O ENTE e o SER diante
da ARTE, da
Beleza,
da Verdade e da Justiça.
“O que não pode ser dito deve ser calado”
WITTGENSTEIN Tractatus
Logico-Philosophicus Aforismo 7.
Regina
SILVEIRA - 1939- Sombras
Fig. 01 – A
origem do desenho e da pintura, conforme narrativa grega teria sido o traçado
do perfil de um jovem feito pela sua namorada na hora da partida para a guerra.
Regina Silveira atualiza esta metáfora para o tempo e as circunstâncias atuais.
A artista sustenta a eterna luta contra o que insiste em se ausentar e aquilo
que escapa à percepção humana. Para
tanto renuncia a tudo aquilo que poderia perturbar este seu projeto como a cor,
a textura ou relevo.
Na administração
destas perdas ela ganha coerência entre o seu ENTE e a sua maneira de SER no
mundo. .
Necessitarmos guardar
silêncio em relação ao ENTE da Arte. Como ENTE encontra-se envolto em insondáveis dúvidas e mistérios dos quais só conhecemos repercussões. A mesma dúvida e o mesmo mistério envolvem a Beleza, a
Verdade e a Justiça. No entanto as dúvidas e mistérios permitem especular e
expressar-nos em relação ao SER. SER que se manifesta nas suas obras na forma de eventuais
repercussões nos sentidos humanos. Neste SER das obras de Arte, da Beleza, da
Verdade e da Justiça é possível exercer um sem números de escolhas entre
extremos (Kuperthes) naquilo que atinge, estimula os
nossos sentidos e repercutem em nossa mentalidade e cultura. Estímulos e repercussões
derivadas do que denominamos de Arte, Beleza, Verdade e Justiça. Contudo elas
derivam de ENTES primitivos da fala humana que se expressam em efeitos em campos de forças distintas e soberanas entre si mesmas.
1968
- cartazes - Biblioteca Nacional da
França
Fig. 02 – “A
Beleza está na rua” e jogando um paralelepípedo.. O ano de 1968 tornou-se antológico nas formas
de expressar novas circunstâncias vividas ao longo da denominada “Guerra Fria” e a efeitos da
descolonização dos continentes africano e asiático. Uma nova geração inovou os
seus meios de SER em formas de
evidenciar formas de expressão do seu ENTE. Em tempos de imagens fotográficas,
publicitárias e de marketing hedonistas fez escolhas de formas sintéticas nas
quais imagem e palavra se reforçavam reciprocamente
As obras de Arte
repercutem e se materializam em documentos de épocas e civilizações que tornam
históricos os autores destes projetos. A maioria das grandes forças da natureza
também só é perceptível aos sentidos humanos nos seus efeitos. As energias
magnéticas, da gravidade e da genética, são algumas das forças das quais os
sentidos humanos só percebem os efeitos. Estes efeitos geram documentos
perceptíveis nas obras de Arte e que também constituem índices das escolhas dos
seus autores. Estes autores tornam-se históricas na medida em que administram as
perdas decorrentes da passagem entre o ENTE inatingível e imaterial e o seu SER
possível e material.
Fig. 03 – – “A
Beleza está na rua” na forma de flores sendo levados sobre os
paralelepípedos A indústria cultural da beleza é uma das mais consistentes e
índice da evolução e de civilização. O recente termo “aestesia” tentou trazer
para a gramática contemporânea os mais variados vocábulos existentes em todas
as civilizações. Evidente que a “corrupção do ótimo é péssima” e ocorre quando
o SER substitui, silencia ou abafa o ENTE do qual decorre a autêntica beleza.
Esta é gratuita e revela-se nos mais variados índices..
O ENTE é percebido na
COMUNICAÇÃO humana ao migrar do seu universo imponderável em direção dos
sentidos humanos do seu SER. Esta percepção implica na passagem deste ENTE pelo
ambiente da EXPRESSÃO rumo às obras físicas Nesta obra convergem autor e
receptor. Esta passagem cobra o seu pedágio, pois toda escolha implica em uma
ou mais perdas. Perdas físicas e mentais, pois também a quem recebe a obra de
Arte nem tudo é possível perceber, codificar e assimilar em todas as épocas e
lugares.
Fig. 04 – A
cultura islâmica desaconselha a produção de imagens antropo e zoomorfas. Na
perda da leitura imediata (mimese) ganha amplitude no universo da Lógica e da
Matemática. Nesta lógica investe no PADRÃO INFINITO com o qual cria os mais
amplos e variados estímulos sensoriais. Este acervo matemático desta cultura
não figurativa esta Arte islâmica foi buscar o seu repertório na cultura hindu
da qual trouxe o zero com profundas ressonâncias do conceito de “Nirvana ”.
As escolhas realizadas
pelo observador impõe também o fluxo criativo na recepção no contínuo do que é
perceptível das obras de arte. No universo da COMUNICAÇÃO humana nem tudo é
possível em todas as pessoas, épocas e lugares. A cultura clássica grega já
estava consciente desta barreira.
“Não se deve argumentar com
todo mundo, nem praticar argumentação com o homem da rua, pois há gente com
quem toda discussão tem por força que degenerar” Aristóteles –Tópicos – [Penúltimo Tópico][1].
Evidente que a obra de
Arte se completa no seu observador. Apesar de qualquer ENTE humano
potencialmente ser criador, estruturante de forças para atingir altura e assim superar
esta barreira, ele necessita qualificar o seu SER para esta façanha e ter êxito
e fortuna neste projeto de vencer esta barreira.
Fig. 05 – A caverna descrita por Platão encontra
no globo ocular dos seres vivos uma
materialização e mostra a distância entre o que é percebido e a realidade
concreta e não mediado pelos sentidos humanos. A ótica ao evoluir seguiu este
caminho da Natureza guiado pelas concepções teóricas. A fotografia penetrou no
registro dos efeitos dos átomos até o registro da luz e magnetismo proveniente
dos gigantescos conglomerados do espaço estelar. Contudo continua válida
prescrição de Platão ”depois de observar as estrelas, deixemos os
astros em paz e façamos Astronomia”
.
É clássica e taxativa a
resposta “não suba sapateiro além da
chinela” dada pelo pintor grego a um dos seus observadores de sua obra e um
conhecido profissional da cidade. Na própria Bíblia a expressão das “perolas aos porcos” traduz esta barreira
entre o ENTE e o SER. Contudo o
observador também pode perverter o seu repertório particular e aniquilar a
coerência que o projeto que o artista atingiu por ventura . Nem por isto o artista
pode renunciar a autonomia do seu projeto e aderir de forma servil a um populismo
crasso. Esta súbita e questionável
heteronímia recíproca pode significar, tanto para o artista, como para o
seu observador, o retorno para a Natureza que “não tem nada por dentro” e arruinar a origem e a essência da obra
de arte como projeto humano.
Fig. 06 – O mito
do nascimento de Atenas da mente de Zeus é uma das mais dramáticas descrições do nascimento da inteligência,
associada à beleza e à vontade guerreira. O ditado chinês que “pensar
dói” resume não só o ato da concentração mental mas incorpora a mal
estar humano decorrente da ruptura epistêmica, da estética e dos antigos e
obsoletos hábitos.
O contraste, a corrupção
e a ignorância podem mostrar as competências e os seus limites da energia
presente e atuante na origem e na essência da obra de arte como projeto humano,
Ou como já sentenciavam os latinos “ridendo castigat mores”. Neste contraste
o ENTE projeta-se e ele recebe contornos dos seus limites do que É ENTE e NÃO o
É. Este contorno e limites se desenham no confronto entre a JUSTIÇA e o ARBÍTRIO, entre a VERDADE e a MENTIRA, entre a BELEZA e
o AGRADÁVEL e entre a ARTE e a CULTURA.
ACRÓPOLE
de ATENAS imaginada por KLENZE Leo von
1784-1864 - pintura - 1846
Fig. 07 –
Conforme um mito Atenas foi escolhido como padroeira a cidade grega num concurso
entre todos os deuses. Os furibundos deuses como Marte, Zeus, Netuno assustaram
mais do que agradaram aos gregos. A deusa vencedora, na sua apresentação dos seus predicados para
o título, trouxe simplesmente e
presenteou a cidade com uma muda de oliveira. Até o presente o azeite e as
olivas são uma das fontes de riqueza da Grécia. Porém os habitantes da cidade
mereceram o apoio de sua deusa quando expressaram isto numa cidade na qual usaram
a sua inteligência, sensibilidade e vontade para materializarem isto no templo
da deusa. Este tornou se um ponto de referência nevrálgico, um ícone do
comércio e base de uma incipiente indústria cerâmica.
O melhor testemunho é
daquele que viveu e acumulou um razoável conhecimento e experiências diretas em
relação à ARTE, à VERDADE, à BELEZA e à JUSTIÇA. Quem acumulou um razoável conhecimento e
experiências diretas pode orientar o carente de experiência s desta natureza. Esta
mediação pode trazer imensos benefícios se for coerente nas suas etapas,
continuada e progressiva até o momento da autonomia do orientando. O perigo da
mediação é a sua naturalização, formalismo e, assim, resvalar para a entropia
ou a corrupção.
Fig. 08 – As
múltiplas leituras de uma obra de Arte que “contém
o máximo no mínimo de sua forma” possui no mínimo três eixos que lhe
emprestam vestígios semióticos tanto na sua elaboração como na sua recepção. .
O Brasil deve, na
concepção de José Vieira Couto
Magalhães, o seu tamanho físico, a unidade nacional e a metade de sua força de
trabalho ao processo de mediação. Mediação entre ameríndios e europeus iniciado
(na base da VERDADE) e sustentado pela cultura portuguesa. Processo de mediação
instituída e mantida pelos lusitanos na forma dos profissionais dos “línguas”
(ARTE) colocados entre os ameríndios e os europeus. Além de manter relativa paz
social (JUSTIÇA) por meio desta medida
singela o Brasil incorporou vastos territórios que inicialmente pertenciam outras
potências europeias rivais, ou eram cobiçados e atacadas por elas. Na
introdução do texto de o Selvagem (1876
–p. X) ele escreveu: “de que serve o
missionário, com a as santidade das leis da religião, se ele não tem a língua por
onde ensine a regenerador moral do cristianismo”. O luso praticava este
preceito (BELEZA), pois sabia que “os espíritos não se vencem pela
violência, mas pelo amor e pela generosidade” na concepção Espinosa (Ethica
4.11)
FRANCISCO
de HOLANDA 1517-1585 ilustração
Fig. 09 – O autor
dos “Diálogos de Roma” revela a sua maneira
de perceber e expressar o ideal. Ele estava sob o profunda influência da
figurativa de Miguel Ângelo, busca expressar o ENTE origem [A] e fim [W] de tudo e sem deixar de revelar uma ponta do legado da arte islâmica que
preservou o pensamento de Platão durante a pior faz da Idade Média
Estas autores sabiam também que este
conhecimento e prática constitui uma construção sobre o humano, pois toda a civilização,
como construção artificial, está sujeita às leis da entropia. Contra as forças
naturais da entropia há necessidade de vigilância e de trabalho. Esta civilização artificial necessita do
conhecimento das circunstâncias da evolução do projeto e da renovação dos
contratos que se encontram na sua origem. Naturalizar uma civilização significa
abrir as portas para a entropia. Não é possível realizar a passagem natural de
uma civilização para outra sem ferir a sua soberania ou a sua autonomia e com
graves riscos para as forças da ARTE, da VERDADE, da BELEZA e da JUSTIÇA.
SIGNAC Paul - Au Temps de l'Harmonie
Fig. 10 – A
cultura europeia continuou a insistir na mimese figurativa. Esta obra de
tendência pontilista de Paul
Signac foge da simples foto. Numa imagem
atomizada representa o ócio, o lazer e a Arte inclusive a si mesmo com o
seu cavalete instalado ao ar livre e frente ao mar. O ENTE do artista se
exterioriza e comunica o seu modo de SER e as suas circunstância particulares
de um tempo e de um lugar. ”.
Toda revolução autêntica
e coerente busca trazer para o seu presente o PODER ORIGINÀRIO de sua origem.
As mediações espúrias conduzem estas
revoluções pelo caminho da entropia natural e acabam atentando contra as forças
da ARTE, da VERDADE, da BELEZA e da JUSTIÇA. No seu lugar surge o populismo, a
ganância pelo poder e da posse material e imaterial avassalador que neutralizam
e aniquilam qualquer civilização.
FONTES
BIBLIOGÁFICAS
ARISTÓTELES (384-322).
Tópicos. 2.ed.
São Paulo : Abril Cultural. 1983, pp.5-156.
COUTO
MAGALHÃES, José Vieira (1837-1898) O
Selvagem Rio de Janeiro : Typographia da ReformA, 1876, 194 p + anexos
HOLANDA, Francisco de (1517-1584) Diálogos
de Roma: da pintura antiga. Prefácio de Manuel Mendes. Lisboa :
Livraria Sá da Costa, 1955, 158 p.
SAUNDERS, Robert A Educação Criadora Nas Artes. in AR’TE 10. ano III n o 10, São Paulo :Max Limonad, 1984., pp.18-23
Este
texto é parte do Capítulo “Using
Creative Mental Process in Planning Art and Humanities Programs”, do livro Relating Art and Humanities to the
Classroom, de Robert J. Sauders. (Dubuque, WM.C. Brown Company Publishers,
1977.) Tradução : Silvia Macedo e D.T. Chiarelli.
WITTGENSTEIN, Ludwig. (1889-1951)Tractatus Logico-Philosophicus. Trad. Luiz Henrique Lopes dos Santos.
São Paulo: EDUSP, 1994.
FONTES
NUMÉRICAS DIGITAIS.
COUTO
MAGALHÃES e a MEDIAÇÃO AMERÍNDIA – O SELVAGEM 1876
VISÂO
e PERCEPÇÃO
Os
espíritos não se vencem pela violência, mas pelo amor e pela generosidade.
Animi tamen non armis sed amore et generositate
vincuntur. [Espinosa,
Ethica 4.11]
Aforismo
7 “O que não pode ser dito deve ser calado”
“7 What we cannot speak
about we must pass over in silence”.
Satz 7 “Wovon man
nicht sprechen kann, darüber muß man schweigen”
Oscar Augusto
Alejandro Schulz SOLARI (1887-1963) - XUL SOLAR - DRAGO 1927
Fig. 11 – O pensamento
fantástico e festivo da cultura latino americana vale-se dos signos originários
da arte ameríndia
Este
material possui uso restrito ao apoio do processo continuado de
ensino-aprendizagem
Não
há pretensão de lucro ou de apoio financeiro nem ao autor e nem aos seus
eventuais usuários
Este
blog é editado e divulgado em língua nacional brasileira e respeita a sua
formação histórica. ...
e-mail ciriosimon@cpovo.net
1º blog :
2º blog
3º blog
SUMÁRIO do 1º ANO de postagens
do blog NÃO FOI no GRITO
Site
Vídeo:
Nenhum comentário:
Postar um comentário