ICONOGRAFIA de OBRAS das ARTES VISUAIS MISSIONEIRAS.
CONTINUAÇÂO e COMPLEMENTO de 02 -o projeto
civilizatório jesuítico no Rio Grande do
Sul
12 - Uma obra de arte dos Sete Povos das Missões
Jesuíticas como metáfora dos valores culturais da Contrarreforma.
12.1 – Uma obra
de arte dos Sete Povos das Missões. 12.2 -
Por que uma estátua dos santos brasileiros é tão feia?. 12.3 - A obra de arte como Propaganda da Fé
concebida pelo Concílio de Trento e como identidade da Contrarreforma. 12.4 – A
verdade do meio geográfico local.. 12.5 – O templo como lugar de um teatro.
12.6 O projeto estético e político daqueles que destruíram o projeto
missioneiro. 12.7 – A verdade do meio social indígena face ao jesuíta. 12.8 – O
projeto iluminista queima o projeto jesuítico missioneiro. 12.9 – As
dificuldades da permanência do sentido iconológico do projeto jesuítico missioneiro. 12.10 - A diacronia e sincronia do projeto
jesuítico missioneiro. 12.11 – Tentativas de institucionalizara a memória do
projeto jesuítico missioneiro
Fig. 01 – O projeto estético da CONTRARREFORMA e em ESPECIAL a PROPAGANDA da FÉ
mantido e impulsionado pela COMPANHIA de JESUS buscavam no meio estético
índices que atingissem e condicionassem os SENTIDOS HUMANOS em todas as suas
dimensões. Nestas dimensões o repertório sensorial deveria atingir todo o
ser humano desde o seu nascimento até a morte, desde o mais limitado até o mais
amplo e erudito
12.1 Uma obra de arte dos Sete Povos das Missões.
A imagem
proveniente das Missões Jesuíticas não foge de uma posição da crítica das
suas desproporções e rusticidade, por mais especular que seja. A imagem isolada de São Miguel Arcanjo
ilustra bem estas desproporções e rusticidade, apesar de toda a sua cor. As
esculturas provindas das Missões jesuíticas estiveram abandonadas e jogadas em
depósitos durante um século inteiro. Foram usadas nas fazendas inclusive para
cochos para alimentar o gado, devido ao fato de serem cascas ocas.
São Miguel -115 cm – Museu IAP Unisinos São Leopoldo- RS
Fig. 02 – Os “SANTOS de ROCA” eram esculturas do projeto estético da CONTRARREFORMA e da PROPAGANDA
da FÉ nas quais eram esculpidas as mãos, a cabeça e pernas. O corpo era
fingido e coberto de panejamentos adequados à época e à solenidade nas quais
eram exibidas ao público dos fieis
12.2- Por que uma estátua dos santos brasileiros é
tão feia?
Uma pergunta
sábia e honesta do professor Yasuhiho Shimizu[1]
salva estas obras da desqualificação e esclarece o seu sentido. Ele perguntou, ao autor deste texto, "por
que uma estátua de um santo brasileiro é tão feia?". Esta pergunta
honesta permite abrir um vasto panorama no qual se inscrevem os santos
missioneiros e o projeto civilizatório do qual elas se originaram. Estas obras são frutos de um projeto
civilizatório passado, relativamente recente e muito pouco estudo. Por essa
falta de estudos sistemáticos, sustentados por instituições, não é simples de
responder a esse professor nipo-brasileiro. Toda a explicação não responde
muito se fixarmos a nossa resposta apenas na materialidade da obra, nas
técnicas usadas e no contexto institucional na qual ela se encontra nos dias
atuais. A resposta ao professor Shimizu começa a surgir e a tomar sentido
quando pudermos voltar ao projeto político e cultural do qual ele resulta. O
Japão se fechou sobre si mesmo quando os jesuítas e o seu projeto da
Contra-Reforma bateram as portas do
Império do Sol Nascente. Ao professor Shimizu[2]
cabe todo o direito perguntar. A nós, depositários do projeto
missioneiro-jesuítico, tratemos de responder a altura: - "por que os santos brasileiros são tão feios?".
A resposta ganha
sentido se lembramos que América Latina foi um laboratório e um palco
construído para o projeto civilizatório
da Contrarreforma. Um laboratório para o ensaio da posse física do Novo Mundo.
A Espanha e Portugal, cercavam estas posses com fortalezas[3]
entre os quais moviam-se os seus exércitos e os galeões armados.
[1] - Yasuhiho Shimizu era professor e um dos
administradores da FEEVALE de Novo Hamburgo quando o autor lecionava ali, na
década 1970, no curso de Artes Visuais a
disciplina de História da Arte.
[3] - Para quem tiver paciência
é interessante observar e contar o número e tipo das fortalezas que guarneciam
a entrada e o interior da Bahia de Todos os Santos.
MISSÕES JESUÍTICAS do RS -- anjo
Fig. 03 – A PROPAGANDA da FÉ, a CONTRARREFORMA e o BARROCO insistiam no dinamismo da linha diagonal em contraposição ao
RENASCIMENTO. Este se caracterizam mais elo equilíbrio das linhas
horizontais com as vertical no centro da composiç~ao n forma de uma balança de
dois pratos equilibrados nos extremos da composição.
12.3 A obra de
arte como Propaganda da Fé concebida pelo Concílio de Trento e como identidade
da Contrarreforma.
A Propaganda da
Fé construiu um palco para a subjugar subliminar e espiritualmente os indígenas, que se moviam, no interior dessas
fronteiras, e manter os escravos produzindo para as coroas Ibéricas. Sob a
ameaça da Santa Inquisição todas as manifestações artísticas tiveram de se
submeter a esse projeto político e econômico. Ao inverter o problema, pode-se generalizar que uma obra
de arte, originário desse projeto, é portadora dos valores deste condicionamento
imposto pelo projeto político de posse desta terra.
O projeto da Contrarreforma
do Concílio de Trento foi levado avante pelos jesuítas que foram os seus
mentores mais audaciosos e competentes. A sua Companhia de Jesus foi criada
especificamente para seguir os textos da
Propaganda da Fé. Um projeto civilizatório jesuítico espanhol cobriu
grande parte do atual território do Rio Grande do Sul e cuja totalidade
abrangia as terras do atual Brasil, Argentina e Paraguai. No Rio Grande do Sul
este projeto é conhecido como os "Sete
Povos" das Missões
As obras de
Arte, nascidas nesses Sete Povos testemunham, em primeiríssimo lugar, a verdade do projeto civilizatório
missioneiro jesuítico, nas suas formas e no seu conteúdo. Nestas obras de arte
dos Sete Povos o pensamento seguiu a catecismo da Contrarreforma. Contudo os
materiais que o meio local entrópico oferecia nas savanas e na floresta semitropical
constituíram o imponderável e o dialético aos textos da Contra Reforma, e o que
gera a sua originalidade das obras. Os
padres, os irmãos leigos e os índios por mais coerentes e impositivos que
fossem não puderam fugir, de um lado, ao catecismo e do outro ao apelo da
natureza e da floresta e que elas não chegaram a dominar em toda a extensão.
MISSÕES JESUÍTICAS do RS -
Escultura em madeira com sinais de rachadura
Fig. 04 – O uso de madeiras tropicais, com
abundante seiva, exigia a escavação do interior destes troncos das árvores. Sem
esta escavação do seu interior, as peças
rachavam como nesta imagem Estas
esculturas ocas geraram especulações. Uma delas é seu uso para peças
cênicas nas quais se colocava crianças para dizer falsa em nome dos santos.
Outra é o SANTO de PAU OCO para esconder tesouros. Após a destruição das missões serviam de
cochos para ministrar sal para os animais
12.4 A verdade
do meio geográfico local.
Os vales dos
rios Uruguai e Paraná e a mesopotâmia formada por esses afluentes do Rio da
Prata condicionam o meio geográfico, no qual se desenvolveram as missões
jesuíticas. A madeira e a pedra,
encontradas na região, impuseram a sua
lógica na sua natureza formal. As
estátuas denominadas “santos de pau oco"
testemunham a natureza e a força vegetativa das árvores tropicais cuja
madeira era usada na sua confecção. Devido à abundante seiva das árvores eram
tornadas ocas. Este oco servia para que nas cerimônias religiosas fossem
sonorizadas por vozes infantis de crianças colocadas no seu interior. A leveza
desta estátuas ocas permitia que fossem carregadas com mais facilidade nas
procissões. Fora do sentido religioso original,
escondiam tesouros ou até eram usadas como coxos para servir alimento ao
gado. Por tudo isto a verdade da obra da arte visual, nascida nesse projeto da Contrarreforma
jesuítica, deve ser buscada e ser
descoberta dialeticamente entre o projeto político e os meios técnicos e
físicos da região. As técnicas e os
instrumentos da sua elaboração são contribuições do jesuíta do período
pós-renascentista europeu. Nelas encontram-se poucos traços da técnica do
período neolítico indígena. Mesmo a cerâmica indígena não sobreviveu nesse
contato.
Fig. 05 – O cenário do SETE POVOS das MISSÔES da COMPANHIA de JESUS
impressiona os SENTIDOS HUMANOS. A PROPAGANDA da FÉ se fixava e se
materializava nos prédios dos
templos Estes prédios possuem dimensões e eram o lugar para o repertório
sensorial que deveria atingir todo o ser humano desde o seu nascimento até a
morte, desde o mais limitado até o mais amplo e erudito
12.5 O templo
como lugar de um teatro.
A Contrarreforma
transformava os templos católicos em teatros. Num teatro um elemento, de um
cenário, não pode tirar a atenção da ação principal da Propaganda da Fé. Os
visitantes mergulhavam em salas escuras contrastando com a excessiva luz
tropical externa. Pequenas janelas, colocadas no alto desses tempos, coavam a
luz em direção de certos nichos onde estavam estas estátuas. Havia poucos
lugares para o público, pois a maioria dos fiéis desempenhava um papel
combinado previamente de um ator de “auto
de fé”. O objetivo deste “auto de fé”.
era comover os sentidos e levar o fiel à
transcendência, não permitindo destacar e dar ênfase a uma estátua ou uma
pintura específica e isolada. No projeto jesuítico as estátuas eram elaboradas
para atingirem todos os sentidos humanos. O tato era estimulado por meio dos
tecidos nas suas formas tridimensionais, (santos de roca). as percepções da
textura, do volume. A visão, pelas estátuas pintadas criando a imponderável
linguagem das core e das formas. A audição pelas falas dos atores infantis
colocados no seu interior oco respondendo à música e dos textos sagrados. O
perfume as impregnava com o incenso
dando sentido olfato. Para o paladar
criavam ambiente para a degustação do
pão e do vinho. A cinestesia encontrava
sentido nas procissões nas quais eram carregadas.
Estas estátuas
colocadas num museu, perdem, no seu isolamento, todo o sentido do contexto
original. Enquanto nas Missões eram índices significativos para todos os
sentidos, arrancadas do seu contexto original e isoladas no museu, permitem dar
razão ao professor Shimizu para quem esses "santos brasileiros são feios". Cada estátua missioneira supre
as informações que agora faltam e torna-se indispensável para desvendar o
projeto do qual ela se origina.
Invertendo o
problema, pode-se afirmar que cada estátua missioneira constitui índice do todo
deste conjunto, pelo fato de constituir uma peça inerente e indispensável deste
cenário. As informações que ela fornece, como um fractal do todo, permitem
reconstruir o todo que hoje falta. Na leitura estilística dos seus detalhes estão presentes as proporções, as
relações das suas partes entre si, a unidade na diversidade daquilo que é
destinado ao tato, ao olhar, aos ouvidos ao contexto do paladar, do olfato e do
cinetismo no qual se moviam. Nenhum detalhe pode ser desprezado nos seus
elementos múltiplos. Estes detalhes cobrem todas as superfícies disponíveis
destas estatuas. No conjunto do projeto estético é perceptível o "horror ao vazio" que de sua origem.
Neste “horror ao vazio” e na
redundância dos elementos barroco-helenísticos é possível contratá-las
frontalmente com os arquétipos e os vazios da obras dos indígenas. Este
conjunto era destinado a “embasbacar o
bugre”. Uma estátua destas era uma peça convincente da “Propaganda da Fé”. Ela não deixava
margem a qualquer dúvida sobre a superioridade da mensagem que estavam
recebendo de uma cultura que tinha o projeto de impor-lhes a sua hegemonia
espiritual, política e técnica.
A maioria destas
estátuas tinha dimensões
avantajadas. Estas dimensões eram determinas por sua finalidade e as condições
para as quais se destinavam. A maioria delas era criada para espaços públicos
monumentais. Devido às suas dimensões avantajadas poucas estátuas missioneiras
passaram ao uso doméstico depois que o projeto missioneiro terminou. Pode-se
afirmar que as suas dimensões as tornaram peças típicas de museus ou raramente
foram transferidas para igrejas subordinadas a outro projeto civilizatório. O
projeto iluminista subsequente preferia
as pequenas estátuas elaboradas na metrópole, que eram mais sofisticadas e de
dimensões domésticas.
O abandono e as ruinas de um desenho (1846) de Demersay_-_Redução de São Miguel Arcanjo
Fig. 06 – A destruição e a obsolescência das construções dos SETE POVOS das
MISSÔES JESUÍTICAS precederam em dois séculos as RUINAS da ERA INDUSTRIAL. Assim
estas ruinas anteciparam a ERA INDUSTRIAL o RIO GRANDE do SUL ostentou
portentosas ruinas de projeto estético
da CONTRARREFORMA e mantido e impulsionado pela COMPANHIA de JESUS. Todos os
paradigmas são íntegros e integrais.
Nestes campos do Rio Grande do Sul se defrontaram os paradigmas a PROPAGANDA da FÉ e do ILUMINISMO e se
destruíram reciprocamente.
12.6 O projeto
estético e político daqueles que destruíram o projeto missioneiro.
O projeto que
veio destruir as Missões não lhes deu grande atenção e muito poucos socorros na
sua manutenção. A entropia natural também fez o seu serviço do retorna à
natureza, pois os ambientes arquitetônicos
foram invadidos pela floresta original. Na passagem para um outro
projeto, que lhe era contrário, perdeu-se
a maioria das pinturas e desenhos. Salvaram-se alguns relevos em pedra. As
obras tridimensionais tiveram melhor
sorte na sua conservação, pois eram mais numerosas e mais impactantes.
A fronteira luso-espanhola isolou conjunto em
zonas das Missões em áreas geográficas
opostas pela guerra. Já não fazia mais sentido uma rede de comunicação visual
entre as cidades criada pelo urbanismo das Missões. As casas, sob cujos
telheiros evoluía a vidas dos clãs, viraram taperas mal assombradas, até
desaparecerem sem deixar vestígio, como as tabas abandonadas e visitadas
esporadicamente por tribos errantes. As praças centrais do interior de cada
cidade, nas quais pulsava toda a vida
urbana, passaram a campos de pastagens.
Santo INÁCIO - -200 cm da altura Museu IAP Unissinos
Fig. 07 – O abundante uso da madeira nas esculturas missioneiras era o
aproveitamento da abundante matéria prima oferecida pelas florestas. Seguia
a tendência geral do barroco latino-americano e permitia as intervenções das
tintas e pigmentos da pintura e das “encarnações”
12.7 A verdade
do meio social indígena face ao jesuíta.
O jesuíta
desestimulava o xamanismo na mesma intensidade com que estimulava o caciquismo.
Na “Propaganda da Fé” a arte deveria
fazer frente ao mundo xamanístico. Foi por meio de todas as artes que o projeto
civilizatório, implantado pela erudição
jesuítica, transformou o antigo espaço
imaterial, dominado pelos xamãs, em espaço de rituais religiosos, sob o seu
controle. A imagem do São Miguel, aqui reproduzido, era evidentemente muito
mais elaborado e sensível do que os toscos e primitivos totens cultuados pelos
xamãs.
O primitivo
caciquismo dos guaranis foi estimulado na medida em que essas lideranças se
submetiam aos jesuítas. Assim o mando direto das casas coletivas continuava nas
mãos dos antigos caciques. .A submissão destas lideranças era recompensada com
uma educação mais refinada para as linhagens destes chefes.
A submissão dos
caciques ao jesuíta era explicada pelas necessidades e pelas ameaças concretas, que se perfilavam
diante de suas frágeis construções indígenas, sem portas e sem defesas de
muralhas. Esta submissão e o fervoroso trabalho indígena comum, em outras
ocasiões avesso a qualquer esforço
físico, tinha uma dupla razão prática. O
medo pelos “comanderos” e ‘bandeirantes” lusos foi cultivado pelo
projeto jesuítico no ambiente do ritualismo indígena, mas sem prepará-lo para
enfrentar e esconjurar este risco
externo, por si mesmo, por um projeto de
autonomia eficaz.
Fig. 08 – Outra imagem característica do BARROCO insistiam no dinamismo da linha diagonal na composição. Além
disto, a PROPAGANDA da FÉ e da CONTRARREFORMA e insistiam em preencher
todo espaço da composição.dos sentidos humanos num verdadeiro “HORROR ao VAZIO”
12.8 O projeto
iluminista queima o projeto jesuítico missioneiro.
Os pressupostos
do projeto da Propaganda da Fé e da Contra Reforma foram desafiados
frontalmente pelo projeto civilizatório iluminista, conduzido pelos Déspotas
Esclarecidos. O Iluminismo, ao vencer o projeto missioneiro nos campos de
batalha, não só relegou ao olvido os estudos das obras dos jesuítas, mas
riscou do mapa este conhecimento. O Iluminismo contrapôs o seu próprio espaço
conceitual, por meio da Enciclopédia onde eliminou qualquer referência á religião,
igrejas e dogmas, à Propaganda da Fé e à Contra Reforma. Com o triunfo da
Revolução Francesa, da nova era industrial e do enciclopedismo, os projetos
estéticos resultantes do projeto civilizatório jesuítico caíram, não só no
completo olvido, mas foram vistos como anacrônicos e sem sentido.
O projeto
jesuítico missioneiro começou a merecer outros olhares quando novas correntes e
ideologias, apontavam para projetos civilizatórios nos quais havia espaço e
sentido para o coletivismo, estimulado pela propaganda e hierarquias
consensuais em contratos de um bem comum. O próprio nacionalismo, que surgiu em
todos os povos na primeira metade do século XX, fez vingar novamente um projeto
coletivo de um povo dando sentido à arte da propaganda que as missões jesuíticas
praticavam. Tanto estas Missões como ao nacionalismo do século XX, faziam
propaganda do espetáculo coletivo, do uso de uma férrea ideologia, tendo como
alvos patrimônio e identidade comum. A ambos é imanente a massiva da
propaganda, os limites territoriais do coletivo defendidos até o fim e a
esperança de que nesta propaganda e neste coletivismo está a salvação.
Fig. 09– O resultado da “encarnação” numa escultura em madeira. A “torêutica” refinada trazida pelos
mestres vindos do Tirol, da Alemanha e da Espanha era facilmente assimilada no
seu aspecto técnico pelo indígena. Porém estava longe da interação destas
criaturas recém-saídas da época da Pré-História e sem acesso ao mundo imaterial
ao mundo dos seus mestres .Este abismo devorou este saber técnico indígena e a
imediata ruptura quando desapareceu o PODER do JESUITA.
12.9 As
dificuldades da permanência do sentido iconológico do projeto jesuítico missioneiro.
Por esta razão a
leitura iconológica destas obras,
apesar do fracasso desta propaganda, do coletivismo e da esperança frustrada
diante do Iluminismo, é extremamente rica e fecunda até os dias atuais.
Esta leitura iconológica é uma rica oportunidade de vencer o tabu desta
derrota e transformá-la no totem. Este totem ganhou todo o seu sentido na
cultura do consumismo de massa que é alimentado elaborado pela propaganda,
marketing ou pelos organizadores de eventos fugazes. Shoppings, supermercados
aproveitam integralmente as suas lições. No centro destas lições está a imagem,
a estátua e o condicionamento de sua leitura. As imagens jesuíticas das Missões
estavam presas ao seu repertório religioso. As imagens dos heróis vivem num
ideal religioso de um passado remoto e mítico que busca a perfeição e a
renúncia. Os retratos dos agentes imediatos estão subsumidos na vida coletiva e
não possuem o menor sentido. Não há vestígios de sincretismo religioso entre o
indígena e o jesuíta, como aquele sincretismo religioso vigente entre os
africanos que transcreveram o seu panteão religioso para o panteão católico.
Contudo isto não
significa que as resistências indígenas foram vencidas. Uma vez desfeito o
projeto político e econômico do jesuíta, o indígena silenciou o projeto das
Missões, pois não o tinha subsumido este repertório na sua cultura e o sentido
desta iconologia sacra. O projeto do Iluminismo queimou o projeto político e
econômico do jesuíta, como o indígena fazia nas suas “coivaras” na queima da floresta para iniciar uma nova cultura.
As obras das
artes visuais dos missioneiros pertencem a uma série avançada do artesanato. A série cultural missioneira incorporou
as possibilidades de escolhas das
tipologias estéticas oferecidas pelo Maneirismo. Esta linhagem Maneirista
provinha do Renascimento Italiano. Esta por sua vez havia dado oportunidade para
todas descobertas das guildas medievais européias. Os cantuários mostraram a
origem na península ibérica das Missões quando transferiram para as margens
dos rios Uruguai e Paraná os seus saberes no manuseio das pedras.
Fig. 10 – O século de duração do projeto
estético da CONTRARREFORMA, da PROPAGANDA da FÉ e pela COMPANHIA de JESUS no
Rio Grande do Sul não tinha antecedentes locais locais e nem teve continuidade .
O isolamento permitiu construir um mundo paralelo e que não se atualizou e nem
buscou uma interação ampla especialmente
com paradigmas concorrentes. Era o “GRUPO de DENTRO” em confronto com o “GRUPO
de FORA”. Qualquer vacilo individual ou coletivo era tratado como TRAIÇÂO ao “GRUPO de DENTRO”. e vice versa.
[Clique sobre o gráfico para ler]
12.10- A
diacronia e sincronia do projeto jesuítico missioneiro
O projeto jesuítico teve várias tentativas para a sua instalação
e das quais não ficaram vestígios nas artes visuais. Numa leitura diacronia entre os anos de 1628 até
1756 as obras visuais das Missões jesuíticas evoluem no interior se um grupo
fechado e do qual poucos tinham a chave e conhecimento do todo. Este projeto
hermético foi truncado em pleno apogeu e expansão pela política no Tratado de
Madrid em 1750. Os vestígios nas artes
visuais, que possuímos hoje, procedem de data imediatamente anterior a esta
época, mas sem uma datação precisa. A decadência foi imediata diante de outro
projeto político, mais poderoso, que o derrotou nos campos de batalha. Após a
expulsão dos mentores do projeto jesuítico entrou em lenta e prolongada agonia
nada mais se produziu. A efetiva incorporação do seu território ao Brasil só se
deu em 1810 quando a Argentina ensaiava a sua independência da Espanha
É necessário
traçar a sincronia da série cultural
que se desenvolveu paralelamente ao projeto missioneiro em outras séries.
Devido ao rígido esquema ideológico que comandava o projeto jesuítico as
sincronias de influências são diretas e determinantes. Estas influências
diretas eram aquelas que assimilaram de Roma que estava mergulhada na Contrarreforma
em todos os seus desdobramentos. O projeto jesuítico luso e o projeto jesuítico
espanhol contemporâneo na América do Sul trocaram poucas experiências estéticas
diretamente entre si. Esta impossibilidade de dialogar e fazer circular os seus
bens simbólicos e materiais entre outros projetos civilizatórios sincrônicos
pode ser um dos seus erros fatais. O projeto jesuítico das Missões gerou
simplesmente um “grupo de dentro” sem
contatos com outro “grupo de fora”. Assim, existe apenas uma sincronia formal e
externa no qual o projeto jesuítico era visto como maléfico pelo “grupo de fora”. A mediação de Roma
filtrava o Maneirismo e o Barroco europeu contemporâneo. A oposição cerrada à
Reforma luterana constituía outro “grupo
de fora” como antes dele havia sido o islamismo para a cultura católica
ibérica. No interior dos dois reinos Ibéricos, houve consenso em relação ao
projeto jesuítico entre as suas coroas
reais, apenas para destruir este projeto.
O papa era um mediador constante entre esses dois reinos em conflitos
permanentes.
Fig. 11 – Algumas peças que o ESTADO BRASILEIRO conseguiu identificar e salvar
num museu planejado sob a supervisão de Lúcio Costa em 1937 nos primórdios da
SERVIÇO da PATRIMÔNIO ARTÌSTICA (IPHAN) . Com o reconhecimento da UNESCO
estas peças começaram a ser consideradas também com bens simbólicos da
humanidade
12.11 Tentativas
de institucionalizara a memória do projeto jesuítico missioneiro
O projeto
iluminista, associado à cultura açoriana de dimensões humanas e domésticas, se
contrapôs frontalmente aos projetos ideológicos emocionais e públicos da
Propaganda da Fé comandados pelos jesuítas sem família. O projeto iluminista
preferiu a construção de um estado
controlado por leis comandas pela Razão e pela lógica dos parentescos. Os
açorianos se refugiavam em pequenas casas unifamiliares e seu culto era
praticado em pequenas e escuras capelas e igrejas domésticas. Diante disto, as
obras de arte das Missões, exerceram poucas
influências na elaboração de obras de arte sul-rio-grandenses, provenientes
de outros paradigmas estéticos.
O obscurecimento, intencional ou involuntário do projeto jesuítico , gerou, de um lado, o mito das Missões e do outro a necessidade de decodificar e retornar aos índices logísticos das fontes dos documentos do seu estudo. O movimento modernista entendeu a dialética de que só poderia lançar rumo a um futuro, se buscasse a sua legitimidade nos valores e nas contradições do passado nacional, por mais imponderáveis que fossem. Não se tratava de forjar um passado esplendoroso, mitificado e de fácil consumo popular. Esta valorização não constituía um gesto individual de um dos seus membros, mas a coerente ação de um Estado Nacional que se lançava em mais um projeto civilizatório. Um destes projetos foi aquele que criou, em 1937, o Instituto do Patrimônio e Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). O IPHAN criou uma política de estudo, de institucionalização e salvaguarda deste patrimônio nacional além de cargos para técnicos e recursos do erário público[1]
As Missões foram objeto de um estudo da Revista SPHAN, nº 04 - 1940 - MISSÕES - pp.55 até 81[1].
Apesar destes
esforços individuais e coletivos as obras de arte missioneiras continuam
dispersas e os seus documentos numa diáspora da qual não se consegue unidade e
coerência. O arquivo institucional e central dessa rede de estudos do projeto e
das obras missioneiras jesuíticas, ainda está no horizonte de um vir-a-ser. Este
arquivo não encontrou uma sólida rede institucional e um lugar no qual é possível um estudo sistematizado.
A história
sul-rio-grandense constitui uma disciplina escolar recente[2]. Os
estudos da história da política e da economia do estado do Rio Grande do Sul
foram colocados em primeiro plano pelos estudiosos desta disciplina recente. A
história cultural só acidentalmente é objeto das suas preocupações e se essa
história cultural. Ao se tratar de uma história cultural, os seus limites não
ultrapassam, em geral, a história da Literatura.
[1] - O estado brasileiro, ao
criar cargos e salários para estes postos, ainda está na lógica pombalina
portuguesa e na forma da administração militar com as suas patentes e os
respectivos soldos que eram as únicas fontes investidas nesses projetos. O
resultado natural, dessa política, foi a concentração dos detentores desses
cargos na corte ou na capital federal onde havia um mínimo de condições para o
exercício de suas funções. Nos locais mais afastados da corte ou da capital
todas as iniciativas e financiamentos corriam pela conta do salário do detentor
do cargo. Nas províncias imperiais e nos estados republicanos brasileiros, o serviço do patrimônio não
escaparam dessa lógica administrativa. A administração da educação pública
brasileira e o seu magistério dependem
ainda do projeto pombalino.
[2] - O fundador da disciplina
da História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o estudioso Dante
Laytano repetia, na década de 1980, que ao procurar o Reitor dessa Universidade
na década de 1940, para propor a criação da cadeira do Rio Grande do Sul, esse
reitor lhe perguntou se havia matéria suficiente para tal disciplina.
CADERNO de
LITERATURA . Porto Alegre : AJURIS Ano VII . nº 11, nov. 2003, p. 13
Fig. 13 – Ao longo dos dois séculos que decorreram entre a destruição das Missões
(1755) até as iniciativas do IPHAN estas peças estiveram ao cuidado de
particulares, colecionistas e contrabandistas que as colocavam no Mercado de
Arte sem as descrições fidedignas de sua origem, função inicial Assim
torna-se quase impossível a reversão aos seus autores, funções e sentido de
origem
O Museu de Arte
do Rio Grande do Sul (MARGS) não possui um acervo de obras de artes visuais
missioneiras. Este vazio é significativo na medida em que, neste espaço público
sul-rio-grandense, outros projetos civilizatórios estranhos impõem a sua lógica
de dominação. O conflito entre os projetos políticos e os estéticos estranhos e
concorrentes com a estética missioneira desequilibrou o espaço da presença
física as obras jesuíticas. Mas não só isto, pois não houve nenhuma fonte que destinasse recursos
significativos ao estudo e a institucionalização do projeto jesuítico
missioneiro. Tão pouco houve o incentivo de uma massa crítica qualificada e
específica para a sua pesquisa, ao ensino e a extensão para outras atividades
culturais como aquele do “Caminho das
Missões” ainda embrionário, com poucas legitimações e suportes conceituais,
logísticos e investimentos proporcionais.
De outra parte
as leituras, interpretações e as narrativas, que possuem como objeto estas
manifestações artísticas, dependem do repertório de quem se aventura nestes
caminhos da Arte e cujos autores foram silenciados no século XVIII. O simples
PASSADO NÃO é HISTÓRIA.
FONTES NUMÉRICAS DIGITAIS
MISSÕES
revista do SPHAN nº 04 -
1940 pp.55 até 81.
O projeto
civilizatório jesuítico no Rio Grande do
Sul
PROJETO complexo cultural São Miguel
SEMINÀRIO MISSÔES
ARTE MISSIONEIRA
MISSÂO-_MISSÔES - Cildo MEIRELES – UFRGS - 1987
FONTES BIBLIOGRÁFICAS
LANGER , Protásio Paulo. A Aldeia Nossa Senhora dos Anjos: a resistência do guarani missioneiro no
processo de dominação do sistema
luso. Porto Alegre : EST, 1997, 128 p.
LOYOLA, Ignácio de (1491-1556) EXERCÌCIOS
ESPIRITUAIS (1ª impressão em 1548) _ QUINTA COMTEMPLAÇÂO artigos 121
até 126
-
TREVISAN, Armindo. A
escultura dos Sete Povos. Porto Alegre : Movimento,1978, 112 p
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