terça-feira, 16 de abril de 2013

061 – ISTO é ARTE.



ARTE - MONUMENTOS – CIVILIZAÇÃO

- COLUNA VENDOME no CHÃO PARIS  em 17 de maio de 1871
Fig. 01 – A Coluna Vendôme derrubada pela Comuna de Paris em 1871. Cada novo regime, ao chegar e se instalar no poder, busca se apropriar do patrimônio público e destruir tudo aquilo que não é coerente com a sua nova ideologia que se deseja implantar, cultivar e reproduzir. Os novos regimes e inseguros de si mesmos sempre praticaram estra ação. As dinastias egípcias mandavam raspar a mensagens das anteriores e escrever os seus nomes para se afirmarem.

As grandes civilizações superiores preferem os monumentos visuais onde podem deixar registrado o estágio e o índice do seu desenvolvimento e os seus apogeus. Mesmo admitindo que o que permanece é o pensamento a maioria das civilizações prefere a  vista
 Não só para agir, mas até quando não nos propomos operar coisa alguma, por assim dizer, preferimos a vista aos demais sentidos. A razão é que ela é, de todos os sentidos, o que melhor nos faz conhecer as coisas e mais diferenças nos descobre”
                                                                     Aristóteles, 1973, p.211, .Metafísica L.I cap. 1.
Não se trata da figuração. As pirâmides do Egito ou o padrão infinito são visuais sem serem figurativos.

A imagem desce ao coração da matéria penetrando ali na realidade do mundo”.
como escreveu Goethe, (1945 : 11) [1] .
Chartier foi mais categórico: "com a imagem não se discute". (1998: 179)

No conjunto e resumindo: trata-se da culminância da civilização.


[1] - GOETHE,Johann Wolfgang von.Teoria de los colores.Buenos Aires:1945. 466p


MUNIZ Vik – Releitura da Medusa de Caravaggio     http://historiadaarte2009.blogspot.com.br/2009/11/medusa.html
Fig. 02 – As artérias das metrópoles contemporâneas transformam-se em verdadeiras serpentes da cabeça das Medusas urbanas. As suas vitimas preferidas são as vidas humanas. O novo regime colonial, que instalam,  não são só devoram os vestígios das civilizações anteriores, mas retiram e aniquilam qualquer sentido e tornam arcaicos e incômodos estes índices das gerações anteriores. Estas preferem a cremação aos antigos túmulos perpétuos.

 Porém a maior parte do tempo a humanidade viveu as idades médias, a época das trevas e agarrado ao dia a dia da sobrevivência. Pouco importava qualquer transcendência destes universos empírico do aqui e do agora. Nestas épocas usam-se os santos de pau ocos das Missões Jesuíticas para cochos dos animais. Ou o contrário estes mesmos santos são objetos de cobiça e transformados em patrimônio material de uma classe que se julga superior a estas crenças primitivas e coletivas.

ALVES, José Francisco.  A Escultura pública de Porto Alegre – história, contexto e significado. Porto Alegre: Artfolio, 2004, p. 172
Fig. 03 – A obra de Joice SCHLEINIGER da Praça Japão de Porto Alegre sofre o abandono e simples desmantelamento. Resultante de um belo projeto para humanizar os espaços públicos da metrópole com obras de jovens artistas denota os mesmos índices do colonialismo e da mentalidade de transformar o trabalho do artista em algo pontual e passível de ser esquecido no momento seguinte, como a maioria das obras públicas que povoaram posteriormente o Parque Marinha do Brasil.

Ainda em 2013 as máscaras dos Hopi[i] foram em leilão em Paris e transformados em objetos particulares de colecionadores.

Fig. 04 – A apropriação dos objetos simbólicos dos povos considerados inferiores e incompetentes pela lógica dos regimes coloniais encheram os museus de objetos que perdem o sentido tanto para o colonizador como pelo colonizado. Para o poder do regime colonial esta apropriação do mundo simbólico do colonizado era uma demonstração de sua superioridade econômica,  política, militar ou eclesiástica. Passado este regime estes objetos simbólicos perderam para o colonizador o sentido de seus múltiplos poderes. A tradição e os suportes nos objetos materiais de equilíbrio do mundo dos povos nativos o autorizam as mais desencontradas reações emocionais contra o seu opressor oportunista.

 Os museus dos países colonialistas estão recheados, fazem se restaurações para ganhar dinheiro e se apaga tudo o que a geração ou o partido anterior no poder.

Fig. 05 – A apropriação do espaço público segue a mesma lógica do regime colonial brasileiro. Esta apropriação colonial é possível na medida em que não interfere ou atrapalha o poder político, militar ou eclesiástico. Assim o brasileiro deixa evidentes índices do regime colonial e da mentalidade cuja designação de “colono” foi transferida impropriamente ao inocente imigrante.

- Adianta vigiar e punir estes neo-bárbaros?.

Se o objetivo for apenas vigiar e punir os pichadores sob a ótica e o pretexto do lucro com um hipotético turismo lucrativo, a resposta é: NÃO. A resposta é SIM se o objetivo é procurar as raízes do mal e as formas adequadas para curar a barbárie pela raiz e sem usar qualquer meio aversivo. O punir destemperado e carente de tempo e oportunidade produz os efeitos contrários conforme advertiu Sêneca (Consolo à Hélvia, p.3) que:
não se deve combater de frente a violência e no primeiro instante das dores da indignação,  porque só se consegue instigá-la ainda mais e, assim, aumentá-la. Assim como nas doenças nada mais pernicioso para a saúde do que um remédio prematuro”.

Fig. 06 – As agressões e desqualificações atingem indiscriminadamente tudo aquilo que evoca a escravidão e o regime colonial. A antiga IGREJA do ROSÁRIO de Porto Alegre,  erguida com o trabalho dos escravos e de sua busca para se adaptarem e fazerem as pazes com o Regime Colonial - que os explorava  e arrancava os derradeiras forças - foi insensivelmente posta abaixo e arrasada.  Esta demolição não só tentava apagar os últimos vestígios desta identidade e cultura - ao qual o Brasil e as suas instituições - mas até o presente não recebeu uma reparação condigna e à altura da civilização que se dizia superior e universal.

Nesta cura da barbárie o primeiro passo é conhecer o mal (inteligência). O segundo é admitir (vontade) este mal. O terceiro é a profilaxia em tempo adequado e proporcional à vontade e ao mal diagnosticado. Evidente que o remédio tardio e a procrastinação indefinida da correção são piores do que o remédio prematuro.

Fig. 07 – O monumento à Júlio da Castilhos, erguido entre 1908 e 1913, ao longo dos governo de Carlos Barbosa e de Cândido José de Godói, seus operoso secretário das Obras Publicas e da Fazenda marcou um período civilizatório ímpar na cultura sul-rio-grandense. Este projeto não compreendido e muito menos assimilado. Por isto foi imediatamente esquecido e os seus agentes destinados ao mito e ao olvido. No seu isolamento conceitual e estético foi entregue não só ao olvido, mas às agressões mais vulgares. A administração e as gerações seguintes foram incapazes e incompetentes para entender, ampliar e reproduzir algo como este projeto único. Não se faz aqui apologia da estética, nem da ideologia e muito menos da política partidária que deu forma e materializou este monumento,  mas ao projeto civilizatório compensador dos quais ele era o portador físico.

No conhecimento certamente repercute a frase “pouca saúde e muita saúva”. A duas piores pragas que se desenvolveram na cultura brasileira foram o Regime Colonial reforçado e alimentado pela escravidão. Regime Colonial que avilta a tudo e a todos transformando tudo em lucro e patrimônio material controlado por alguns em beneficio próprio. Escravidão na qual uma classe, que se julga superior e separada das demais, avilta a vontade da maioria. Maioria que lhe deve obediência e servidão e para isto transforma  o trabalho de todos em benefício próprio e exclusivo.  Apesar de oficialmente e declarados legalmente extintos eles continuam, na prática, a devastar o inconsciente coletivo de uma forma continuada e se reproduzindo nas formas mais evidentes até as mais subliminares.

Fig. 08 – A reação ao colonialismo e aos horrores da escravidão não podia ser mais eloquente do que a barbárie armada e letal desta imagem. Evidente que esta reação deste bando não produz mais do que barbárie. Porém a busca do poder pelo mais forte, armado e ágil não respeita a vida, os valores materiais ou simbólicos dos que aproveitaram ou ainda gozam algum usufruto do colonialismo ou escravidão.  Revivem a saga dos quilombos,  do cangaço ou do Contestado. Atualizam no território nacional brasileiro as insurgências populares latino-americanas contra o regime colonial e a escravidão. Diante desta mentalidade não há monumento, civilização e arte a ser pensada, implantada e reproduzida por tempo indeterminado.

Apesar de diagnosticado por todos existe uma resistência absurda em admiti-los, mesmo contra as mais evidentes provas.

 O pouco apreço pelo coletivo é uma das demonstrações do colonialismo e da escravidão. Este coletivo imposto pela lei pela lei, pela vigilância e desconfiança e pela violência e truculência de um pensamento tão primitivo como aquele que deve ser punido. Este que deve ser punido procura todas as brechas e ocasiões para depredar o que ele sabe que é do seu opressor. Com isto ganha notoriedade entre os do seu bando e os próprios donos de plantão do poder. Não sente nenhum contrato e nem remorso em agredir o que os agentes do poder constituído. Não representa o menor valor para ele.

Fig. 09 –  Índices corrompidos do que deveria ser civilização. Os enfoques exclusivos no processo material corrompe ecologicamente a paisagem e desvia as mentes de um projeto civilizatório, no mínimo compensador dos tributos que uma nova tecnologia exige para se humanizar e ser um autêntico instrumento de melhoria social, política e econômica.  O sorridente jovem, que foi capaz de matar seis motoristas de taxi certamente possui o mesmo esgar do bando da fig.08. Quando um grande número de civilizações usou as colinas para construir as suas acrópoles e os seus lugares sagrados a cultura atual as consagra e reserva para a tecnologia.

A preservação dos monumentos públicos, de outra parte, jamais pode ser prioridade diante dos mais frios assassinatos e atentados ao patrimônio de suas vitimas[i]. Porém estes atentados à vida humana, a depredação e a agressão ao patrimônio público e privado,  decorrem da servidão aos bens materiais.  Servidão que tira qualquer sanção moral dos atos destes delinquentes.

NAU dos INSENSENSATOS -  Nrenmberg - Alemanha  - Google Earth

http://www.flickr.com/photos/46614817@N04/5431808956

http://naofoinogrito.blogspot.com.br/2012/10/nao-foi-no-grito-056.html
Fig. 10 – Em todos os tempos e lugares da terra, a sedução pela propaganda e marketing fez as suas vítimas. A imprensa industrial esclareceu,  nas primeiras edições,  acentuou e condenou  as causas desta irracionalidade coletiva. A Nau dos Insensatos numa das primitivas edições ganhou forma visual e que foi retomado no teatro por Molière, por Delacroix na pintura ou, em monumentos como o de Nuremberg da imagem.

 Estes infratores agem presos aos grilhões de um regime colonial. As suas vontades próprias deixam de existir na medida em que são substituídas e subjugadas pelas condições sociais e matérias alheias e carentes de qualquer sanção moral. Condições sociais alheias implantadas, alimentadas e reproduzidas pelos conceitos subliminares da escravidão coletiva. Escravidão coletiva louvada e alimentada pelo marketing e pela propaganda exógena e traduzida apenas por bens materiais. Marketing e propaganda exógena contra a qual a cultura local é incapaz de desenvolver um meio de defesa eficaz ou um antídoto pontual.

Fig. 11 – As quatro estátuas quebradas do Chafariz da Praça da Matriz de Porto Alegre foram reinstaladas e cercadas em outra praça. A população lhes é indiferente, pois está carente de orientações e de informações em relação à sua história e o seu sentido. No máximo as percebe como índices ligados a um projeto de um poder central de um regime político cuja vigência está vencida.

Esta eficácia e antidoto à escravidão e ao colonialismo  torna-se visível nos índices de uma plena convicção e uma noção sadia de liberdade e competente para deliberar e de decidir. Índices nascidos da vontade humana que reina soberana e harmoniosa tanto sobre as condições inerentes à uma vida digna, como sobre os bens materiais e imateriais.  A arte, como ação humana, leva ao terreno da ética, pois Kant vinculou a vontade da ação humana com a moralidade e a autonomia, ao afirmar na Crítica da Razão Prática (Livro I, teorema IV), que “a vontade possui moralidade no limite da sua autonomia” , o que faz com que a ação  do artista busque a ampliação permanente do limite da sua autonomia.

Fig. 12 – Imagem de um dos monumentos da era industrial cuja vigência e sentido se perderam no tempo marcado e  guiado pelo relógio mecânico. Porto Alegre possui bairros inteiros sujeitos à entropia natural e cultural. As reciclagens destes prédios para outros fins e os museus tecnológicos demonstram a passagem da era marcada pelos bens simbólicos para aqueles que constituem os bens virtuais. Deste prédio só sobrou a imagem enquanto que ele foi demolido.

Uma cultura, ainda incapaz de elaborar um projeto, sustentar a sua autonomia e muito menos reproduzir um pacto social, não possui o direito a uma memória positiva e muito menos a uma civilização.

CATTELAN Maurizio “If a Tree Falls in the Forest and There is no One Around it, Does it Make a Sound  1998  Taxidermized donkey, television, bridles, cotton cloth, cord 150 x 154 x 46 cm

Fig. 13 – Na medida em que a imagem da televisão constitui uma realidade virtual o seu suporte tecnológico ainda é da era industrial. Esta por sua vez sobrecarrega o mundo da Natureza com o lixo que produz. O mundo da escravidão e do colonialismo cultural ra parece e cobra os seus tributos. Carente de um projeto civilizatório compensador, fundado no respeito e a coerência de cada uma destas etapas, o mundo virtual também possui a força de reconduzir para o exercido pelo mais forte e competente e imposto ao mais ignorante.

Na elaboração, na sustentação e na reprodução deste pacto social, não há espaço nem para a mentalidade mítica e muito menos admitir que ele seja um produto natural. Impõe-se um projeto coerente com o trabalho possível aqui e agora.

FONTES BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, José Francisco.  A Escultura pública de Porto Alegre – história, contexto e significado. Porto Alegre : Artfolio, 2004, 264 p. : il  ISBN 85-99012-01 -0 CDU: 730.067.36(816.51)



ARISTÓTELES (384-322). Ética a Nicômano. São Paulo: Abril Cultural1973. 329p.



CERTEAU, Michel de.  A invenção do cotidiano.  Petrópolis : Vozes,  1998  2 v.



KANT, Emmanuel (1742-1804). Crítica da razão prática. Rio de Janeiro: Tecnoprint, s/d.  255p



SÊNECA, Lúcio Anneo(4 aC– 65dC)Consolo à Hélvia, Brasília: Domínio Público, S/d, 47 p.




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