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http://profciriosimon.blogspot.com/2010/10/isto-nao-e-arte-01.html
RELIGIÃO não é ARTE.
“O artista é hoje em dia um estranho
reservatório de valores para-espirituais”.
Marcel Duchamp (1887-1968)
A expressão ARTE RELIGIOSA certamente é um equívoco, pois os seus termos confundem a compreensão das competências e dos limites tanto da ARTE como da RELIGIÃO. Nenhuma das duas pode aceitar esta confusão. O discurso melhora na referência à ARTE SACRA, pois atribui à ARTE a busca do seu tema no imaterial. Esta expressão estética não se confunde com a RELIGIÃO o seu imenso universo da FÉ, do SAGRADO, do TRANSCENDENTE e do ESPIRITUAL e nem os esgota.
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Fig. 01 – A RELIGIÃO do ESTADO - Pyongyang -COREIA do NORTE - monumento aos trabalhadores do partido [foice agricultores – pincel intelectuais - martelo urbanos] - SPIEGEL 16.06.2011
A criatura humana pode contrariar, frontal e radicalmente esta referência ao SAGRADO, ao TRANSCENDENTE e ao ESPIRITUAL. Ela pode chegar ao extremo de confessar o mais crasso materialismo, de aferrar-se aquilo que é empírico e tentar limitar-se ao absoluto “aqui e agora”. Contudo esta criatura não se contenta - na sua prática e nem age coerentemente - com este estreito limite na qual ela busca condicionar-se física e mentalmente. No extremo oposto, segundo Hannah Arendt (1907-1975), a criatura humana - ao aceitar a eternidade absoluta - situa-se em outra contradição. Esta aceitação a desorienta e a pode jogar, mental e fisicamente, no seu extremo, na negação de qualquer projeto pela inutilidade de qualquer esforço diante desta fatalidade do infinito imponderável que devora a tudo e a todos.
Fig. 02 – Os ÍDOLOS - Filippino LIPPI 1457-1503 - São Felipe exorciza no templo de Hirápolis – c. 1487-1502
A autêntica religião sempre buscou o nexo (religar) entre o extremo material (imanência) e imaterial (transcendência). Na busca desta conexão a RELIGIÃO concorreu ou conviveu com a ARTE. Muitas vezes as competências e os limites se confundiram. Em outras vezes os conflitos são intensos e parecem insuperáveis, pois muitas religiões proíbem, desaconselham ou inibem a confecção até de imagens de qualquer natureza para os seus cultos.
Fig. 03 – O ÍCONE BIZANTINO e JÓIAS – RELICÁRIO- Guardian - UK em 23.06.2011
Muitos tentaram fugir aos estreitos espaços criados pelos iconoclastas e ortodoxos de culturas de época e de locais restritos. O pensamento humano sempre teve papel importante nesta iluminação de espaços. Isto se não consegue remover estas armadilhas, prisões e ortodoxias, que separam as irmãs gêmeas da ARTE e da RELIGIÃO, e orientar no caminho de civilizações mais humanas, dignas e produtivas de valores positivos e universais.
Fig. 04 – A INFINITA VARIEDADE no MESMO CORREDOR com COLUNAS DIFERENTES no MOSTEIRO - ESTUPA de ANGKOR WAT.
Um dos artistas e teóricos de arte mais experientes e respeitados, como Marcel Duchamp (1887-1968) escreveu:
“O artista encontra-se face ao mundo fundado sobre o materialismo brutal no qual tudo é avaliado em função do BEM ESTAR MATERIAL e no qual a religião, depois de ter perdido muito espaço, não é mais a grande distribuidora dos valores espirituais.
O artista é hoje em dia um estranho reservatório de valores para-espirituais em oposição absoluta com o FUNCIONALISMO diário, pelo qual a Ciência recebe uma admiração cega. Digo cego, porque não creio mais na importância suprema destas soluções científicas que não atingem mais os problemas pessoais do ser humano.
Por exemplo, as viagens interplanetárias parecem ser um dos passos prioritários em direção um auto-denominado «progresso científico» e contudo estes passos nada mais são, em última análise, do que o alargamento do território colocado a disposição da criatura humana.
Não posso ser impedido de considerar isto como uma simples variante do atual MATERIALISMO que afasta o indivíduo, cada vez mais, da procura do seu EU interior”.
SANOULLET, Michel. DUCHAMP DU SIGNE réunis et présentés par Michel Sanouillet - Paris : Flammarrion, 1991, pp. 236-239
Esta busca do EU interior necessita retomar ao campo das forças da Filosofia onde é possível escutar as lições na “Ética a Nicômano” de ARISTÓTELES (384-322). Busca que necessita passar por cima dos tabus que encobrem Martin HEIDEGGER (1889-1976) e reler o seu texto “origem da obra de arte” e aprender, com ele, outros sentidos das palavras humanas gastas pelo tempo e pelo seu uso inadequado ou reducionista. Mais recentemente Jorge HABERMAS, (1929- ) recolocou e reequilibrou este vocabulário na sua obra “conhecimento e interesse”. |
Fig. 05 – ALGUMAS DISTINÇÕES entre ARTE e a ARTE SACRA.
Clique sobre o gráfico para ampliá-lo.
Derivamos para o campo da Semiótica com estes filósofos se interrogando sobre o sentidos e amplidão da palavra e da comunicação humana. Neste campo não podemos ignorar a obra “Semiótica” de Charles PEIRCE (1859-1914) e seus seguidores e entre eles o brasileiro PIGNATARI, Décio (1927- ) “Informação linguagem comunicação”. Chega-se ao 7º aforismo de Ludwig WITTGENSTEIN, (1889-1951) “o que não pode ser dito deve ser calado” do “Tractatus lógico-philosophicus” Ele já tangencia e se opõe a Fernand SAUSSURE ( 1857-1913). Este desafio filosófico deixa o campo aberto para o francês Pierre BOURDIEU (1930-2002) criar as suas obras como “Economia das trocas simbólicas”, “O poder simbólico” , “As regras da arte”, “Razões práticas” e tantas outras mais.
Fig. 06 – ARTE, RELIGIÃO e ÍDENTIDADE. A Estátua do Cristo Redentor no dia de sua inauguração em 12 de outubro de 1931.
Charles WRIGHT MILLS (1916-1962), na sua obra “a elite do poder”, denunciou os estreitos espaços na política norte-americana e situa-se entre tantos intelectuais que investigaram o campo teórico da política. Esta denúncia poderia ultrapassar as fronteiras políticas e ser universalizada para todos os lugares onde o poder necessita fluir. O poder existe tanto no campo de forças que se organizam ao redor da RELIGIÃO e como no campo de forças das ARTES. Ambos não ficam isentos dos processos e sistemas da circulação descritos em “microfísica do poder” pelo pensador francês Michel FOUCAULT (1926-1984)
http://br.olhares.com/interior_da_igreja_da_pampulha_foto1955093.html
Fig. 07 – MODERNIDADE e RELIGIÃO em CONFLITO. Interior da igreja São Francisco da Pampulha Belo Horizonte Minas Gerais por muito tempo não reconhecida pela Igreja Católica.
Com este pequeno arsenal teórico abrem-se também o campo da Estética. Nela pode-se seguir nas pegadas deixadas por Alexander Gottlieb Buamgartner(1714-1762) e Denis Diderot (1713-1784). Criticados e consolidados com obras de Imannuel Kant (1724-1804) e Jorge Guilherme Frederico Hegel (1770-1831). Neste ambiente emergiu Friedrich SCHILLER, (1759-1805) que conferiu um cunho didático na sua obra “sobre a Educação Estética”, na forma de cartas (1791-1793), destinadas ao príncipe Friedrich Christian von Schleswig-Holstein-Sonderburg-Augustenburg de Copenhagen.
Foto de Círio SIMON - 2007
Fig. 08 – O QUOTIDIANO e o SAGRADO. A Catedral de Brasília inserida no quotidiano da vida das pessoas e no cenário administrativo da Esplanada dos Ministérios de Brasília
O século XX traduziu estas preocupações com a arte do seu tempo da parte do economista, advogado e artista Wassili KANDISNKY, (1866-1944) ao elaborar o texto “do espiritual na arte”. Obra que resultou dos seus próprios experimentos estéticos. Estas preocupações foram compartilhadas com o pintor e músico Paul KLEE (1879-1940) que escreveu “La pensée créatice”. Motivou também a ascese demonstrada na pintura dos quadros de Piet MONDRIAN (1872-1944) além dos seus textos na revista De STIJL (1917-1928) ou aquelas do já citado Marcel Duchamp. Este pensamento relativo à ARTE foi remetido ao campo de reflexão e sistematizado por Heinrich WÖLFFLIN, (1864-1945) na obra “conceitos fundamentais da História da Arte” e por Wilhelm WORRINGER, (1881-1965) em “abstração e natureza”. Na Itália Giulio Carlo ARGAN (1909-1992), prefeito de Roma seguiu a linha marxista ao escrever “História da arte como história da cidade” . Argan confere ao artista a distinção da Natureza por meio do seu projeto. Com este projeto ele tornar-se histórico na medida em que conhece e sabe criticar os propósitos de suas obras quando acerta e quando erra. Esta capacidade crítica do artista elimina também aquele juízo elementar, reducionista e imponderável do “gostei” ou “não gostei”. Ele necessita responder ao “por quê?” deste juízo.
http://www.youtube.com/watch?v=EIEmSl42vs8 + http://pt.todoroms.com/simon-del-desierto-luis-bunuel-1965-dvdrip-espanol-mu
+ http://www.youtube.com/watch?v=r5fil1yGKnk&feature=related
Fig. 09 – O CONFLITO entre SAGRADO e PROFANO– Simão o Estilita (1965) Luis Buñuel - O eremita busca o SAGRADO no deserto e em cima de uma coluna da qual é arrebatado por um avião é levando para o PROFANO numa boite de Nova York .
Marc Leopold Benjamin BLOCH, (1866-1944), ajudou a renovar a reflexão sobre a civilização, como um todo, no campo da História. O seu pensamento foi resumido “Introdução à História”, escrito numa hora de grandes dúvidas e pouco antes de ser fuzilado pelos nazistas. Diante das radicais mudanças - provocadas na passagem da era industrial para a era da informação - a obra de Paul Ricœur (1931-2005) pode fluir entre as imensas dúvidas.
Foto de Círio SIMON - 2010
Fig. 10 – O SAGRADO no ESPAÇO MONUMENTAL de BRASÌLIA.
Os intelectuais e os teóricos das diversas teologias das religiões constituem um rico acervo. Suas contribuições, mentalidades e os seus nomes foram excluídos da Enciclopédia Iluminista e as suas concepções desvinculadas das políticas ocidentais. No entanto continuam a ter conexões em diversos regimes que se apóiam subliminarmente nas suas concepções, como a islâmica, israelita, ou ortodoxa.
Foto de Círio SIMON - 2010
Fig. 11 – O SAGRADO e a LUZ TROPICAL no interior da catedral de Brasília.
A atual dificuldade da interlocução entre a RELIGIÃO e a ARTE foi reconhecida pelo Vaticano por meio da autoridade do seu Presidente do Conselho Pontifício para a Cultura. O Cardeal Gianfranco Ravasi, ao apresentar o projeto da exposição de 60 artistas, intitulada: "o esplendor da verdade, a beleza da caridade" , a ser aberta no dia 4 de Julho de 2011, observou que os caminhos percorridos pela ARTE e pela FÉ encontram-se, hoje, cada vez mais distantes.
"Os dois caminhos separaram-se. A teologia e a liturgia seguiram outras trajetórias quando devíamos introduzir nos seus espaços o tema estético.[...]
O diálogo entre arte e fé é necessário, dado o parentesco existente entre essas duas diferentes expressões do espírito humano, que embora seguindo caminhos diferentes, tendem ambas ao eterno e infinito. E é por isso que é significativo que também a arte contemporânea, continue a repetir o desejo de poder, ainda, percorrer esses caminhos da altura do transcendente, do mistério."
http://noticiarama.blogspot.com/2011/06/catedral-de-bh-e-ultima-obra-de.html
Fig. 12 – O ESPLENDOR da VERDADE. Projeto de Oscar Niemeyer para a Catedral de Belo Horizonte e uma das o 60 obras da exposição “O esplendor da verdade, a beleza da caridade".
Do lado da ARTE as mais diversas mentalidades materialistas continuam a colaborar e dar forma aos templos e monumentos religiosos. Assim Oscar Niemeyer, apesar de suas confessa conexão como o comunismo, consta na lista dos 60 artistas da exposição intitulada: "o esplendor da verdade, a beleza da caridade" e promovida pelo Vaticano, em 2011. Este artista é responsável por obras sacras que são verdadeiros ícones da modernidade mundial.
Os caminhos do artista e do teólogo não são fáceis diante deste imenso acervo que compete a cada um dos dois. Certamente as maiores dificuldades se originam de conceitos fixos e reducionistas provenientes de correntes conceituais e estéticas mal assimiladas e incoerentes como o seu tempo e lugar.
Se as conexões entre a RELIGIÃO com a ARTE são múltiplas, variadas e renovadas em cada geração, não é possível deixar de distinguir os seus respectivos campos de forças, até para não neutralizar estas energias. O desgaste vocabular, a sobreposição indevida e reducionismo eclético desta relação, põem em perigo a competência e os limites de ambas.
Fig. 13 – O SAGRADO MANIFESTO - TAPETE CORPUS CHRISTI - Flores da Cunha-RS-
in ZH 23.06.2011.
Assim não existe alternativa coerente do que a honesta afirmação de que “RELIGIÃO não é ARTE”. Afirmação que não significa que a RELIGIÃO é o passaporte e o embarque definitivo para a eternidade absoluta e para a inutilidade de qualquer compromisso com o mundo empírico dado. Ou que a ARTE seja a renúncia, a anarquia ou a soberania em relação a qualquer projeto transcendente e ignorância dos fins últimos das ações humanas. Aqui também a virtude não está no meio termo e nem no refúgio no ecletismo.
Fontes bibliográficas referenciados neste texto.
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ARGAN, Giulio Carlo (1909-1992). História da arte como história da cidade.São Paulo: Martins Fontes. 1992.
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Fontes numéricas digitais atinentes ao tema
CORBUSIER
ICOMOS – UNESCO - ARTE SACRA
75% das obras de arte do Patrimônio com vínculos como transcendente
http://whc.unesco.org/fr/list/
http://www.international.icomos.org/home_fra.htm
Apresentada a exposição "O esplendor da verdade,a beleza da caridade" (18/6/2011)
http://www.radiovaticana.org/por/articolo.asp?c=497270 Radio Vaticano notícia18/06/2011 14.05. 33
http://noticias.cancaonova.com/noticia.php?id=282202 CARTAZ – OBRAS e nomes
http://www.radiovaticana.org/por/articolo.asp?c=494306 em Portugal
ARTE
http://acantiza.blogspot.com/2009_11_01_archive.html
OSCAR NIEMEYER e a nova CATEDRAL de BELO HORIZONTE
http://noticiarama.blogspot.com/2011/06/catedral-de-bh-e-ultima-obra-de.html
http://www.domtotal.com/noticias/detalhes.php?notId=336901
http://br.olhares.com/interior_da_igreja_da_pampulha_foto1955093.html Pampulha interior
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