terça-feira, 27 de novembro de 2012

054 – ISTO é ARTE


A ARTE na UNIVERSIDADE 

Fig. 01 – A Academia de Platão é considerada a origem das instituições superiores e especulativas da cultura ocidental. Enquanto Aristóteles tratou de coloca-las ao serviço da educação formal e escreveu uma série de tratados que orientaram discípulos como Alexandre Magno e que espalharam conhecimentos e tratados semelhantes pelo mundo Antigo. A Biblioteca de Alexandria foi dos centos de convergência destes conhecimentos e estudantes deste saber.
Rafael Sanzio (1483-1520) colocou no eixo central  da sua obra a Escola de Atenas a figura de Leonardo da Vinci(1452-1519) como Platão( 427-347 a. C.)  e Miguel Ângelo (1475- 1564) na figura de Aristóteles (384-322 a. C).
 
O objetivo da presente postagem é examinar a institucionalização da Arte na Universidade Brasileira no âmbito das suas potenciais autonomias. Conceitua-se autonomia como competências e seus limites ao exemplo da célula que necessita do limite da sua membrana  para que as suas competências vivas possam interagir com o seu meio ambiente. Nos extremos destes limites afasta-se, de um lado, a soberania  e a heteronímia do outro .
Fig. 02 – A figura da Atenas nascida da inteligência de Zeus num dramático parto é a metáfora das dores que acompanham o parto de toda  inteligência e das necessárias mudanças que provoca esta doloroso parto. Adotada como ícone da Universidade do Brasil  continua a ser o símbolo de uma universidade transformada em paradigma da universidade brasileira pela Revolução de 1930.

A institucionalização da Universidade para todo o território nacional brasileiro é um fato recente. Talvez por este mesmo fato não teve uma origem simples e nem original. Ao contrário foi muito complexo. Esta universidade nacional ambicionou instaurar e abranger todas as competências de tudo o que de melhor e mais atual que existia para esta instituição na passagem da década de 1920 para 1930. Nesta ambição incorporou as Universidades locais temporãs e os antigos Cursos Superiores originários do Brasil Colônia.
Fig. 03 – O Estado Brasileiro concordou com a vinda da Missão Artística Francesa ainda sob o regime colonial. Praticava, sem grande convicção, um Projeto Civilizatório Compensador da Violência que era obrigado a praticar para se manter no poder.  Esta Missão havia passado pela tormentosa Revolução Francesa e seus membros foram agentes ativos no uso da Arte no Império Napoleônico. Trouxeram, em 1816, ao Brasil uma alternativa estética Barroca do Brasil Colônia e ajudaram a lançar as sementes da Real e depois Imperial Academia de Belas Artes.

No acúmulo destas competências múltiplas, contraditórias e ecléticas fez figurar tanto a universidade publica como aquela da iniciativa privada. A universidade nacional brasileira inaugural foi tão múltipla, contraditória e eclética que incluiu a competências das Artes. Evidente a iniciativa particular nunca incorreu nesta temeridade, pois as Artes não trazem retornos financeiros. Em compensação a grande maioria das de iniciativa particular, em especial as de origem confessional, incluíram a Teologia, com claro objetivos de sua reprodução e manutenção de seus limites e competências.
Como em toda a cultura brasileira, A LEI PRECEDEU O FATO e o modelou a universidade nacional vigorosamente contra um mundo entrópico. Mundo acostumado a fazer e obedecer no âmbito da heteronímia  proveniente da escravidão acostumado ao mundo das leis fixadas nos pelourinhos (diário oficial) em latim ou português erudito.

ENDER Thomas – Alexander Humboldt e Aimé Bonpland (1773-1858) - pintura c. 1850 - Museu Humboldt  Berlim
Fig. 04 – O Brasil colonial não permitiu a entrada de Friedrich Wilhelm Heinrich Alexander von Humboldt (1769-1859) no território brasileiro ciumentamente fechado para qualquer estrangeiro. O seu irmão Friedrich Wilhelm Christian Karl Ferdinand Barão von Humboldt (1767-1835) criou a Universidade de Berlim  considerada origem da concepção  contemporânea desta instituição. Max Weber assinala que a UNIVERSIDADE é uma das poucas criações originais do Ocidente..

Nesta heteronímia as pessoas buscam primordialmente e percebem o que devem FAZER em relação aos rituais destas instituições e respeitar aos vínculos que lhes são impostos. No caso das universidades de inciativa particular continuaram na lógica jurídica da Lei 173 de 10 de setembro de 1893. Nestas instituições regidas por tal contrato a Revolução de 1930 gerou a leis que regem a CLT e que teve poucas mudanças. Nas de inciativa pública tiveram de absorver a mão de obra e os cargos e funções dos antigos Cursos Superiores. Para acompanhar este processo foi criado o Ministério de Educação e Saúde Pública (MESP), depois Ministério de Educação e Cultura (MEC) e depois simplesmente Ministério da Educação (ME). Contudo em 2012 o Ministério de Educação já não possui mais a competência de gerir os recursos humanos agora Ministério da Administração.
Fig. 05 – A  Academia Imperial de Belas Artes [AIBA] com o regime republicano transformou-se na Escola Nacional de Belas Artes [ENBA], No início século XX ganhou o majestosos prédio na Avenida Rio Branco. Foi incorporada à Universidade em 1931.  Mudou-se e depois para p prédio que abriga também a Reitoria da UFRJ da Ilha do Governador. O seu prédio é o Museu Nacional de Belas Artes, em 1937, vizinhando o Teatro Municipal e Biblioteca Nacional,

Contudo nesta dança das cadeiras o vínculo das Universidades Públicas nunca se evidenciou e clarificou tanto as Universidades como seus servidores serem parte integrante do Estado Brasileiro. Evidente que a criação de cargos e funções públicas são competências deste Estado Nacional, Estadual ou Municipal. Contudo são cargos e funções que ainda não possuem a meridiana clareza se SÃO ou NÃO Cargos e funções do Estado.
Fig. 06 – O prédio construído para abrigar o Ministério de Educação e Cultura recebeu uma profunda interação ente Urbanismo, Arquitetura, Escultura e Artes Visuais e que o tornaram legendário. A maioria dos seus criadores haviam tido a sua formação superior na ENBA além das diretas influências das tendências estáticas vigentes na década de 1930.

 Ainda existem, no presente, cargos e funções temporários nas instituições superiores mantidas pelo Estado Brasileiro. Nesta mantenedora pública houve um longo período no qual se aplicava as leis dos contratos da iniciativa privada. De outro lado a criação de vagas estudantis também depende da aprovação legal. Até o presente o acesso a elas é via vestibular nas suas variadas interpretações. No espaço publica estas vagas são subsidiadas e gratuitas. No âmbito da iniciativa esta vagas também são subsidiadas, financiadas mas pagas monetariamente de uma ou de outra forma.
Evidente todo este mundo formal e jurídico é uma dura prova para o artista criador como já reconhecia Platão “Veríamos desaparecer completamente todas as artes, sem esperança alguma de retorno, sufocada por esta lei que proíbe toda pesquisa. E a vida que já é bastante penosa, tornar-se-ia então totalmente insuportável(Platão, Diálogos, 1991, p.417) .

ALMA TADEMA, Lawrance 1836-1912 - Fídias mostra o friso aos amigos  -1868 - óleo 72 x 110.5 cm
Fig. 07 – O período áurea da cultura helênica criou um perfeita coerência entre as forças dos campos da Arte, da Política, do  Conhecimento e da Economia . Esta coerência se manteve para dar frutos no Parthenon da Acrópole de Atenas O artista ilustra a interação entre os observadores e  artista Fidias ao mostrar os frisos do interior desta construção.

Só um líder muito experiente possui competência de fornecer o oxigênio da liberdade necessário ao artista criador produzir uma obra significativa e coerente com o seu tempo. De outra parte não se trata de um artista insensível ao problema da cultura e da civilização nas quais pretende produzir a sua obra, arranjar observadores e perpetuar a sua mensagem através do tempo e do lugar. Bem ao contrário.
Fig. 08 – A orgulhosa resposta “não me tires o que não me podes dar” de Diógenes (413 – 323 a.C) ao conquistado Alexandre Magno (356 – 323 a.C.), quando este se colocou entre o sol de inverno e o filósofo, expressa a autonomia necessária ao pensar e ao sentir e para uma instituição que possui estes objetivos.

A Arte, colocada já origem na Universidade do Brasil, foi forçada a adotar esta estrutura institucional. Teve de ceder certamente em muitas competências administrativas e até conceituais que ela gozava em academias, institutos e escolas separadas e autônomas. Em compensação ganhou, em troca, a possibilidade de uma interação em campos próximos e segurança.
Fig. 09 – A figura do PENSADOR foi colocada originalmente  por Auguste Rodin (1840-1919) sobre a sua monumental obra “Porta do Inferno” (1880-1900). Depois moldada e fundida separadamente e tamanho natural, como obra independente serviu como metáfora e porta de entrada de diversos prédios de universidades

Evidente que a proximidade administrativa lhe foram muito prejudiciais. Porém o cúmulo da perda da autonomia  culminou na pior situação quando campos da cultura humana próximos começaram invadir e lotear as competências especificas do campo de forças da Arte. Todos os limites da membrana que protegiam a Arte romperam quando ela foi compelida ou jogada em Centros, Áreas que possuem tradição de busca de hegemonia. Competências que lhes eram naturais pelo fato de possuírem apoiados externos e reguladas e administradas por profissões regulamentadas inclusive com algum poder econômico. A profissão de artista nunca foi regulamentada e nem possibilidades de tal. No Brasil a área de Informática também não foi regulamentada.
Fig. 10 – A obra PAZ e CONCORDIA de Pedro Américo Mello Figueiredo é índice da vida, dos estudos e das concepções politicas deste pintor. Obra realizada em duas versões nos primórdios do Regime Republicano do qual este artista foi constituinte elo seu Estado natal. Artista originário de Areias na Paraiba ele foi o primeiro brasileiro a defender tese de doutorado em Filosofia na Universidade Livre de Bruxelas.

Certamente foi realizada com a maior boa vontade e nas melhores intenções e que podem resultado no maior mal como o artista da palavra Guimarães Rosa soube tão intuir e escrever (1963, p.18)
Querer o bem com demais força e de incerto jeito, pode já estar sendo se querendo o mal por principiar. Esses homens ! Todos puxavam o mundo para si, para concertar consertando. Mas cada um só vê e entende as coisas dum seu modo ...[1]

A grande contribuição da Arte para a Universidade seria dissipar a nuvem de medo, de heteronímia e de escravidão que a reprodução de paradigma alheios joga como lixo, obsoleto e kitsch  incoerente com o nosso tempo e lugar. Em todas as autênticas manifestações artísticas é alguém que se expõe publicamente e não pode pedir desculpas por uma eventual obra fracassada. Tanto a Arte como a Universidade possui por sina o cultivo do habito da integridade intelectual, moral e estética. Este hábito gera conhecimento, vontade e direito novos e coerentes com o tempo e o lugar.

[1]  - GUIMARÃES ROSA,  João. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro : José Olympio, 1963, ..


Fig. 11 –  A meia verdade dos “PENDORES NATURAIS para as ARTES dos afro descendentes e ameríndios”, esconda a verdade inteira da “FALTA de PERSPECTIVAS PROFISSIONAIS e dos RETORNOS FINANCEIROS nas ARTES” para as classes que se julgam superiores. É cero que campo das Artes foi sempre manancial de energias independente das etnias de origem. O contornado e desprezo do campo das Artes recebeu contribuições de Aleijadinho de um Pe Maurício, de Machado de Assis. João Batista da COSTA (1865-1926) ocupou a  cátedra  na ENBA e foi seu Diretor da de 1915-1926 O seu irmão  Artur Timóteo da COSTA, o autor desta obra acima, teve presença positiva nas instituições superiores de Arte, muito antes das cotas legais,  http://pt.wikipedia.org/wiki/Museu_Afro_Brasil

Outra contribuição significativa da Arte para a Universidade é a de desfazer o mito de que a civilização, as suas instituições são  naturais e que se reproduzem sempre da mesma forma e na mesma hora a semelhança dos organismos naturais. Nisto distingue-se a autonomia da célula viva daquela autonomia da vida das instituições construídas pela criatura humana. Na Arte a originalidade, a criatividade e a coerência jamais são os idênticos com aquelas da vida. Para existir a autonomia da  Arte ela necessita o estímulo consciente e continuado da inovação intencional, a renovação constante da vontade e do gozo do direito da autonomia diante da entropia que a tudo devora. Nestas circunstâncias a Universidade e a Arte possuem muitos pontos em comum. Com vontade consciente, dos pontos em comum, a Universidade de da Arte  gozam do direito de construir a sua constante interação institucional.

FONTES BIBLIOGRAFICAS
CUNHA, Luiz Antônio,  Universidade temporã : o ensino superior da Colônia à Era          Vargas. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira. 1980, 295p.
 
DUCHAMP, Marcel, «L’artiste doit-il aller a l‘université?» in Duchamp du signe. Paris  :  Flammarion 1991.

FIGUEIREDO e MELLO,  Pedro Américo – Considerações filosóficas sobre as belas-artes entre os antigos (1864) Estudo introdutório de Silvano Alves Bezerra da Silva.  João Pessoa : Editora Universitária – UFPB, 2006, 256 p
------------ LA SCIENCE et les SYSTÈMES: questions d´histoire et de philosophie naturelle. Bruxelles : Gustave Mayolez, 1869, 169 p

MARQUES dos SANTOS, Afonso Carlos «A Academia Imperial de Belas Artes e o projeto   Civilizatório do Império»  in  180 anos de Escola de Belas Artes.
Anais do Seminário EBA 180. Rio de Janeiro : UFRJ, 1997, pp. 127/146.


PLATÃO ( 427-347 a. C.) DIÁLOGOS – (5ª ed.) São Paulo : Nova Cultural, 1991 – (Os pensadores)

WEBER, Max (Karl Emil Maximilian 1864 – 1920).  Sobre a universidade. São Paulo : Cortez, 1989.  152 p.
TEXTOS LEGAIS RELATIVOS à UNIVERSIDADE BRASILEIRA e as ARTES

TEXTO da Lei nº 173 de 10 de setembro de 1893

DECRETO Nº  . 8.659, de 5 DE ABRIL DE 1911  organizou o Ensino Superior e do Ensino Fundamental na Republica  na competência do Ministério do Estado da Justiça e Negócios Interiores possuía as funções da Instrução Publica e era por ele administrado porém afastando-os do Estado, como se lê no“Art. 2º Os institutos, até agora subordinados ao Ministerio do Interior, serão, de ora em diante, considerados corporações autonomas, tanto do ponto de vista didactico, como do administrativo”. No “Art. 3º Aos institutos federaes de ensino superior e fundamental é attribuida, como ás corporações de mão morta, personalidade juridica, para receberem doações, legados o outros bens e administrarem seus patrimonios, não podendo, comtudo, sem autorização do Governo, alienal-os”.

DECRETO Nº  19.402  de 14 de NOVEMBRO de 1930
Cria uma Secretaria de Estado com a denominação de Ministério de Educação e Saúde Pública

DECRETO Nº 19.851 de 11 de ABRIL de 1931.[1]
Dispõe que o ensino superior no Brasil obedeça de preferência ao sistema universitário.

DECRETO Nº  19.852  de 11 de ABRIL de 1931
Dispõe sobre a organização da Universidade do Rio de Janeiro

DECRETO Nº 22.897 de 06 de JULHO de 1933.
 Altera disposições do decreto nº 19.852, de 11 de abril de 1931,  na parte referente a organização do ensino artístico ministrado pela Escola Nacional de Belas Artes, e de outras providências.

MINISTÉRIO de EDUCAÇÃO

MINISTÉRIO de PLANEJAMENTO
http://www.planejamento.gov.br/


PENSAMENTOS de DIVERSOS AUTORES em RELAÇÃO ao TEMA.

Foi somente no início do nosso século que os grandes artistas, com uma surpreendente unanimidade, começaram a protestar contra o nome «gênio» para insistir no ofício, da competência e nas relações entre arte e artesanato.  O artista, mesmo quando empresta sua obra à autoridade constituída, exerce uma função de guia no interior da sua esfera social, a do trabalho”. Argan, 1992 : 40
 
ARGAN, Giulio Carlo (1909-1992).   História da arte como história da cidade.   São Paulo :  Martins Fontes. 1992.

Na Inglaterra com a vinda da era industrial, a relação entre artistas  o público modifica-se, o público é tratado de uma forma diferente em relação a era do artesanato, a produção artística torna-se uma entre as especializadas, a teoria da realidade superior da arte e o artista independente é um «gênio superior»”. Bourdieu, 1987 : 104

BOURDIEU, Pierre ( *1.8.1930 - †23.1.2002) Economia das trocas simbólicas. São Paulo: EDUSP- Perspectiva,  1987.  361p

Antoine Prost observa que a organização de escolas para a formação de artesões e operários correspondeu a uma fase em que, com a destruição do artesanato pela indústria capitalista, e com a correlata desorganização das categorias de artesões através da aprendizagem nos ateliers dos mestres credenciados, abriu-se a necessidade de nova solução institucional”. Durand, 1989 : 59

DURAND, José Carlos, Arte, Privilégio e Distinção: Artes plásticas, arquitetura e classe dirigente no Brasil, 1855/1985.São Paulo : Perspectiva: EDUSP 1989. 307p.


De todas as categorias sócio profissionais, a do artista é sem dúvida o mais definido na medida em que os critérios que podem servir são a herança  multissecular”. Moulin, 1995 : 127

MOULIN, Raymonde.  L’artiste,  l’institution et le marché. Paris : Flammarion, 1995. 437 p.

 A arte não pode ter sua missão na cultura e formação, mas seu fim deve ser alguém  mais elevado que sobrepasse a humanidade. Com isso deve satisfazer-se o artista. É o único inútil, no sentido mais temerário Nittzsche 2000, p.134

NIETZSCHE, Frederico Guillermo (1844-1900) Sobre el porvenir de nuestras escuelas. Barcelona: Tusquets, 2000. 179


[1] -  SOUZA NEVES, Carlos. Ensino Superior no Brasil: legislação e jurisprudência federais. Rio de Janeiro : MEC-INEP. 1951   vol 4      pp. 165-192

FONTE NUMÉRICA DIGITAL  
30 de novembro de 2012: cinquentenário do Instituto de Artes na Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Este material possui uso restrito ao apoio do processo continuado de ensino-aprendizagem
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SUMÁRIO do 1º ANO de postagens do blog NÃO FOI no GRITO
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sexta-feira, 16 de novembro de 2012

ISTO é ARTE - 053



O ENTE e o SER diante da ARTE, da
Beleza, da Verdade e da Justiça.

O que não pode ser dito deve ser calado
WITTGENSTEIN Tractatus Logico-Philosophicus Aforismo 7.

Regina SILVEIRA  - 1939- Sombras
Fig. 01 – A origem do desenho e da pintura, conforme narrativa grega teria sido o traçado do perfil de um jovem feito pela sua namorada na hora da partida para a guerra. Regina Silveira atualiza esta metáfora para o tempo e as circunstâncias atuais. A artista sustenta a eterna luta contra o que insiste em se ausentar e aquilo que  escapa à percepção humana. Para tanto renuncia a tudo aquilo que poderia perturbar este seu projeto como a cor, a textura ou relevo.
Na administração destas perdas ela ganha coerência entre o seu ENTE e a sua maneira de SER no mundo. .

Necessitarmos guardar silêncio em relação ao ENTE da Arte. Como ENTE encontra-se  envolto em insondáveis dúvidas e mistérios dos quais só conhecemos repercussões. A mesma dúvida e o mesmo mistério envolvem a Beleza, a Verdade e a Justiça. No entanto as dúvidas e mistérios permitem especular e expressar-nos em relação ao SER. SER que se manifesta nas suas obras na forma de eventuais repercussões nos sentidos humanos. Neste SER das obras de Arte, da Beleza, da Verdade e da Justiça é possível exercer um sem números de escolhas entre extremos (Kuperthes) naquilo que atinge, estimula os nossos sentidos e repercutem em nossa mentalidade e cultura. Estímulos e repercussões derivadas do que denominamos de Arte, Beleza, Verdade e Justiça. Contudo elas derivam de ENTES primitivos da fala humana que se expressam em efeitos em campos de forças distintas e soberanas entre si mesmas. 

1968 - cartazes  - Biblioteca Nacional da França
Fig. 02 – “A Beleza está na rua” e jogando um paralelepípedo..  O ano de 1968 tornou-se antológico nas formas de expressar novas circunstâncias vividas ao longo da denominada “Guerra Fria” e a efeitos da descolonização dos continentes africano e asiático. Uma nova geração inovou os seus meios  de SER em formas de evidenciar formas de expressão do seu ENTE. Em tempos de imagens fotográficas, publicitárias e de marketing hedonistas fez escolhas de formas sintéticas nas quais imagem e palavra se reforçavam reciprocamente

As obras de Arte repercutem e se materializam em documentos de épocas e civilizações que tornam históricos os autores destes projetos. A maioria das grandes forças da natureza também só é perceptível aos sentidos humanos nos seus efeitos. As energias magnéticas, da gravidade e da genética, são algumas das forças das quais os sentidos humanos só percebem os efeitos. Estes efeitos geram documentos perceptíveis nas obras de Arte e que também constituem índices das escolhas dos seus autores. Estes autores tornam-se históricas na medida em que administram as perdas decorrentes da passagem entre o ENTE inatingível e imaterial e o seu SER possível e material.  

Fig. 03 – – “A Beleza está na rua” na forma de flores sendo levados sobre os paralelepípedos A indústria cultural da beleza é uma das mais consistentes e índice da evolução e de civilização. O recente termo “aestesia” tentou trazer para a gramática contemporânea os mais variados vocábulos existentes em todas as civilizações. Evidente que a “corrupção do ótimo é péssima” e ocorre quando o SER substitui, silencia ou abafa o ENTE do qual decorre a autêntica beleza. Esta é gratuita e revela-se nos mais variados índices..

O ENTE é percebido na COMUNICAÇÃO humana ao migrar do seu universo imponderável em direção dos sentidos humanos do seu SER. Esta percepção implica na passagem deste ENTE pelo ambiente da EXPRESSÃO rumo às obras físicas Nesta obra convergem autor e receptor. Esta passagem cobra o seu pedágio, pois toda escolha implica em uma ou mais perdas. Perdas físicas e mentais, pois também a quem recebe a obra de Arte nem tudo é possível perceber, codificar e assimilar em todas as épocas e lugares.

Fig. 04 – A cultura islâmica desaconselha a produção de imagens antropo e zoomorfas. Na perda da leitura imediata (mimese) ganha amplitude no universo da Lógica e da Matemática. Nesta lógica investe no PADRÃO INFINITO com o qual cria os mais amplos e variados estímulos sensoriais. Este acervo matemático desta cultura não figurativa esta Arte islâmica foi buscar o seu repertório na cultura hindu da qual trouxe o zero com profundas ressonâncias do conceito de “Nirvana ”.

As escolhas realizadas pelo observador impõe também o fluxo criativo na recepção no contínuo do que é perceptível das obras de arte. No universo da COMUNICAÇÃO humana nem tudo é possível em todas as pessoas, épocas e lugares. A cultura clássica grega já estava consciente desta barreira.
Não se deve argumentar com todo mundo, nem praticar argumentação com o homem da rua, pois há gente com quem toda discussão tem por força que degenerar                  Aristóteles –Tópicos – [Penúltimo Tópico][1].
Evidente que a obra de Arte se completa no seu observador. Apesar de qualquer ENTE humano potencialmente ser criador, estruturante de forças para atingir altura e assim superar esta barreira, ele necessita qualificar o seu SER para esta façanha e ter êxito e fortuna neste projeto de vencer esta barreira.

Fig. 05 – A caverna descrita por Platão encontra no globo ocular dos seres vivos uma materialização e mostra a distância entre o que é percebido e a realidade concreta e não mediado pelos sentidos humanos. A ótica ao evoluir seguiu este caminho da Natureza guiado pelas concepções teóricas. A fotografia penetrou no registro dos efeitos dos átomos até o registro da luz e magnetismo proveniente dos gigantescos conglomerados do espaço estelar. Contudo continua válida prescrição de Platão ”depois de observar as estrelas, deixemos os astros em paz e façamos Astronomia
.
É clássica e taxativa a resposta “não suba sapateiro além da chinela” dada pelo pintor grego a um dos seus observadores de sua obra e um conhecido profissional da cidade. Na própria Bíblia a expressão das “perolas aos porcos” traduz esta barreira entre o ENTE e o SER.  Contudo o observador também pode perverter o seu repertório particular e aniquilar a coerência que o projeto que o artista atingiu por ventura . Nem por isto o artista pode renunciar a autonomia do seu projeto e aderir de forma servil a um populismo crasso. Esta súbita e questionável  heteronímia recíproca pode significar, tanto para o artista, como para o seu observador, o retorno para a Natureza que “não tem nada por dentro” e arruinar a origem e a essência da obra de arte como projeto humano.

Fig. 06 – O mito do nascimento de Atenas da mente de Zeus é uma das mais  dramáticas descrições do nascimento da inteligência, associada à beleza e à vontade guerreira. O ditado chinês que “pensar dói” resume não só o ato da concentração mental mas incorpora a mal estar humano decorrente da ruptura epistêmica, da estética e dos antigos e obsoletos hábitos.
  
O contraste, a corrupção e a ignorância podem mostrar as competências e os seus limites da energia presente e atuante na origem e na essência da obra de arte como projeto humano, Ou como já  sentenciavam os latinos “ridendo castigat mores”. Neste contraste o ENTE projeta-se e ele recebe contornos dos seus limites do que É ENTE e NÃO o É. Este contorno e limites se desenham no confronto entre  a JUSTIÇA e o ARBÍTRIO,  entre a VERDADE e a MENTIRA, entre a BELEZA e o AGRADÁVEL e entre a ARTE e a CULTURA.

ACRÓPOLE de ATENAS imaginada por  KLENZE Leo von 1784-1864 -  pintura - 1846
Fig. 07 – Conforme um mito Atenas foi escolhido como padroeira a cidade grega num concurso entre todos os deuses. Os furibundos deuses como Marte, Zeus, Netuno assustaram mais do que agradaram aos gregos. A deusa vencedora,  na sua apresentação dos seus predicados para o título,  trouxe simplesmente e presenteou a cidade com uma muda de oliveira. Até o presente o azeite e as olivas são uma das fontes de riqueza da Grécia. Porém os habitantes da cidade mereceram o apoio de sua deusa quando expressaram isto numa cidade na qual usaram a sua inteligência, sensibilidade e vontade para materializarem isto no templo da deusa. Este tornou se um ponto de referência nevrálgico, um ícone do comércio e base de uma incipiente indústria cerâmica.

O melhor testemunho é daquele que viveu e acumulou um razoável conhecimento e experiências diretas em relação à ARTE, à VERDADE, à BELEZA e à JUSTIÇA.  Quem acumulou um razoável conhecimento e experiências diretas pode orientar o carente de experiência s desta natureza. Esta mediação pode trazer imensos benefícios se for coerente nas suas etapas, continuada e progressiva até o momento da autonomia do orientando. O perigo da mediação é a sua naturalização, formalismo e, assim, resvalar para a entropia ou a corrupção.
Fig. 08 – As múltiplas leituras de uma obra de Arte que “contém o máximo no mínimo de sua forma” possui no mínimo três eixos que lhe emprestam vestígios semióticos tanto na sua elaboração como na sua recepção. .

O Brasil deve, na concepção de José Vieira Couto Magalhães, o seu tamanho físico, a unidade nacional e a metade de sua força de trabalho ao processo de mediação. Mediação entre ameríndios e europeus iniciado (na base da VERDADE) e sustentado pela cultura portuguesa. Processo de mediação instituída e mantida pelos lusitanos na forma dos profissionais dos “línguas” (ARTE) colocados entre os ameríndios e os europeus. Além de manter relativa paz social (JUSTIÇA)  por meio desta medida singela o Brasil incorporou vastos territórios que inicialmente pertenciam outras potências europeias rivais, ou eram cobiçados e atacadas por elas. Na introdução do texto de o Selvagem  (1876 –p. X) ele escreveu: de que serve o missionário, com a as santidade das leis da religião, se ele não tem a língua por onde ensine a regenerador moral do cristianismo. O luso praticava este preceito (BELEZA), pois sabia que os espíritos não se vencem pela violência, mas pelo amor e pela generosidade” na concepção Espinosa  (Ethica 4.11)

FRANCISCO de HOLANDA 1517-1585 ilustração
Fig. 09 – O autor dos “Diálogos de Roma” revela a sua maneira  de perceber e expressar o ideal. Ele estava sob o profunda influência da figurativa de Miguel Ângelo, busca expressar o ENTE origem [A] e fim [W] de tudo e sem deixar de revelar uma ponta do legado da arte islâmica que preservou o pensamento de Platão durante a pior faz da Idade Média


Estas autores sabiam também que este conhecimento e prática constitui uma construção sobre o humano, pois toda a civilização, como construção artificial, está sujeita às leis da entropia. Contra as forças naturais da entropia há necessidade de vigilância e de trabalho.  Esta civilização artificial necessita do conhecimento das circunstâncias da evolução do projeto e da renovação dos contratos que se encontram na sua origem. Naturalizar uma civilização significa abrir as portas para a entropia. Não é possível realizar a passagem natural de uma civilização para outra sem ferir a sua soberania ou a sua autonomia e com graves riscos para as forças da ARTE, da VERDADE, da BELEZA e da JUSTIÇA. 
SIGNAC  Paul - Au Temps de l'Harmonie
Fig. 10 – A cultura europeia continuou a insistir na mimese figurativa. Esta obra de tendência  pontilista  de Paul  Signac foge da simples foto. Numa imagem  atomizada representa o ócio, o lazer e a Arte inclusive a si mesmo com o seu cavalete instalado ao ar livre e frente ao mar. O ENTE do artista se exterioriza e comunica o seu modo de SER e as suas circunstância particulares de um tempo e de um lugar. ”.

Toda revolução autêntica e coerente busca trazer para o seu presente o PODER ORIGINÀRIO de sua origem. As mediações espúrias conduzem  estas revoluções pelo caminho da entropia natural e acabam atentando contra as forças da ARTE, da VERDADE, da BELEZA e da JUSTIÇA. No seu lugar surge o populismo, a ganância pelo poder e da posse material e imaterial avassalador que neutralizam e aniquilam qualquer civilização.

FONTES BIBLIOGÁFICAS
ARISTÓTELES (384-322). Tópicos.   2.ed.  São Paulo  :  Abril Cultural. 1983,  pp.5-156.

COUTO MAGALHÃES, José Vieira (1837-1898)    O Selvagem  Rio de Janeiro : Typographia da ReformA, 1876, 194 p + anexos

HOLANDA, Francisco de (1517-1584) Diálogos de Roma: da pintura antiga. Prefácio de Manuel Mendes. Lisboa : Livraria Sá da Costa, 1955, 158 p.

SAUNDERS, Robert  A Educação Criadora Nas Artes. in  AR’TE 10. ano III  n o 10, São Paulo :Max Limonad, 1984., pp.18-23
 Este texto é parte do Capítulo  “Using Creative Mental Process in Planning Art and Humanities Programs”, do livro Relating Art and Humanities to the Classroom, de Robert J. Sauders. (Dubuque, WM.C. Brown Company Publishers, 1977.) Tradução : Silvia Macedo e D.T. Chiarelli.

WITTGENSTEIN, Ludwig. (1889-1951)Tractatus Logico-Philosophicus. Trad. Luiz Henrique Lopes dos Santos. São Paulo: EDUSP, 1994.

FONTES NUMÉRICAS DIGITAIS.
COUTO MAGALHÃES e a MEDIAÇÃO AMERÍNDIA – O SELVAGEM 1876

VISÂO e PERCEPÇÃO

Os espíritos não se vencem pela violência, mas pelo amor e pela generosidade.
Animi tamen non armis sed amore et generositate vincuntur. [Espinosa, Ethica 4.11]


Aforismo 7 “O que não pode ser dito deve ser calado
“7 What we cannot speak about we must pass over in silence”.
Satz 7 “Wovon man nicht sprechen kann, darüber muß man schweigen

Oscar Augusto Alejandro Schulz SOLARI (1887-1963) - XUL SOLAR - DRAGO 1927
Fig. 11 –  O pensamento fantástico e festivo da cultura latino americana vale-se dos signos originários da arte ameríndia

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