deste índice gráfico que a historiadora produziu e documentou o processo do surgimento, apogeu e entropia do processo da primeira ERA INDUSTRIAL ocorrida em Porto Alegre. No contraditório, existem numerosos outros índices, objetos e vazios, capazes de desencadear, produzir narrativas coerentes com o processo industrial em Porto Alegre. Contudo, na medida que as OBRAS de ARTE constituem obras mentais, o caminho é facilitado para trazer os objetos materiais e técnicos ao alcance da inteligência humana.

Foto Fernando ZAGO
Fig. 09 – Gravura em Porto Alegre – A obra de Plínio Cesar BERNHARDT (1927-2004) constitui um repertório sem par e por meio do qual é possível acompanhar, como precioso índice, numerosas e diversificadas experiências estéticas que s desenvolveram na segunda metade do século XX. Neste índice ocupa um lugar privilegiado a gravura nas suas mais variadas formas e técnicas. Nesta, em particular ele registra o ambiente abafado, escuro e poluido das “Classificadoras de Fumo”.


O CONTINUUM supõe projetos, instituições e ERA INDUSTRIAL. Instituições, não se resumem em prédios físicos. Supõe o ânimo, a inteligência com que os seus agentes enfrentam o direito ao seu próprio campo específico. O suporte financeiro não melhora, por si mesmo, e nem resume o campo de forças do AGIR da ARTE. Soa particularmente verdadeira e cheia de sentido a observação do mestre Ado Malagoli (1908-1994) quando afirmava “...sim um artista pode ser rico. Mas ele corre o risco de ser apenas mais um rico numa sociedade capitalista”. Ninguém nega dinheiro a quem desenvolve um intenso trabalho corre riscos e perdas únicas. Estes temerários, aparentemente inúteis ao seu tempo e lugar, são responsáveis por deixarem fontes de renda séculos afora.  As aparentemente inúteis pirâmides egípcias carreiam, para esta região, preciosas divisas, mesmo 6.000 anos depois da construção. Suntuosos prédios e palácios, rendem dividendos às cidades, aos países e continentes que souberam estudar, atualizaram e fazem circular, no presente, estes tesouros, conservando e preparando para serem fontes de rendas perenes para as gerações seguintes.

Fig. 10 – Gravura em Porto Alegre – a obra de Regina SILVEIRA (1939) possui a força das suas experiências pessoais e coletivas como estudante, docente e orientadora. Paciente, sensível e inteligente absorveu a estética do mestre Ado Malagoli, de Iberê Camargo e de tantos outros. Conduziu  esta linguagem ao mundo técnico. Lançou-se, depois, na aventura de produzir, com o preto e branco da gravura, uma linguagem gráfica única. Dominados e apropriados ao seu  repertório, ela adquiriu o direito de usar estes recursos técnicos para dar o salto de qualidade, praticando a mais pura magia da Arte e da Criação.

Apesar destes tesouros, e talvez por isto mesmo, o ensino na ARTE sempre foi mais problema do que a uma solução. Em especial numa cultura tão próxima da Colônia e da escravidão legal e voluntária como a brasileira. Nestas circunstancias o estudante transforma-se rápida e alegremente em aluno. O docente num feitor de um saber fixo, único e impositivo numa linha de montagem implacável. Na estética sempre existe a expectativa subliminar generalizada que desembarque uma novíssima tipologia proveniente de além das fronteiras nacionais e que substitua a nova ainda em voga e já generalizada. Isto apesar desta tipologia não possuir a menor repercussão na cultura de origem. Na política e no poder do Estado brasileiro foi o caso do positivismo que nos seu país de origem tinha a menor expressão pública. Mas aqui foi instrumento de poder onipotente, onisciente e eterno só devido a sua origem exótica.


Foto Círio SIMON 2011
Fig. 11 – Gravura em Porto Alegre José Armando Vargas ALMEIDA (1939 ) foi um dos agentes mais ativos e conseqüentes na gravura  do Atelier Livre. Trazendo profundas memórias da infância passada no mítico  pampa, representa nesta cena um indivíduo amarrado pela Brigada Militar e deixado sob a custódia dos seus pais - donos do armazém local - e ali deixado, pela autoridade, enquanto praticava outras diligências. Encontrou na Gravura de Arte uma meio de eternizar para si mesmo e para o seu observador os índices e fragmentos desta experiência singular e pessoal.


A criação do Atelier Livre da Prefeitura buscou aliar o saber intuitivo e o saber o mais erudito possível. Iberê Camargo - na busca da autonomia da estética da sua obra - havia enfrentado os constrangimentos estéticos do contraditório do Estado Novo como as enxurradas estéticas - carimbadas com os mais diversos interesses - que buscavam desembarcar na cultura nacional e fazer os seus fiéis prosélitos. Num clima anterior a 1964 buscou transmitir esta indignação e e direito as pesquisas estéticas no seus cursos de Verão desenvolvidos no Theatro São Pedro e na companhia dos germes das obras de arte que Ado Malagoli havia reunido no MARGS situado no Foyer desta casa. Este espírito estava ainda presente quando estes cursos de Iberê se institucionalizaram no alto do democrático e aberto a todos em qualquer hora no alto “Abrigo dos Bondes” da Praça XV de Novembro. Ali foram convidados para serem orientadores destas experiências estéticas, Vasco Prado, Danúbio Gonçalves, Xico Stokinger, Carlos Scarinci... e tantos outros, em especial, ao longo dos seus tradicionais festivais de Inverno de cada ano.  Esta geração inicial percebeu e selecionou aqueles que poderiam levar adiante esta experiência. Estes selecionadas tornaram-se agentes qualificados e voltaram o seu tempo integral para a instituição. Esta energia humana e criativa logo se transferiu do Abrigo dos Bondes para os altos do Mercado Público e dali para um sobrado da rua Lopo Gonçalves até ganhar casa própria no Centro Cultural do Município.

A GRAVURA foi como um fio de Ariadne para conduzir as forças para o campo ARTE e mantê-las críticas e vivas. Os mais experientes do Atelier Livre aproximaram - pela prática do FAZER da GRAVURA - aqueles que desembarcavam pela primeira vez. Os seus agentes qualificados não abdicavam simultaneamente da teoria exigida no AGIR neste campo como ARTE. Este AGIR MENTAL envolve mais aqueles que pretendiam permanecer mais tempo neste campo. O AGIR MENTAL que os capacita para elaborar projetos conscientes o que os torna igualmente históricos.


Fig. 12 – Gravura em Porto Alegre A primeira dama inconteste da arte brasileira, Regina SILVEIRA (1939), traz todas as forças das suas experiências pessoais e coletivas como estudante, docente e orientadora deste os mais humildes até os mais alta instituições de Arte. Discípula de Ado Malagoli e integrante ativa das experiências repassadas, em 1960, por Iberê Camargo. Dali seguiu para experiências marcantes em instituições internacionais e se fixar em São Paulo. No seu retorno temporário para Porto Alegre e para o ambiente do novo Museu Iberê Camargo mostrou as possibilidades da gravura associada a uma vigorosa mentalidade criativa e da qual domina os segredos e forças.


Chega-se conclusão a GRAVURA foi praticada em Porto Alegre em diversas épocas, formas e mentalidades. Na contextualização da GRAVURA em PORTO ALEGRE percorreu-se um panorama geral onde despontaram concepções, condicionamentos e práticas que a aproximam da ARTE. Cabe á GRAVURA em PORTO ALEGRE, como ARTE, o continuar a desenvolver o direito de seu conhecimento específico e a vontade de sua prática continuada. Caso contrário a GRAVURA como ARTE em PORTO ALEGRE retornará ao seu lugar de naturalidade, obsolescência programada característica da entropia de toda a cultura que busca confundir-se com a Natureza dada.

Foto Círio SIMON 1967
Fig. 13Gravura em Porto Alegre Tadeusz LAPINSKI  no ATELIER de LITO  de Danúbio GONÇALVES em 1967

FONTES IMPRESSAS
ATELIER LIVRE: 30 anos. Porto Alegre : Secretaria Municipal de Cultura/  Coordenação de Artes Plásticas. 1992, 100p.

NOGUEIRA, Isabel Porto El pianismo en la ciudad de Pelotas(RS-Brasil) Conservatorio de Música 1918 a 1968 una lectura histórica, museológica y antroplológica Madrid. Universidad Autônoma de Madrid – tese 2.000 – 317 p. Il

----------História iconográfica do Conservatório de Pelotas. Poero Alegre : Porto Alegre : Palotti, 2005, 283 p. il


PESAVENTO. Sandra Jatahy (1945-2009). RS: economia e  o poder dos anos 30.  Porto Alegre :   Mercado Aberto. 1980, 192p.

 ____.   História da indústria sul-rio-grandense. Guaiba :   RIOCEL, 1985. 123p


SCARINCI, Carlos. A gravura no Rio Grande do Sul (1900-1980). Porto Alegre :  Mercado Aberto,  1982.  224p. + il. col.
ZANINI Walter - Litografias coloridas de Tadeusz Lapinski – exposição no Rio Grande do Sul – São Paulo . SP : MAC-USP/ Museu de Arte do Rio Grande do Sul set. out. 1968, 08 p. il

Foto Círio SIMON 2011
 Fig. 14 – Gravura em Porto Alegre – Exposição de gravura do Atelier Livre de Porto Alegre na Pinacoteca Aldo Locatelli em  dezembro de 2911
FONTES NUMÉRICAS DIGITAIS
PRIMEIROS JORNAIS do RIO GRANDE do SUL

CAIO PRADO JUNIOR

FRANCISCO IGLESIAS

INTEL e o PROCESSADOR 4004
 
MIGRAÇÕES HUMANAS e TRANSUMÂNCIA

MARCAS de GADO

LITOGRAFIA no RIO GRANDE do SUL
DATAS de 1900 a 1929 em PORTO ALEGRE
Sandra Jtahy PESAVENTO 1945-2009
VILA MEDICIS – ROMA

A presente postagem possui objetivos puramente didáticos

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