sábado, 16 de janeiro de 2016

143 - ARTE e LIBERDADE em PORTO ALEGRE


VASCO PRADO e a sua CIRCUNSTÂNCIA.

Eu sou eu e minha circunstância, se eu não salvo a ela, não salvo a mim"
                                                         José Ortega y Gasset


     A obra de Vasco Prado é competente para circular e ser recebida em qualquer centro civilizado. Esta obra salva as circunstâncias da sua origem pois ela fala por si mesma e não necessita tradução, mediador ou explicação para uma cultura elevada
Fig. 01 –   A obra de VASCO PRADO colocada no espaço público de CARAZINHO Constitui um dos múltiplos  arquétipos tridimensionais competentes para carregar - no seu mínimo da forma -  o máximo das circunstâncias nas quais o seu autor viveu. O seu abandono é um dos índices  da  cultura sul-rio-grandense intelectualmente incipiente,  estreita, fechada sobre si mesma e mergulhada na proximidade avassaladora  da Natureza.
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  Toda criança, com um mínimo de sensibilidade e de interesse, põe-se a modelar e rabiscar ao modo deste universo estético de VASCO PRADO. Evidente este ser jovem está muito distante de compreender o esforço empreendido por este escultor e desenhista adulto para simplificar esta ação. Ação pela qual  retorna conscientemente ao universo estético no qual todos  sentem-se a vontade e recompensados.
Fig. 02 –   O pensamento de VASCO PRADO - aliado ao seu cálculo, sua mão, lápis e papel - se conjuga para criar projetos e contratos que se materializaram em pesadas e onerosas obras escultóricas tridimensionais.   O artista não possui o direito de pedir desculpas por um erro ou malogro  neste processo. Supõe-se que ele realiza este processo em plena autonomia de sua vontade e total liberdade para que sua obra  receba sua assinatura pessoal. 

Vasco Prado foi o escultor que simplificou conscientemente a forma até atingir o esplendor dos arquétipos plásticos universais da humanidade. Desenhista competente para reduzir a linha ao traço primordial de quem se apropriar das superfícies e nela marca a essência da sua vontade, inteligência e sensibilidade.
Porém este não é o caso da cultura sul-rio-grandense como um todo. Esta cultura ainda é intelectualmente incipiente,  estreita e fechada sobre si mesma. Circunstâncias  que impedem desenvolver um projeto, um projeto consensual ou um pacto coletivo legível internamente e externamente. A cultura sul-rio-grandense, mergulhada nesta estreiteza e na proximidade da Natureza, é vitima constante da primeira ideologia que se fixa com verdade absoluta, eterna e sem contraditório possível. 
Fig. 03 –   Toda obra que ser de arte - como a  de VASCO PRADO - pertence ao mundo da expressão. Na sua transposição do mundo da comunicação e múltipla leitura, no mínimo, é necessário conjugar três eixos vetoriais.   Necessita de uma leitura no TEMPO no qual possui um começo, meio e fim. Supõe um OBSERVADOR  que flutua ao longo da linha de tempo. Materializa-se num LUGAR físico do qual recebe e se apropria do repertório, assimila, transforma e devolve materialmente para os sentidos humanos. 
[Clique sobre o gráfico para poder ler]

Esta obra concebida apenas na ATUALIZAÇÕES de sua INTELIGÊNCIA tomba na primeira mudança do vento da moda. Assim não é capaz de exibir sinais evidentes da CONTRAPARTIDA da LIBERDADE de PESQUISA ESTÉTICA, INTELECTUAL e POLÍTICA. A heteronímia - da INTELIGÊNCIA da VONTADE e da SENSIBILIDADE-  lhe parece natural e preço da ORDEM da paz do cemitério  e do PROGRESSO unívoco e linear.
Na obra das criações singulares,  como as de  VASCO PRADO, impõe-se a busca índices seguros  de uma PESQUISA ESTÉTICA autêntica e nas circunstâncias da liberdade e autonomia de sua vontade. Índices seguros da PESQUISA ESTÉTICA na obra de Vasco Prado estão nas circunstâncias nas quais esta se plasmou, ganhou forma, lhe conferem um sentido que ultrapassa o TEMPO, o LUGAR e a SOCIEDADE de sua origem. Não é possível negar que os seus contemporâneos de VASCO PRADO sempre souberam estimar este projeto de autonomia e liberdade expressa na obra.  Assim não teve sombra de contraditório e nem provocou intrigas gratuitas e descabidas.
Pode-se argumentar que esta falta de intriga, de um contraditório vociferante e de escândalos gratuitos foi arduamente administrado por este escultor que só falava quando questionado, diante de questões bem objetivas e atinentes ao se projeto. Aprendera com Aristóteles Não se deve argumentar com todo mundo, nem praticar argumentação com o homem da rua, pois há gente com quem toda discussão tem por força que degenerar  Aristóteles –Tópicos – [Penúltimo aforismo][1]. Que Sigmund Freud resumiu “O homem é dono do que cala, o escravo, do que fala[2]
Certamente, apesar de todo a sua força e coerência, esta obra  já está no passado junto ao seu autor. Permaneceu o seu pensamento materializado no traço, nos seus arquétipos tridimensionais competentes para carregar - no seu mínimo da forma -  o máximo das circunstâncias nas quais o seu autor viveu.
Circunstâncias determinantes da cultura e da arte sul-rio-grandense. Aqui inicia o problema. Problema para a sua circulação e recepção em outras culturas além das fronteiras do Rio Grande do Sul. Nenhuma andorinha faz o verão e nenhum artista é uma cultura autônoma, livre e desprendido das suas circunstâncias.
Fig. 04 –   A obra monumental de VASCO PRADO pontilha e dialoga com  o espaço publico de várias partes do estado do Rio Grande do Sul  .   A sua obra -  dedicada à parede sul do PALÁCIO FARROUPILHA  da capital - ganha esplendor e forma plena no solstício de verão de cada ano.  

Invertendo esta relação, nenhum crítico, memorialista ou comunicador se interessa por um arista ou obra se ela não é coerente com as circunstâncias de sua origem.

Não cabe a Vasco Prado, aos seus prosélitos ou seus defensores “EXPORTAR” esta obra para outras culturas e civilizações. Não existe “EXPORTAÇÃO” justa e coerente quando esta operação está carente sem as circunstâncias de liberdade e de autonomia do sistema no qual este artista viveu e se expressou. Só a pessoa LIVRE e na AUTONOMIA pode celebrar contratos dignos deste nome. Carentes, desta LIBERDADE e AUTONOMIA, estamos a mercê da escravidão, da pilhagem e do colonialismo.
Fig. 05 –   Ruben BERTA (1907-1966)[1] recebeu  uma digna homenagem de VASCO PRADO que plasmou neste busto  a fisionomia deste poderoso capitão da VARIG, logo após o desaparecimento  e colocada no espaço publico frente as oficinas desta empresa na capital do estado  .   Empresa, dirigente e arista coerentes com a ERA INDUSTRIAL cuja entropia e obsolescência programada preservam apenas o pensamento que orientou os seus projetos.
 
Nenhum cidadão, artista ou político possui direito de cultivar a liberdade na heteronomia colonial e servil. Este sistema colonial aniquila e descarta, do seu ambiente,  toda e qualquer estética própria ou ideologia digna deste nome. Uma cultura, uma nação um estado - submetidos ao regime dependência - aniquila a vontade,  a inteligência e a sensibilidade do seu cidadão. Não basta que estes cidadãos sejam criativos, inteligentes e ativos. O sistema no qual pensam, agem e sentem necessita ser verdadeiro, justo e belo
Fig. 06–   Figuras centrais do relevo negativo que  VASCO PRADO  imprimiu no concreto do mural do VIADUTO LOURERO da SILVA[1]  de Porto Alegre. Nesta obra publica  o autor resume a gramatica icônica.   O homem, a mulher e a criança num cenário plano no qual se movem alguns cavaleiros, no meio de uma vegetação mínima, as ondas nas quais  o veleiro ruma ao perfil da cidade comandado pelo decantado  “por do sol” sobre o Guaíba .
  
Necessita-se admitir que a obra de VASCO PRADO PERTENÇA ao passado. Porém no edifício da civilização do Rio Grande do Sul esta obra e pensamento são sólidas pedras de fundamento e que ninguém contesta. Trata-se de conferir um projeto civilizatório, digno e coerente a este prédio artificial. Sabe-se que a entropia, o caos e decadência são inerentes a todas as construções humanas. Não é diferente para a civilização do Rio Grande do Sul.



[1] Ver mural completo do Viaduto LOUREIRO da SILVA em  http://mubevirtual.com.br/pt_br?Dados&area=ver&id=497
Fig. 07 –  O desenho do casal para relevo negativo que  VASCO PRADO do mural do VIADUTO LOURERO da SILVA de Porto Alegre.   O tema do homem, da mulher e da criança é central no repertório visual deste escultor sul-rio-grandense.

Porém a obra de arte se distingue nisto. Esta obra de arte é competente  para  continuar o seu trânsito pelo mundo simbólico em outras culturas e civilizações transportando - como um documento -  um fractal da origem de sua cultura. Razão do seu prestígio, de seu valor e motivo de sua preservação do TEMPO.
Foto:  ZERO HORA- Porto Alegre
Fig. 08 –   A obra e o pensamento  de VASCO PRADO encontrou nos seus discípulos e jovens prosélitos a vitalidade para se projetar para além do seu TEMPO, LUGAR e SOCIEDADE .   Reprodução do pensamento e do projeto do mestre presente e ativa em associações, iniciativas e obras  como aqueles corporificados na AEERGS[1]

Em conclusão e necessário admitir que a obra de Vasco Prado é um signo potencial de um projeto sul-rio-grandense de elevado sentido unificador e universalização de um projeto regional. No contraditório é importante perguntar-se se ¿este projeto não é personalista, extemporâneo desta cultura, do seu poder originário e do seu  tempo?.
O que se evidencia que - grande parte deste projeto regional sul-rio-grandense - está a mercê da ATUALIZAÇÕES de sua INTELIGÊNCIA e na sua heteronímia. Na dúvida se continua a buscar  evidenciar sinais da CONTRAPARTIDA da PESQUISA ESTÁTICA, INTELECTUAL e POLÍTICA. PESQUISA  que lhe conferem índices evidentes de LIBERDADE estética e de  AUTONOMIA da vontade.


ALGUMAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS para ampliar a pesquisa relativas a VASCO PRADO

ALVES de Almeida, José Francisco (1964).  A Escultura pública de Porto Alegre – História, contexto e significado – Porto Alegre: Artfólio, 2004  246 p. ( pp.. 37,. 173. 175. 177, 178  e 239)

AMARAL, Paulo. Vasco Prado: a escultura em traço. Porto Alegre: EST edições, 2015 108 p. ISBN 978-85-68569-10-8

AQUINO, Alfredo.- Acrólito: um segredo do escultor in PRESTES, Cézar Vasco Prado: escultor- Porto Alegre: Cézar Prestes Produtor Cultural, 2001,  pp.58-60  il + CD

ARAUJO, Virgínia Gil Monumentos públicos: a escultura de Vasco Prado e Carlos Tenius. Rio Grande do Sul / anos 70 – Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Dissertação de Mestrado  1995, 276 fl il

BORNHEIM, Gerd A.(1929-2002)- Vasco Prado: a escultura e suas medias in PRESTES, Cézar Vasco Prado: escultor- Porto Alegre: Cézar Prestes Produtor Cultural, 2001,  pp.17- 27  il + CD

CARVALHO, Ana Maria Albani de Forma e matéria In Vasco Prado. Porto Alegre: Secretaria Municipal de Cultura 1 Cadernos Ponto& Vírgula vol. 07  994, pp.28-36 il.

CUNHA, Eduardo Figueiredo Vieira da.  VASCO PRADO: um foco de luz in Voto, politica e negócio; Porto Alegre Vol. 10, nº 110 abr. 2014 pp.72-73 il.

DUPRAT, Andreia Carolina Duarte – Revista Horizonte (1949-1956) imagem, imprensa e questões políticas. Orientação de Paula Ramos. Porto Alegre IA-UFRGS 2013 243 p.
Galeria São Paulo VASCO PRADO São Paulo: Galeria São Paulo vol. 04, nº 18 -  fev.mar 1990. Pp. 56-62 il.

GONÇALVES Flávio A disciplina do deslocamento in Projeto Percurso do Artista 2010: Nico Rocha/ catálogo da exposição organizada pelo Departamento de Difusão Cultural da UFRGS: artista Luiz Antônio Carvalho da Rocha. Porto Alegre: UFRGS 2011, pp.15-43 ir

IOCHPE, Evelyn Berg. Vasco Prado 70 anos. Porto Alegre: 50 anos MARGS 1954-2004 -Selecta do Museu organizada por  Cida GOLIN e Francisco MARSHALL - 2005 -3 v. (188 p.P

KERN, Maria Lúcia Bastos A utopia e o ofício da gravura In Vasco Prado. Porto Alegre: Secretaria Municipal de Cultura 1 Cadernos Ponto& Vírgula vol. 07  994, pp.57-64 il.

MOTTER, Talitha Bueno Gravura, figuração política: a obra de Carlos Scliar junto ao Clube de Gravura de Porto Alegre. Orientação Blanca Knaack. Porto Alegre ; IA-UFRGS 2013, 236 p. il

MUSEU de ARTE do RIO GRANDE do Sul (MARGS) Vasco Prado. Porto Alegre: MARGS – Companhia Iochpe Participações, 1984 84 p. il
PRESTES, Cézar Vasco Prado: escultor- Porto Alegre: Cézar Prestes Produtor Cultural, 2001, 141 p. il + CD

Projeto Percurso do Artista 2010: Nico Rocha/ catálogo da exposição organizada pelo Departamento de Difusão Cultural da UFRGS: artista Luiz Antônio Carvalho da Rocha. Porto Alegre: UFRGS 2011, 188 p. il. color

MASINA, Lea Sílvia dos Santos - A geração de 30 no Rio Grande do Sul: literatura e artes plásticas: Vasco Prado por ele mesmo- Porto Alegre: UFRGS 2.000 - 281 p. ISBN 8570255721

MUSEU de ARTE do RIO GRANDE do Sul (MARGS) Vasco Prado: exposição Espaço Cultural dos Correios – RJ 14.10-15.11. 1998 MARGS 24.11-20.12.1998. Porto Alegre: MARGS –1998 29 p. il

RAMOS, Paula- O domínio do desenho, in Cézar Vasco Prado: escultor- Porto Alegre: Cézar Prestes Produtor Cultural, 2001,  pp.96- 100  il + CD

ROCHA Nico Sobre processo e pensamento in Projeto Percurso do Artista 2010: Nico Rocha/ catálogo da exposição organizada pelo Departamento de Difusão Cultural da UFRGS: artista Luiz Antônio Carvalho da Rocha. Porto Alegre: UFRGS 2011, pp.45-83 ir

SECRETARIA MUNICIPAL de CULTURA – VASCO PRADO - Porto Alegre: Secretaria Municipal de Cultura - Cadernos Ponto& Vírgula vol. 07  1994, 102 p il.

ZIELINSKY, Mônica – As trajetórias de Vasco Prado In Vasco Prado. Porto Alegre: Secretaria Municipal de Cultura Cadernos Ponto& Vírgula vol. 07  1994, pp.65-77 il.

FONTES NUMÉRICAS DIGITAIS
Aristóteles  Tópicos: tratado de Retórica

CARAZINHO: VASCO PRADO e o ESPAÇO do BOMBEADOR

ESCULTORES do RIO GRANDE do SUL SABEM FAZER a SUA HORA

FRANCISCO de HOLANDA e MIGUEL ÂNGELO

Mural do Viaduto LOUREIRO da SILVA

RUBEN BERTA

Sigmund FREUD e o sentido da fala

VASCO PRADO -1914-1998



[1] ESCULTORES do RIO GRANDE do SUL SABEM FAZER a SUA HORA

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